Capetinhas

Eram as mais bonitas, catitas y guapitas do terreiro, mas ninguém se dava ao luxo de ter mais do que um único pé delas, pois se mal eram tocadas, muito menos seriam chupadas. Dez em acidez. E até os passarinhos seus galhinhos evitavam de vez.

E permaneciam imaculadas, desprezadas, aquelas laranjas encapetadas, até que chegasse o dia de sua serventia: a lavagem dos tachos de cobre, para se lhes remover o azinhavre, aquela substância de coloração esverdeada que à superfície se lhes supurava. Um veneno grande, não pequeno, e nada melhor do que a causticidade daquelas laranjas para executar a faxina - sentenciava tia Vicentina, naquela ciência desde menina.

Mas o grande dia delas, aquelas loiras laranjelas, era outro, nunca fugindo de junho, para, segundo o santo e a ocasião, serem espetadas na ponta do mastro e homenagear Antônio, Pedro, Paulo ou João, numa noute fria e seca de fogueira, ver tudo lá de riba, altaneira, sobranceira... a menos que... um moleque, ou um bando deles, se antecipasse à solenidade e, por pura maldade, o pé sacudisse à vontade para com laranjas iraquerrear - e de tiros certeiros, ou torteiros, só pensasse em aumentar o seu placar.

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 29/03/2015
Reeditado em 29/03/2015
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