O caminho das estrelas
Noite escura. Ao volante do caminhão de cabine dupla, carregado de implementos agrícolas, Zak começava a sentir-se sonolento. O entorno decididamente não ajudava: plantações de soja dum lado e doutro da estrada, até onde a vista alcançava, e ele até sentia um certo alívio por poder enxergar apenas o que os faróis iluminavam à frente no caminho. O que ainda o mantinha desperto era não somente o prazo que tinha para entregar a encomenda, mas também a certeza de que não encontraria um motel de beira de estrada naquela região; ao menos, não um que fosse confiável.
Concentrou-se na pista de asfalto que os faróis desvelavam, as duas mãos no volante. Alguma coisa branca esmagou-se contra o para-brisa, uma mariposa talvez, mas ele não acionou os limpadores; cuidaria daquilo mais tarde, com pano e balde.
- Aqui é muito solitário.
A voz viera do assento de trás da cabine dupla. Zak não retirou as mãos do volante, e lançou um breve olhar para o retrovisor: viu apenas a silhueta de um homem, mergulhado na penumbra.
- Não tem muito tráfego - comentou, à guisa de resposta.
- Você pretende parar? - Indagou o estranho.
- Não me parece um bom lugar - replicou com cautela.
- Eu conheço um motel, cerca de duas milhas depois do entroncamento com a estadual; você entra no primeiro desvio à esquerda - sugeriu o desconhecido.
- Acho que posso chegar ao meu destino sem precisar parar - afirmou.
O homem ficou em silêncio por alguns instantes, como se estivesse procurando novos argumentos para convencê-lo.
- Você parece cansado - disse em tom retórico.
- Faz horas que estou dirigindo; - replicou Zak. - Tenho prazo para entregar a carga.
- Os patrões sugam o teu sangue - avaliou o desconhecido.
"Antes os patrões do que outras coisas", pensou Zak, tentando concentrar-se na estrada.
- E que tal uma lanchonete? Você poderia tomar um café, jogar uma água no rosto...
A preocupação do desconhecido com o seu bem-estar parecia quase legítima; mas a insistência para que fizesse uma parada, era suspeita. Todavia, não queria antagonizá-lo.
- Talvez seja uma boa ideia - concedeu. - Vou ver, se passarmos por uma.
- Você vai passar por um Star Way Diner; muitas luzes e carros estacionados em frente... - informou o desconhecido. E, num tom calmo e educado:
- Se incomoda se eu fumar?
- Fique à vontade - redarguiu Zak, aliviado pela mudança.
Houve um breve clarão de chama no banco traseiro, mas Zak não se permitiu olhar pelo retrovisor; aquilo era um teste. Tampouco sentiu cheiro de fósforo queimado ou de tabaco.
- Você não fuma? - Questionou o homem.
- Quando era adolescente - replicou Zak. - Não mais.
- É uma boa coisa - admitiu o desconhecido.
O som de estações de rádio sendo sintonizadas aleatoriamente encheu a cabine; Zak manteve-se calmo, mas lembrou-se de que não havia rádio instalado no caminhão. O ruído então cessou tão abruptamente quanto havia começado.
- Eu vou ficar na próxima - informou subitamente o homem.
Zak não sabia o que aquilo queria dizer, e nada respondeu; pouco depois, os faróis iluminaram um Studebaker Starlight verde, parado numa curva da estrada, um homem inclinado sobre o capô aberto. O homem acenou. Zak reduziu a velocidade e parou.
- Precisa de ajuda? - Indagou.
- Algo com o motor... não está dando partida - explicou o desconhecido.
Zak pegou uma lanterna e desceu do caminhão. Havia visto carros como aquele na oficina do tio, na adolescência. Peças de colecionador.
- Vamos torcer para que seja algo simples - comentou. - Fique na direção, e quando eu avisar, dê a partida.
O homem fez como havia sido orientado e Zak examinou o motor aberto, cuidadosamente. Aparentemente, o cabo do positivo estava com mau contato. Deu-lhe um bom aperto e depois gritou para o homem girar a chave. O motor pegou de primeira.
- Não sei como lhe agradecer - disse o homem, por trás do volante.
- Chegue bem ao seu destino - redarguiu Zak, subindo na cabine do caminhão.
Saiu do acostamento para a estrada, e deu uma última olhada pelo retrovisor lateral para a curva que acabara de deixar.
O automóvel havia desaparecido.
- [19-05-2021]