A visagem do poço

Havia uma lenda sobre o poço no jardim, lhe disseram ao chegar à mansão rural.

- Na última noite de lua cheia do ano, à meia-noite, juram ter visto uma jovem com um vestido antigo, sentada na beira do poço.

- E o que ela faz? - Indagou ele.

- Penteia os cabelos com um pente de ouro... às vezes, canta baladas folclóricas...

- O espírito já falou com alguém?

- Ninguém teve jamais a coragem de lhe dirigir a palavra - foi a resposta categórica.

- E quem é... ou foi... ela?

- Falam numa moça que foi empurrada pela madrasta dentro do poço, por ciúmes. Ela morreu afogada.

- Que horror! E não mandaram rezar algumas missas para que a alma repousasse em paz? - Questionou indignado.

- Quem poderia dizer? Mas o certo é que, por mais de 200 anos, a entidade tem sido vista nas condições que lhe indiquei.

Ele foi tomado de um súbito desejo de ir ao fundo daquela história; não necessariamente de descer ao fundo do poço.

- Faltam poucos dias para a última lua cheia do ano. Ficarei de plantão no jardim para descobrir do que a pobre alma necessita para partir para o sono eterno... - declarou.

- Você é um sujeito valente - ouviu em resposta.

E na noite aprazada, cheio de coragem, sentou-se num banco coberto de hera, num ponto de onde podia ver o velho poço - agora seco - claramente.

Pouco antes da meia-noite, nuvens densas encobriram a lua. Na escuridão que se formou, ele pôde jurar que estava ouvindo um ruído de água corrente.

Instantes depois, teve que bater em retirada de volta ao interior da mansão: desabou uma chuva devastadora sobre a região.

Naquele ano, não houve avistamento da entidade.

- [18-08-2020]