Estranho menino

UM ESTRANHO MENINO

Anoitecia e a cidade estava toda enfeitada de luzes e cores. Músicas festivas inundavam as ruas, o povo andava depressa com embrulhos de presentes. Era 24 de dezembro, noite de Natal!

Ele surgiu de repente. De onde, ninguém viu. Tinha cerca de oito anos, moreninho, olhos e cabelos escuros, roupinha com alguns remendos, mas arrumadinho, penteado, havaianas nos pés. Muito esperto, corria entre os carros de uma calçada à outra, olhando as vitrines. Já ouvira falar do Natal e sabia que era dia de ganhar presentes. Gostaria de ganhar um carrinho.

Na porta da loja estavam três homens vestidos de vermelho fazendo “oh, oh, oh” e batendo sinos, com sacolas de presentes nas mãos, uma barriga enorme, barba e bigode muito brancos, distribuindo balas, doces e brinquedos para as crianças. Colocavam-nas no colo, conversavam, brincavam e tiravam fotografias com elas. Soube que cada um era chamado de “Papai Noel”.

Que bom! Ia pedir um presente a Papai Noel. Entrou na fila e emocionado foi se aproximando, encostou de leve a mão no seu joelho, preparando-se para sentar-lhe no colo e receber o mesmo carinho que ele vinha dedicando a todas as crianças. Foi rejeitado. Tentou com o outro homem. Foi empurrado para o lado. O terceiro virou-lhe as costas sem ao menos lhe dirigir o olhar. Desapontado, desistiu. Foi ver vitrines. Sorria quando as outras crianças recebiam presentes, abraçando-se e beijando-se, desejando feliz natal. O que significavam aqueles abraços e beijos? Ninguém o abraçava ninguém o beijava. Por quê? Não entendia!

Tentou entrar na loja e foi arrastado de volta para a calçada por um policial. Envergonhado, olhava para o chão, assustado. Tentou em outras lojas, mas novamente foi retirado aos empurrões. Quem sabe deixariam se segurasse a mão de alguém? Procurou as mãos dos homens, das senhoras, das moças, das meninas e meninos da sua idade, maiores e menores. Todos o evitavam e os adultos olhavam-no com desprezo, colocando-se entre ele e seus filhos.

Foi demais para seu pequeno coração! De repente um profundo suspiro saiu-lhe do peito, as lágrimas inundaram seus olhos e, então, descontrolado, sentou na beira da calçada chorando alto. Não tinha vergonha de chamar a atenção de quem passava. Mas as pessoas sequer olhavam para ele. Encostava timidamente as mãos nos adultos e pedia:

- "Moço, olhe para as crianças ao seu redor. Repare seus olhos ansiosos e tristonhos. Dê um presente a uma delas neste natal. Não lhes negue, elas não entenderão. Se não puder agora, talvez o Correio tenha uma lista de pedidos de crianças carentes. Elas pedem tão pouco! Arranje também um brinquedinho para mim, o que o senhor me quiser dar. Tenha caridade, moço. Sou uma criança pobre, não posso comprar. Gostei tanto daquele carrinho vermelho!".

Continuou a pedir por longas horas, mas não foi atendido. Com o rosto ainda úmido pelas lágrimas saiu andando, perdido, sem rumo, e nas ruas ia ouvindo a canção "Noite Feliz" sendo cantada nos lares e nas igrejas. Pelas janelas abertas via mesas fartas, alimentos e refrigerantes, balas, doces e presentes, muitos presentes. Nada sobrara para ele, nenhum alimento, abraço, carinho ou brinquedo, nenhum sinal de fraternidade. O cansaço, a fome e o sono foram chegando e ele adormeceu o sono dos inocentes abandonados, encolhidinho na porta de um templo fora da cidade ao abrigo do SENHOR.

Ao amanhecer ele desaparecera. Nunca mais foi visto. Ninguém se lembrou dele ou sentiu sua falta. Nem se interessaram em saber quem ele era ou o que viria a ser mais tarde após tanta rejeição, tanta amargura, tanta decepção e tantos sonhos desfeitos. Poderia ter qualquer nome, morar em qualquer lugar, ser mais uma criança abandonada, fruto de uma gravidez indesejada, um futuro toxicômano ou traficante de drogas!

Mas poderia também ser o Menino Jesus que viera disfarçado ao mundo e voltava mais uma vez à CASA do PAI, decepcionado e triste por testar inutilmente o que ensinara há dois mil anos.

Quem seria aquele menino?

Cassec
Enviado por Cassec em 08/06/2009
Código do texto: T1637755
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