Pedido Singelo
Escavações arqueológicas em meus frios quintais decembrinos de infância deram-me grata descoberta certo dia: um velho ursinho de pano. Tivera ele, certamente, um dia, um saudável tufo branco de saudável algodão. Ali agora era tão sujo que mal se podiam distinguir-lhe as feições. Foi cuidadosamente então resgatado, lavado, e seco no varal. Frágil e esfarrapado, seu abandono moribundo me tocava demais. Vivia calado. Duas pintas pretas queriam ser-lhe olhos, arregalados. A pinta vermelha mais embaixo era sua boca cerrada em lamentos de um soterramento cruel e vil de um doninho mau. Com tal zelo e carinho escondia-o sob meus cobertores. A partir dali eu sabia quão bom seria tê-lo ao final do dia, certo, esperando pelo meu abraço. Uma contrariedade ali pelo meio-dia. Um tropeço pela tarde. Qual nada. Era lembrar-me dele e a paz voltava. Encontrava-o sempre calado. Calados os dois insones abraçados atravessavam um pedaço de infância. Um dia então, o material puído de sua costura carcomida pelo tempo cedeu. Seu fino pescoço rompeu-se deixando derramar o encardido algodão que em si ainda havia. Nem sei se cheguei a dar-lhe um nome. Era ele sujinho e ordinário, e parte de mim. Ele foi meu brinquedo número 1. Se esse tal de Papai Noel existe mesmo, ele que o traga de volta pra mim! Vire-se!