O significado do Natal
Noite de Natal. Ele se arrastava pela rua, sem muita pressa de chegar em casa. Os últimos dias haviam sido cansativos, dia após dia, durante horas, sentado naquela cadeira, cercada por uma decoração natalina, com sua roupa vermelha e aquela imensa barba branca.
Só havia aceitado aquele trabalho pela necessidade. Depois que saíra de seu último emprego, não conseguira arranjar nenhum outro. Eram dias difíceis. Suas economias estavam acabando e precisava sobreviver. Um dia, passeando pelo shopping, vira a placa oferecendo a vaga de Papai Noel.
A princípio, não se interessou. Abominava o Natal. Não tinha família, seus pais morreram quando ainda era criança, fora criado por tios nada afetuosos. Pouco antes de completar a maioridade, foi concretizar a solidão em que já vivia, indo morar sozinho.
Também não acreditava no amor. A única paixão que tivera na vida nem percebia sua existência. Algumas namoradas que constavam no seu currículo, eram apenas para que ele pudesse conjugar o verbo namorar. Conjugou-o de forma intransitiva, sem direito a objetos nem adjuntos de nenhuma espécie.
Durante seus trinta anos de vida, tivera apenas dois amigos. Um morrera em um acidente e o outro morava fora do país.
Não tinha nenhuma boa lembrança do Natal. Realmente, aceitara o emprego apenas pela necessidade. Mas, contava os dias para que aquele tormento, de crianças no seu colo pedindo presentes que ele não iria dar, acabasse. Não tinha apreço por crianças, tinha especial antipatia por aquelas que pareciam fazer parte de uma família perfeitinha, com mãe, pai, irmãos, avós, reunidos em torno da mesa para a ceia de Natal, trocando presentes depois da meia-noite.
Mas, aquela fora a última noite. Finalmente acabara! Queria tão ardentemente sair daquele lugar e esquecer que um dia na vida fiizera o papel ridículo do bom velhinho, que nem trocou de roupa. E, assim, andando vestido de Papai Noel pelas ruas da cidade, ouviu uma voz. Parou, olhou ao redor e avistou dois garotos mal vestidos, acocorados numa calçada.
Um dos garotos, olhando fixamente em seus olhos perguntou: "Papai Noel, não sobrou presente pra nós de novo, né?". Sem entender o que ouvia, aproximou-se do garoto, que repetiu a pergunta: "Papai Noel, esse ano não tem presente pra nós de novo, né?" E, depois, completou: "Eu sei que você primeiro visita as casas ricas, se sobrar alguma coisa você dá pra gente, como daquela vez. Acho que, na pressa, você nem viu que tinha deixado perto da caçamba de lixo um carrinho quebrado. Mas, não teve problema. A gente entendeu que você não teve culpa.",
Com um nó na garganta, ele não sabia o que dizer.
O outro garoto abriu um saco de papel, de onde tirou um pão e uma latinha de refrigerante que, uma das inúmeras pessoas bondosas que passavam por ali todos os dias, havia lhes dado. E, com toda naturalidade do mundo, disse: "Papai Noel, você quer ficar para nossa ceia de Natal? Não é muito, mas a gente pode dividir com você."
O nó na garganta ficou mais apertado. Finalmente entendeu o significado do Natal.