A Roça de Um Homem Só
No interior da província de São Paulo vivia um grande fazendeiro que mantinha uma extensa plantação de café. O Havia tanto café plantado que se perdia de vista. Diversas carroças deixavam a fazenda anualmente, transportando sacos com os grãos que fariam a alegria de muita gente que apreciava a saborosa bebida. Com o passar dos anos, uma estranha situação começou a chamar a atenção das vilas vizinhas e a fama do fazendeiro, Antônio Batista se espalhou por algumas regiões da província.
Diferente dos demais fazendeiros que recolhiam trezentos sacos de café por ano, Antônio Batista recolhia cerca de setecentos sacos de café. Fato que por si só era absurdo. A partir do ano de 1823, o número de escravizados da fazenda de Antônio passou a diminuir, porém o ritmo das colheitas permanecia igual. Ano após ano, os fazendeiros vizinhos ficavam mais inconformados com seu maior concorrente e, cegos pela inveja, buscavam meios de o incriminar ou ao menos descobrir os segredos de tal êxito no plantio.
Em meados de 1826, um escravo de ganho conhecido como Silva foi incumbido de espionar a próspera fazenda de café. Dessa maneira, cruzava a estrada semanalmente a fim de recolher informações que deveriam ser repassadas aos fazendeiros locais. Silva fez diversas viagens e para o espanto da elite invejosa, o escravo relatou a mais absurda informação: De setembro a novembro, NENHUM escravo foi visto trabalhando nas plantações de Antônio. Quem plantava o café? Quem fazia o serviço pesado? Quem cuidava dos animais domésticos? Era um mistério que os fazendeiros não conseguiam solucionar. Silva dizia que não queria mais espionar porque a fazenda era estranha demais e que a única pessoa vista andando era o próprio Antônio.
Após algumas semanas, os rumores se espalharam. Viajantes e comerciantes faziam questão de desviar da fazenda do homem solitário. O local ficou conhecido como A roça de um homem só. Antônio era visto perambulando pela propriedade e raramente se aproximava do cercado.
A situação era tão sinistra que acabou por atrair a atenção das autoridades locais. Estas levaram o caso até Dom Pedro I que estaca ocupado demais com as exigências de seu cargo. Sequer deu ouvidos a história fantasiosa.
Afonso Correia, importante político paulista, acabou ajudando os fazendeiros e enviou uma comitiva para investigar “A roça de um homem só”. Aqueles homens nunca mais seriam os mesmos, pois o que viram ficou marcado para sempre em suas memórias. Ao aproximarem-se da fazenda misteriosa, perceberam que os cavalos ficaram nervosos e relutavam em continuar. Foi necessário um grande esforço para forçar os animais.
A comitiva alcançou a propriedade às seis horas da tarde e por alguns minutos ficaram parados observando o imenso campo aberto. Não havia nenhuma plantação de café, nenhuma construção, nem sinal do homem que vivia isolado na fazenda. Os homens avançaram pelo terreno sem dizer uma única palavra. Ninguém queria comentar a estranha situação. Estavam todos tomados pelo medo. O padre que acompanhava a comitiva fazia o sinal da cruz a cada metro que andava e os demais visitantes o imitavam.
Quando alcançaram o centro da propriedade, uma forte ventania levantou uma poeira densa que cegou a todos momentaneamente. Os cavalos relincharam e dispararam para longe com violência, deixando a comitiva caída no meio do vendaval. Quando o tormento cessou, encontraram uma estaca fincada na terra, bem próxima deles. O objeto aparecera durante a ventania. Enrolado na maldita madeira, um ramo de café balançava suavemente com a brisa, como que zombando dos visitantes. Padre André tomou a frente, se aproximou da estaca e a puxou com força. Ao arrancar a estaca, a ponta veio acompanhada com as mãos de um esqueleto que segurava firmemente o objeto. Nenhum deles conseguiu explicar depois, mas todos souberam que era a ossada de Antônio Batista.
O local que na semana anterior formava a maior fazenda de café da região, estava completamente deserto. Sumiu do mapa, como se nunca tivesse existido. A comitiva formada por Silva, Miguel, Afonso, Martim e Padre André partiu às pressas após encontrar o morto e recomendou que nenhum outro fazendeiro visitasse aquela propriedade, pois havia algo naquelas bandas que está além da compreensão do ser-humano.