O mensageiro do Natal
Num lugar longínquo, em um tempo onde ainda não existiam telefones, Tv’s, computadores, carros, e principalmente, não haviam correios. Um homem fazia todas as entregas de cartas, mensagens, encomendas especiais...etc...
Era um senhor de idade que andava quilômetros à cavalo para entregar cada mensagem com sucesso dentro do prazo pré-definido. Todos o chamavam de Seu Nico. Havia uma regra. Ele não podia ler a mensagem que estivesse escrita na carta, que vinha timbrada e lacrada... para que não se envolvesse e não quebrasse sigilos, ou coisa pior, pois era época de guerra e ele entregava muitas mensagens vindas do próprio comandante do exército, e isto implicaria em algo muito perigoso para sua própria segurança... mas ele seguia as regras e executava seu trabalho com êxito.
Seu Nico nunca teve filhos ou fora casado, mas em um tempo remoto havia amado muito uma mulher que conhecera em certa primavera, onde as flores eram mais lindas e o perfume das rosas fundia-se com o ar. Mas a primavera se foi e levou junto aquela formosa e delicada rosa que não pôde seguir com aquele amor, pois era comprometida e estava a meses de seu casamento com um certo sargento do exército.
Seu Nico já estava com cinqüenta e seis anos, mas ainda assim não esquecera nunca daquele amor e seguia a vida sentindo realmente que havia encontrado e perdido a mulher de seus sonhos naquela primavera...
Em um certo dia, pra ser mais exato no mês de dezembro dia dezoito, ele recebeu uma missão. Era um envelope, que ele logo reconheceu ser do exército, e colocou em sua mochila sem curiosidade alguma em saber o que estava escrito, selou seu velho cavalo e partiu em longa viagem para entregar aquela carta.
A neve estava por todo lado, tempestades ao longo do caminho, ele cavalgava... uma mão no chapéu... outra nas rédeas do cavalo, guiando-o, mas não havia como continuar e procurou abrigo para se esconder daquela forte tempestade... Achando uma gruta no sopé de uma montanha ele entrou, seu velho cavalo muito cansado bufava e gemia num canto da escura caverna. Ali por sorte ele encontrou alguns galhos secos e pode se aquecer ao redor de uma pequena fogueira e dormir um sono tranqüilo até que fosse acordado com o relinchar do seu cavalo deitado no chão, as pernas imersas em neve, a neve que havia desabado do lado de fora e o fechado ali dentro. Seu cavalo estava ali preso, ele tentava com todas suas forças tira-lo , mas não adiantava, o cavalo não resistia, ele não podia gritar por ajuda pois poderia acontecer outro desabamento. E assim estava preso, sem comida, com poquíssima água em seu cantil, e uma carta que deveria entregar em seis dias. Deu várias voltas pela pequena caverna à procura de alguma passagem que o tirasse para fora dali, mas não encontrou nada, apenas em alguns pontos da entrada ele encontrou pequenos buracos onde se via muito pouco da pacata estrada lá fora, agora coberta de neve. O ar também não duraria muito, mesmo com estes orifícios ele não sabia o quanto iria agüentar e decidiu que deveria economizar ao máximo seu alimento, bebida e os próprios galhos para fazer fogo, o qual faria muito pouco agora visto que não tinha praticamente nada. Calculou que o alimento daria pra dois dias no máximo e que a água, bem, esta ele não achava que duraria nem mais um dia e meio. Os dois dias passaram, não viu nem ouviu ninguém por aquela deserta estrada. Ele continuava lá, seu cavalo soterrado já sem vida, ele comeu o pouco resto de feijão que sobrara naquela noite fria, e da água dava leves goles apenas para enganar sua sede que aumentava cada vez mais. Enquanto ele ficava ali imaginando o que iria acontecer.
