Não me Deixe Solto

Esse texto faz parte do Homem Metade

Só sei disso. Nada mais. Mais me importa o não. Que o sim. Não me deixe solto. Porque se assim for. Eu estarei tão só. Preciso de alguém que me preencha. Essa minha metade devoradora. Estar só soa a solidão. Eu não preciso de um romance. Eu sou fragmentário. Vou me descobrindo em cada capítulo-conto que se fecha brevemente. Mundo imaginário. Imagética do que vem a ser o homem. Que nunca fui. E se fui. Deixei de sê-lo, breve. Como minha estória. Como o último homem que eu vi. A minha sombra. Há tanto tempo quanto tempo se passou? Não vi. Nem reparei. Nem mudei meus membros de lugar. O meu lugar, só se for dentro de mim. Um dentro que não entro. Que não reconheço. E sempre sempre sempre me esqueço. Com frequência. Porque buscar a si mesmo dentro de si é pura solidão. A felicidade fica longe de avistar. Longe de distinguir. Não há como distrair meu dentro. Porque me falta meu eu. Oh inconsciente irredutível redime minha alma/meio-corpo/matéria/fragmento rogo que me traga de volta. Seja do inferno. Seja da morte seja do sono ou do outono de outrora. Traga agora! Que é pra eu morrer em paz. Palavra vã. Paciência... estou solto num mundo onde não há gente. Eu não sou gente. Não sou nada. Estou preso em mim mesmo. Como uma faca no coração. Na pedra. Emperrada no metal. Eu quero a liberdade que não entendo. Porque o mundo se foi... foi parar justo dentro de mim. Eu, o mais humano dos inumanos. Eu, o coração na faca. Porque não há resposta. Não há sequer pergunta. E, no entanto, a lacuna imensurável, incurável e indesejável permanece. Eu sempre me perco dentro. Dentro das linhas dos meus fragmentos fictícios. Da minha vida de mentira. Porque é pouco. Porque sou menos, ao menos me conheço menos que isso. Disposto sintagmaticamente incoerente por entre essas linhas. Bambas. Como as bombas que caíram naquele dia decisivo de novembro, ou setembro ou dezembro. Não me lembro... não me deixe solto. Porque já estou preso e só. Sem você. Sem vontade. E sem vida. A vida pela metade.

DominiCke Obliterum
Enviado por DominiCke Obliterum em 28/01/2011
Código do texto: T2757881
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