UM FATO INESQUECÍVEL
Era um casal, dois irmãos: um menino que era muito esperto, falante, redito e atencioso, e que foi batizado com o nome de Davi e sua linda irmazinha chamada Rilza.
Ambos, apesar de serem bem crianças, eram muito tagarelas, inseparáveis e abundantemente risonhos. Eles, com qualquer objeto que achavam, transformavam aquilo num utensílio propício para brincar o tempo todo, o que poderia ser uma pedrinha, uma flor, uma varinha, uma folha ou qualquer coisa que lhes chamassem a atenção, e, assim, eles passavam o tempo contentes e felizes.
Aquelas criaturinhas conseguiam transformar o dia desgracioso no mais admirável momento para se viver. Sua mãe se deliciava de prazer, contentamento e felicidade ao vê-los no quintal brincando contentes, cheios de vida, risos e alegres. Para ela não podia existir nada comparável com aquele regozijo repleto de satisfação, distração e prazer que seus filhos lhes ofereciam.
Certo dia Davi pediu para sua mãe lhe dar um punhado de açúcar. Ela, mais que depressa, lhe atendeu e ofereceu-lhe o tal doce numa pequena cuia tal como o menino queria que assim fosse. Depois de comer a dita guloseima com a irmãzinha, o menino passou a exigir mais, mais e mais, repetidamente dizendo:
- Mãe, eu quelo atuta cum falinha; eu quelo atuta cum falinha.
Sua mãe cuidadosamente derramava na mesma cuia um punhado de farinha de mandioca e a misturava com um pouco de açúcar e logo oferecia para Davi, que, carinhosamente, dividia com Rilza.
Eles comiam fartamente e, dai por diante, passaram a não mais deixar a sua mãe em paz, pois a todo instante eles queriam a mesma coisa assim repetindo:
- Quelo atuta cum falinha, quelo atuta cum falinha.
Não existia outra espécie de doce para oferece-los, pois eles moravam na roça e não havia nas proximidades nenhum comércio que vendesse coisa doce.
O tempo foi passando e as duas crianças já estavam bem crescidas e muito mais unidas. Sua mãe se admirava com o grande amor que existia entre ambas, mas ela achava que ao crescerem aquele amor diminuísse e até acabasse. Mas como tudo tem começo, meio e fim, ela temia que aquela imensa felicidade um dia findasse mesmo, pois, infelizmente: “a vida tem prazo de validade”.
Numa exata quinta-feira de um mês de dezembro, o dia parecia ser bem diferente do normal, pois o calor do verão era sufocante e privava as crianças de irem brincar no quintal da casa, mas, mesmo assim, todos estavam contentes por se acharem unidos dentro de casa, quando, por volta do meio-dia, inesperadamente o menino Davi desmaiou. Para sua mãe o calor era a causa do desmaio. Foi um momento de extrema gravidade e de muita agitação dentro daquela humilde casa que ficava longe de tudo e de todos. O seu marido estava distante, trabalhando na roça.
Em meio àquela precipitação do momento, a mãe tomou seu filho nos braços e o deitou na cama. A menina Rilza ficou um pouco distante, estarrecida, e com o olhar pavoroso ao ver dantesca cena. Dela nem um som saia da sua boca. Sua mãe se pois a socorrer o pequeno Davi abanando-o com um pedaço de pano enquanto, carinhosamente, ela molhava o seu rostinho com outro pedaço de pano embebido na água fresca do pote, na desesperada esperança de ver seu amado filho voltar ao normal. De repente o menino abriu os olhos, estendeu sua mãozinha na direção da irmã e, olhando para ela, assim ele dizia:
- Vem Rilza! Vem Rilza! Vem Rilza!
Enquanto o menino chamava a sua irmã, sua voz ia pouco a pouco diminuindo de volume até ficar incompreensível. De súbito ele parou de respirar. Naquele exato momento uma forte chuva desaguou apenas sobre o telhado da casa. Fato esse provado por alguns vizinhos que ao serem gritados, acorreram em auxíliar aquela desesperada mãe e logo viram marcas deixadas pelo recente aguaceiro que ocorreu apenas no local.
A tristeza se abateu sobre aquela família que perdera um amado filho sem ter nenhuma explicação.
Oito dias se passaram quando outro absurdo repentinamente aconteceu com a pequenina Rilza. Como a atender aos agonizantes chamados do seu irmão, ela, subitamente se deitou e não mais levantou.
Aqueles trágicos instante, tal como aqui estão narrados, ficaram gravados na mente daquela mãe que durante toda sua existência relatava tal calamidade.
N O T A
Aquela mãe foi também a minha e as duas crianças foram meus irmãos.