No dia seguinte acordou sem noção das horas cheio de fome, mas agora sem comida, molhou novamente a boca, e lembrou-se de orar a Deus pedindo que ele o ajudasse e que não o levasse agora, que deixasse ele viver mais um pouco. Lágrimas descendo de seus olhos extremamente geladas... O dia passou e novamente ninguém havia passado por ali, e a noite caiu, a caverna totalmente escura, acabara de queimar o ultimo graveto, restava apenas a água que parecia se multiplicar naquele cantil. Mais uma manhã e Nico agora estava possuído pela fome, pela loucura e ânsia de sair daquele lugar, e lembrou-se novamente de orar a Deus, ajoelho-se e pediu que Deus o ajudasse, matasse sua fome, desse força pra que ele sobrevivesse até que alguém o encontrasse, e naquele instante ele desmaiou naquela caverna. Acordou horas depois o dia entardecendo, e lembrando-se de um sonho que teve enquanto ainda dormia. Ele procurou em sua mochila, pegou o canivete que ele havia ganhado de seu avô quando ainda menino e foi em direção ao cavalo, mas antes fechou seus olhos, agradeceu a Deus e chorou, após isto ele cortou um pedaço de carne do animal e comeu como se fosse um suculento filé-mignon. E assim foi no dia seguinte até que a água enfim acabou, mas mesmo assim Nico agradeceu a Deus pelo milagre que fizera aquela água durar mais dias e o ar não acabar mesmo que houvesse diminuído tanto a capacidade de respirar lá dentro. O dia passou, a sede que já era tanta aumentava ainda mais, Nico estava sentado no canto da caverna quando lembrou-se da carta e a pegou, e pela primeira vez lutou contra a vontade de abrir uma carta e lê-la, por fim resistiu e assim a guardou em seu bolso. Ele caiu na modorra ali mesmo. Nos seus sonhos sonhava com aquela rosa que ele tanto amou, eram felizes, viviam em uma cabana humilde, mas linda, na frente havia um belo jardim onde ele cultivava rosas, margaridas, tulipas, beijos, ah... ele sonhou com os beijos de sua amada, beijos singelos, beijos eternos, sonhou com o filho que nunca teve, ele sonhou tanto, e o sonho perdurou a noite inteira. Por fim acordou, o semblante revigorado, queria ter um espelho para vê-lo, pois sentia-se mais forte, parecia que o ar havia adentrado novamente ali, foi quando ele viu que não estava mais dentro da caverna, estava do lado de fora, dois homens ao seu lado e uma fogueira feita, ele enrolado em um cobertor.
- Fique calmo! Disse um dos homens.
- O meu amigo Tom aqui, me acordou de madrugada e disse ter sonhado com esta gruta, e que tínhamos que vir aqui, ele é muito religioso sabe, acredita que realmente recebeu um sinal, eu não sou assim, mas sou amigo dele e se ele me chama eu atendo. Viemos e pra minha surpresa lá estava você, vivo, e pelo estado de seu cavalo parece que estava lá à dias. Mas está forte, e bem. Não entendemos ainda o que você fez para que tivesse ar lá por tantos dias. Realmente me parece um milagre amigo.
- Sim, é um milagre. Disse Nico que se levantou e abraçou os homens que haviam o ajudado.
- Que dia é hoje?
- Hoje é sexta, dia 24 de dezembro.
- Dia 24... eu preciso ir. E assim ele se despediu daqueles amigos e seguiu sua caminhada. Agora sua missão parecia ser ainda mais impossível. Foi quando depois de duas horas andando encontrou um homem sentado em uma pedra.
- Senhor, Bom dia!
- Bom dia! Ele respondeu.
- Sabe de algum atalho que me leve o mais rápido possível para vila Esperança, tenho que entregar uma mensagem urgente.
- Claro que sim Nico, mais a frente há um trenó, e uns cachorros. Já andou de trenó antes?
- Não senhor... e nem quero, se tem cachorro, prefiro não arriscar, coisa de mensageiro.
- Então providenciarei algo diferente pra você amigo. Vá com Deus e ficará bem. Saberá como guiar o trenó.
- Se você está dizendo. Fique com Deus você também. Disse Nico. Cada maluco que a gente encontra por aí. Pensou ele, que seguiu andando.
