Profano.
Orion, 22 de abril de 4503.
“A pessoa certa e preparada para levar a cabo a essa missão é Artemisa”! Zeus argumenta impaciente para Afrodite.
- Zeus, será que tem realmente necessidade de tudo isso? Deixe nas mãos de Eros, que ele resolve. – Afrodite.
-Sabe qual é o seu problema Afrodite, você pensa que tudo se resolve com amor, eu já te disse filha, que as coisas nem sempre são assim... – Zeus.”
Gazeta de Orion:
“... A caridade e a justiça dos Deuses, é um tormento para todos os seres, questiono-me se realmente não seriamos mais felizes sem eles...” Levi, o sábio.
Era uma noite típica de verão úmida e abafada, prenunciando a vinda de uma tempestade.
Numa clareira próxima uma velha árvore chamava atenção pelo seu tamanho e imponência.
Em seu galhos esqueletos balançavam e chocalhavam como se fossem enfeites natalinos macabros.
Ao redor dela a beladona crescia e vicejava a custa da ureia dos condenados que eram enforcados no local.
No solo, a metros de profundidade, uma mulher placidamente dormia em seu sono secular.
Alva como os raios lunares, os seus cabelos cobriam ao corpo nu igual a uma mortalha fúnebre.
Possuía traços delicados quase angelicais, se não fosse pela maldade que transpirava da sua pele.
Seus braços encontravam-se algemados por grossas correntes de prata ungidas que estavam fincadas nas espessas raízes.
No silêncio noturno, o único som que se escutava a milhas e milhas de distância era o farfalhar das folhas e chocalhar dos esqueletos que balançavam um contra o outro ao sabor do vento.
Grossas e espessas gotas de chuvas caiam lentamente do céu, lavando e limpando tudo ao seu redor, para momentos depois acelerarem e despencarem como se o mundo tivesse para se acabar a qualquer momento.
Raios riscavam aos céus, caindo aleatoriamente e destruindo o que estivesse ao seu alcance.
Trovões estalavam assustando aos incautos animais e aos humanos mais próximos, fazendo com que os mesmos procurassem abrigos e escapassem da fúria dos Deuses.
Nesse momento um raio cruza o céu e atinge a velha arvore, dividindo-a ao meio, destruindo-a e partindo as algemas que prendiam ao ser em seu interior.
Ela fora acordada por uma carga altíssima de energia, ainda sentia a eletricidade percorria o seu corpo.
Abrindo lentamente as pálpebras, tentando se livrar da dureza que tomava aos seus músculos, devido ao longo tempo presa.
Sendo assaltada por antigas lembranças, sente o coração bater intensamente enquanto se deixa levar pelos sentimentos de ira, frustação e fome.
Fome pela perfumada e macia carne humana, sente a saliva aumentar em sua boca quando se lembra do gosto da tenra carne sendo mastigada.
Ela era um antigo anjo que fora expulsa e banida para esse planeta, a milhões de anos atrás.
Viverá no meio de deuses, demônios, mutantes e humanoides.
Quando houve o primeiro levante contra os grandes deuses, lutara ao lado dos humanoides, mas fora traída por aquele que deveriam ter sido os seus aliados.
Após passar séculos presa no submundo, fora perdoada por Hades e conseguira voltar ao mundo exterior.
Com o coração tomado pela vingança e pelo ódio, se tornara o flagelo dos humanoides.
Destruíra vilas inteiras, não poupando ninguém. Todos que cruzaram o seu caminho sentira o fio da sua espada e o dilacerar dos seus caninos.
Banqueteou-se com os seus antigos aliados e inimigos, eles foram a entrada, o prato principal e a sobremesa.
Fora literalmente uma orgia gastronômica, nunca se divertira tanto quanto nessa época.
Amava ouvir os lamentos, as súplicas e os berros de suas vitimas, era uma sinfonia abençoada, isso sem falar no rio de sangue que deslizava pelo solo, tornando-o carmim.
No entanto, os Deuses ficaram a par de suas extravagancias sangrentas e não gostara nem um pouco do oceano de sangue que banhava ao planeta.
Reuniram-se sob o comando de Zeus e a perseguiram até encontra-la, prendendo-a com as algemas ungidas e fora acorrentada no solo sagrado de Hera.
Fora séculos e séculos na eterna escuridão, presa, esfomeada e com um ódio mortal por todos e tudo que respirasse.
Finalmente liberta por um golpe do destino e quem sabe das Parcas, ou mesmo dos Deuses.
Estava faminta e com medo de ser aprisionada novamente. Cautelosamente se afasta da clareira em rumo à cadeia de montanha da zona Oeste.
Um local inóspito, onde poucos sobrevivem.
