Frio

Ao som de I’m Fool to Want You de Billie Holiday

Pois é, aquela noite estava mesmo fria, como há muito tempo, há tanto tempo, ninguém via... e trazia tantas tinturas nos tristes pensamentos da travesti. Muitos homens vieram em sua mente. Quantos simulacros de amor? Como toda a sua vida esta sendo um simulacro. Ela precisava de cada um pra preencher uma parte obscura de sua vida. Uma boca branca pra iluminar o negror da pele, do humor... Um cabelo macio para fazer cafuné, pra enrolar no pescoço e se enforcar de amor e principalmente para fugir do frio, do medo. Boas mãos para acariciar e também para bater. Bons olhos azuis para se afogar de bêbada, porque o amor é um perigo, mata. Ela já meio moribunda de sensações passionais, perigosas. Um homem é perigo demais para uma mulher, mais ainda para uma travesti. Que a intensidade do amor seja menor que a da morte. A noite estava fria e ela ia juntando aqueles pedacinhos dos homens de que precisava para sobreviver... E depois das partes anatômicas foi se recordando das ações: um único beijo verdadeiro dado num momento de embriaguez dos dois; um abraço forte e meia dúzia de carícias, além de um sexo feito no pensamento com um desconhecido ao som de um bolero. Tudo se esvaiu ao léu: a temperatura cada vez mais baixa. A retroação interrompida pela realidade. Mais um sonho. Um mal sonho dormido sob o pesado mundo do amor sem nenhum aconchego para se proteger do frio que é não ter ninguém que a ame. E estava tão frio que nenhuma lágrima suportaria sair para fora daquela toca cinza, mas seu coração... ela perguntava se ainda havia coração... só não sei dizer se dela ou dos outros, mas com o frio basta apenas um sofrimento por vez. O dela era urgente!

DominiCke Obliterum
Enviado por DominiCke Obliterum em 05/08/2011
Código do texto: T3141838
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