Logo se deparou com algo mais louco do que o homem com quem ele havia se encontrado. Um enorme trenó vermelho, e nove renas com chifres, quatro pares de renas e mais uma solitária, sendo que esta tinha um nariz vermelho... naquele momento ele se lembrou do que o maluco disse, “Então providenciarei algo diferente pra você amigo”. Com aquilo também observou que o homem o havia chamado pelo nome, sem que ele o houvesse falado. Ou Nico estava delirando ou... Mas ele preferiu não pensar naquilo agora. Como andar naquele trenó. Ele olhou as renas e observou que elas tinham seus nomes gravados nas coleiras de bronze que usavam e os lendo em voz alta algo mágico aconteceu. Aquele trenó começou a flutuar, Nico correu e sentou-se no trenó e sem pensar duas vezes disse... Vamos renas, vamos Rodolfo, que era a de nariz vermelho. E o trenó voou guiado pelas renas, e por Nico que gargalhava feliz sobrevoando as nuvens, realizando o desejo maior que o homem sempre teve, o desejo de voar. Em certo momento seu chapéu caiu levado pelo vento e ele nem mesmo se preocupou. Por fim já era noite e lá do alto ele viu a Vila que ele tanto procurava, a lua cheia iluminava o céu. E ele aterrisou no telhado. Era incrível como ele manejava tão bem aquele trenó, mas agora ele não sabia como descer lá de cima. Por fim viu um chaminé, e a idéia mais louca passou por sua cabeça, descer por ali. Enfim desceu escorregando em meio ao carvão e por sorte a chaminé estava apagada. Estabanado caiu sentado no chão. Quando viu estava lá na frente de uma senhora conhecida e de um rapaz que muito lhe lembrava alguém.
- Nicolau? Surpreendeu-se a mulher.
- Não é possível! Disse ele. - Você?
Era sua rosa, ali na sua frente, parada, ainda com aquele perfume.
- O que faz aqui, entrando pela chaminé?
- Me desculpe. É uma carta que lhes trago. Algo do exército, deve ser do seu esposo.
- Meu esposo foi dado como morto há um ano, exatamente no natal. E por isso não comemoramos mais esta data. Seu corpo desapareceu, e nem isso eu pude enterrar. Restamos apenas eu e meu filho o Tomas.
- Belo rapaz. Quantos anos ele tem? Perguntou ele curioso.
- O bastante pra entender a perda, mas não o bastante pra aceita-la. Disse ela cortando a conversa.
- Tudo bem. Entendo. Aqui está sua carta. Disse ele que mais olhava pro rapaz que já tinha feições de homem.
- Não quero. Pode levar com você. De que adianta esta carta.
- Pois bem. Eu vou. Foi um imenso prazer te ver. E muito bom conhecer seu filho.
- O prazer foi meu.
Ele se despediu e saiu pela porta, desceu os degraus da escada e quando ia jogar a carta fora decidiu abri-la. E leu cada palavra, cada frase por completo, leu duas vezes sem acreditar. E correu... correu para dentro da casa daquela rosa.
- Ele está vivo! Seu marido ainda vive! Seu pai ainda vive! Venham... vejam!
- Do que está falando?
- Seu marido Flor, ele vive, eles o encontraram. O encontraram e bem. Ele chega amanhã, quer dizer hoje. Veja o relógio. É meia noite. É Natal. É um presente de Natal.
Ela caiu em prantos, soluços, o abraçou fortemente, um abraço de amigo, indiferente, diferente, abrangente... um abraço terno que o comoveu. O rapaz corria pela sala feito louco,pulava, se ajoelhava,agradecia a Deus, lágrimas no rosto, sorriso solto, de um canto ao outro da boca. Ele se comoveu ainda mais ao vê-lo assim.
Era natal... era Jesus... agora ele tinha certeza. E naquele dia ele soube o valor do natal, aquele velhinho mensageiro, que ganhou a eternidade de um abraço, recebeu um dom especial, virou símbolo do Natal!
E voando de trenó aquela noite no céu, o bom velhinho Nicolau virou Papai Noel.