O Canto do Cisne

O frio daqueles dias parecia que iria me consumir por inteira, não só pelo fato do inverno rigoroso daquela época do ano, mas eu sentia um frio medonho, parecia que iria me congelar os ossos. Isso fazia minha alma doer, acho que eu estava com essa sensação porque estava prevendo minha morte prematura.

A tensão era notada nos olhos assustadores do rei e da sua corte, meus olhos eram um misto de pavor, pânico e solidão. Sempre soube que nunca fui bem vinda na corte, ninguém queria minha presença naquele lugar, eles sempre iriam preferir a rainha antecessora a mim, ela era benevolente, bondosa, atenciosa, obediente.

Eu sabia que para a minha expulsão acontecer faltaria pouco, já sabia que há muito tempo o coração do rei havia ficado escuro pra mim, embora o coração dele jamais fosse uma fonte de bondade. Naqueles tempos o coração deve havia se tornando duro e impiedoso.

Eu não via, muito menos ouvia, mas sabia que sessões de tortura estavam para começar, todas envolvendo meu nome profano, eu sabia que dias e noites tenebrosas e macabras estavam por vir, por um breve momento, pude sentir em minhas narinas o cheiro forte de ferro, de sangue, a única coisa que poderia fazer era pedir para uma das minhas damas cuidar do meu bem mais precioso, minha filha Elisabeth, eu precisava a proteger desse palácio sombrio e gélido, já que não poderia mais a ver, sim já havia pedido para ver, mas esse último pedido me foi negado, e eu sabia que meu fim estava com os dias ou até horas contados, a última vez que a vi seus pequeninos olhos claros, ela me olhava pedindo socorro, clemência, implorando por carinho, mas eu nada poderia fazer para confortá-la. Ah pobre criança...

O meu próprio coração estava em sobressaltos dentro de meu peito... Finalmente uma calmaria fora do comum se instalou no palácio, naquele dia fúnebre.

Mas aquele medo dentro de mim não passava, eu poderia prever que algo de muito ruim estava por vir, o castelo naquele momento estava com um ar medonho, eu só não sabia que esse ato de crueldade envolveria tantas vidas.

O medo só aumentava com o passar do tempo, até o tique taque do relógio me assustava... As conversas com as damas de companhia eram apenas pretextos para me distrair do que realmente estava acontecendo, logo pude notar que uma por uma das damas estava saindo do meu aposento.

–Posso saber por que toda essa movimentação? – Perguntei em um tom alto para que todas ali presentes pudessem ouvir e talvez alguma pudesse dizer, mas mais uma vez o silêncio. Nesse instante vi o medo nos olhos de todas aquelas mulheres, algo muito terrível estava acontecendo e em breve eu iria descobrir.

Após algumas horas vejo um dos conselheiros reais junto com alguns guardas na porta do meu aposento.

–Majestade. – O conselheiro me olhava fazendo uma pequena reverencia. Aos poucos os outros homens fizeram o mesmo gesto.

– Deseja algo Vossa excelência? –Continuo o olhando com um olhar calmo, porém firme, não poderia demonstrar medo ou fraqueza, eu sabia que era exatamente isso que todos queriam ver de mim.

–Terá que nos acompanhar Majestade, a senhorita foi acusada de traição ao rei e à coroa, perdoe-nos por isso. – Logo pude sentir dois dos guardas segurando meus braços, parecia realmente que eu havia feito algo de muito errado. Tudo bem, eu realmente havia feito, mas estava verdadeiramente arrependida. Esperava encontrar meu pai, afinal ele também estava nisso.

Após uma pequena caminhada já estava dentro da torre, penúltimo lugar onde eu pisaria antes da minha morte, agora era questão de horas para que isso acontecesse. Logo as mãos do rei estariam manchadas com meu sangue e minha filha nas garras de um psicopata, seu pai.

Fiquei atônica por alguns pequenos segundos pensando como poderia ser minha morte, talvez eu fosse queimada em uma fogueira como as bruxas eram, mas talvez morrer decepada fosse menos doloroso e mais rápido, pois sempre tive um pescoço muito fino, esse pensamento me fez rir.

Em algum lugar muito escondido torturas estavam acontecendo, eu não ouvia os gritos, mas poderia sentir a aflição em meu coração, da janela da torre pude ver homens morrendo em meu nome, meu irmão e meu pai estavam entre esses homens, meu coração sagrava e chorava por cada sangue derramado naquele lugar.

No dia 19 de Maio do ano de 1536 a minha morte já tinha hora para acontecer.

Naquela manhã tudo parecia mais triste, um tom de melancolia se espalhava pelo ar, minha morte aconteceria ás 08:00 da manhã daquela sexta feita triste, logo já estava pronta, o carrasco francês também, apesar do mesmo ter se atrasado algumas horas.

Assim que a hora chegou, mais uma vez tive aquele pensamento do pescoço fino. Parecia que estava brincando com a morte.

Não senti dor do golpe da espada, estava distraída olhando os pássaros, sempre quis saber como era a sensação de poder voar e logo iria descobrir.

Agora estou aqui por entre as estrelas a dançar como um lindo e majestoso cisne branco.

Sophia Antonella Grimm
Enviado por Sophia Antonella Grimm em 06/06/2016
Código do texto: T5658621
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.