OS GRITOS DO GAROTO

Os estranhos acontecimentos em nossa vida! Assemelham-se ao sopro do vento, às estrelas cadentes, súbito surgem atabalhoadas e espantam, atordoam. Todos nós já assistimos a esse filme por ser experiência comum, a qualquer momento ocorrem e as histórias são muitas. Contrapondo a ideia do usual reitero que comigo o fato marcou meu dia pelo ineditismo.

Fazendo a caminhada diária como de costume, a meio caminho escutei gritos estridentes e raivosos de um garotinho. Ao virar o rosto na direção do barulho vi o menino conduzido por uma jovem que me pareceu ser mãe dele. Os gritos de revolta só aumentavam, ele esperneava, se jogava no chão, batia na mulher, num determinado instante tirou as sandálias dos pés e as jogou para cima.

A pobre jovem mãe de tudo fazia para apaziguar o filho, falando carinhosa, tentando levá-lo aos braços, mas nada o acalmava. Tudo apenas piorava a situação já por demais vexatória. Naquele preciso instante senti a alma dizendo ao coração para fazer algo, aquilo não poderia continuar. Ainda hesitei uns dois segundos, pois afinal de contas não era problema meu, porém o grito da alma se fez mais forte.

Não tive como segurar o impulso, fui até os dois. Procurando não assustar a mulher, expressando gestos de pedido de desculpas aproximei-me da criança e descarreguei toda a autoridade paterna de que me revesti. O menino captou o imperativo de tudo que eu a ele disse aos gritos moderados, baixou o tom do choro, entregou-se a soluços trêmulos, os olhos fixos em mim.

A mãe apenas testemunhava apoiando minha intervenção e aguardando o desfecho. Por alguns minutos eu disse tudo que ele precisava ouvir, seus soluços aos poucos diminuíram, daí calou se. O remédio deu certo. Dei a impressão de que seguiria meu caminho, em seguida retornei para pronunciar os últimos conselhos.

Ao contínuo abençoei os dois e fui embora. Ignoro o que a mãe falou e qual a reação do garoto quando saí, mas o choro, a pirraça e o estardalhaço acabaram. Lá na frente escondi-me e visualizei os dois. Não tinha mais choro nem revolta, ele andava caladinho de mãos dadas com a mãe.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 15/07/2024
Reeditado em 15/07/2024
Código do texto: T8107555
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