EM NOME DO PAI

Lana sentiu um frio esquisito, depois que cruzou a última porta. O som das correntes provocou mal estar. “Tudo bem?” perguntou o carcereiro, “Sim” respondeu. Continuaram a caminhada até chegarem num corredor com várias entradas. Uma indicação sem palavras, fez com que ela entrasse em uma das portas. Encontrou uma sala pequena, com cheiro de mofo. No canto esquerdo, uma mesa e duas cadeiras. “Espere um pouco” disse o homem que continuou andando até uma saída para um outro corredor. Lana sentou-se e esperou.

“O que estou fazendo?” perguntou-se. Na verdade tal questionamento não deixou de estar presente em seus pensamentos, desde que decidiu visitar o tal de... Vadão, assassino do único filho dela, Marcos, morto covardemente num assalto depois de entregar todos os pertences e não esboçar reação. De acordo com as testemunhas, o jovem, então com dezoito anos, levantou os braços e foi alvejado com quatro tiros que ceifaram sua vida duas horas depois num hospital próximo. “Por quê?” era a pergunta.

Aguardou mais alguns minutos até que a figura alta e forte surgiu na portinhola. Acompanhado por policiais, o rosto magro e marcado trazia um olhar perdido e duvidoso. Lana sentiu o estômago se contrair. Sua boca secou. Sentiu vontade de matar aquele homem. Olhou-o com firmeza, mostrando todo o ódio que sentia. Vadão sentou-se. Lana também. Um silencio. Lembrou do nascimento do filho. Em segundos percorreu os dias, noites, fatos marcantes e a dor da noticia do bárbaro assassinato.

“Não posso voltar no tempo” ouviu a voz grave e embargada interrompendo o silencio. “Não. Não pode” respondeu. “Por que a senhora veio? Pra me humilhar?”; “Não!”; “Pra que, então?”; “Pra te fazer uma pergunta”; Vadão levantou o rosto e encontrou com o olhar desafiador de Lana: “Por quê?”. O homem baixou a cabeça em silencio. Um. Dois. Três minutos. Viu quando pingos de suor rolaram da testa dele. “Não sei” respondeu entre os dentes. “Você tem filhos?”; Vadão ergueu a cabeça assustado: “Por que a pergunta?”; “Me responda!”; “Tenho. Um”; De súbito, Lana levantou-se e disse ao Policial: “A Visita terminou”. Saiu daquela sala sem olhar para traz.

O tempo passou. Até que numa tarde de 24 de dezembro, Lana sentia a brisa de verão numa praça. Observava com carinho um menino que curtia livremente o novo presente de Natal, uma bicicleta. Ao lado, uma mulher, jovem, olhava para a cena mostrando certo constrangimento. “Já fez a matricula dele?” Lana perguntou; “Sim” respondeu a mulher; “Dona Lana, por que essa aproximação depois de tanto mal que lhe causamos?”; A pergunta provocou uma atenção especial. Ela pensou. Mordeu os lábios e respondeu: “Por nada, Kelly. Nada além de pagar o mal com o bem e cortar esta corrente maligna que faz vitimas como meu filho” concluiu, enquanto limpava uma lágrima teimosa que insistia em molhar seu rosto.