Estava cansada de lutar, de matar, de odiar e de querer se vingar, já não via mais sentido nesses sentimentos que foram alimentados diariamente por séculos.
Só desejava um local, onde pudesse viver só e ser livre, onde não fosse marionete nem de Deuses ou de homens. Queria ser apenas ela.
Andando tropegamente parti em busca de um lugar a qual possa se abrigar.
A tempestade lava o seu corpo, retirando as sujeiras que acumulará com o passar dos anos e limpando também a sua alma.
Já tinha andado uns vinte km, quando se depara com um com humanoide vindo ao seu encontro.
Os seus caninos teimam em expandir gengivas a fora, suas garras ameaçam se projetar pelas unhas.
Controlando todas as mudanças, ela vai se afastando do mortal.
Mas nesse instante, sente ser agarrada por alguém, quando se vira dá de cara com um ser minúsculo, que expande luzes por todos os seus poros.
Uma criança, no entanto, dava para se notar que não era um infante humano.
Temerosa tenta se afastar dela. Entretanto a criatura se aproxima mais, tentando fugir para a sua esquerda, tem o seu caminho barrado pelo o homem.
Presa entre os dois se prepara para lutar contra ambos.
Quando sente uma flecha perfurar ao seu peito.
Procurando a origem da mesma, vê que partiu da criatura luminosa, dando conta que a mesma possuía asas.
- Oh! Deus! Era o cupido que estava à sua frente.
Tentando se afastar as cegas, dá de encontro com algo solido e quente, acolhedor.
Ao abrir os olhos, vê a sua frente ao homem.
Tomada por um sentimento nunca sentido antes, que envolve e preenche ao seu ser com alegria, tristeza, insegurança, acolhimento, carência e como se finalmente tivesse encontrado uma parte sua a muito esquecida e perdida.
Suando frio, coração descompassado, arrepios de prazer e ofegava ao ver o mancebo a sua frente, com as pupilas dilatadas e tremula.
Percebe um calor estranho percorrer o gélido corpo, aquecendo a sua alma e ao seu ser.
Esquecida de tudo e de todos, olha embevecida ao ser a sua frente como se bebesse da imagem, sendo correspondida pelo mesmo.
Andando em direção a ele, se aproxima; abraça carinhosamente sentindo o calor dele fluindo para o seu corpo, lentamente aproxima os seus lábios virgens da boca masculina.
Sendo beijada profundamente, se entrega e se deixa levar pelo sabor da boca, do aroma almiscarado e da sensação prazerosa que percorre a todo o seu corpo.
Perdida nesse universo de sensações desconhecidas se entrega pela primeira vez, deixando surgir toda a sua vulnerabilidade e temores.
Apertada de encontro a ele, aconchegada no peito masculino ela se deixa levar e ser envolvida pelos braços dele...
Metros de distância dali, uma mulher de armadura e uma criança observam aos amantes.
Artemisa vendo e com um prazer quase doentio, arma o arco com a sua flecha, fazendo pontaria, atira.
A flecha corta o ar e no seu trajeto zune, como se fosse uma abelha em voo, seria interessante se não fosse medonho o barulho que ecoa pelo descampado.
Um som macabro anunciando desgraças e lágrimas...
A flecha vara aos amantes, perfurando-os e unindo-os pelo os corações.
Surpreendidos e surpresos se olham com um misto de dor, de amor, reconhecimento e saudade.
Ela sussurrar entre ofegos:
Sentir...
Insensato.
Sentidos...
Desacatados.
Sentimentos...
Desenfreados.
Sempre são e serão.
A salvação ou a perdição do homem.
Pois,
Ao se entregarem a eles,
O ser perde a sua paz ou finalmente a encontra?
Eis o dilema!
Que atormenta a alma daqueles que ousam sentir...
Desenfreadamente e plenamente os sentimentos.
Beijando pela última vez o seu amado, morre entre os braços dele, caindo abraçados e tombando na relva verde, a primeira e última alcova de ambos.
Artemisa observando a tudo, fala para Eros:
- Bom trabalho! Você já pensou o perigo que ela representaria para os seres?
- Ela sem está amando é cruel, imagine apaixonada, será um demônio incontrolável! Uma víbora a menos em Orion.
Eros, penalizado pelo casal, responde:
-Artemisa, realmente precisava exterminá-los? Ela estava querendo fugir, dava para notar que estava querendo apenas sobreviver...
Eros aprenda uma coisa, os Deuses sempre estão certos... Eles são apenas marionetes descartáveis para o nosso bel prazer.
Uma lagrima discreta desliza lentamente pelo rosto de Eros, ao vislumbrar pela ultima vez aos amantes.