Ligações.

Tocou o telefone, no meio do caminho havia um grande corredor. Nele chegando, ouvi, do outro lado, apenas respirações, talvez esperando pelo meu "alô?". Assim feito, recebi resposta alguns segundos depois: "Quem fala?". Achei abusado, mas segui o diálogo: "Eu, e você, quem é?". Com a mesma relativa demora, devolveu: "Uma pessoa!". Não imaginei. "E essa pessoa espera o que dessa ligação?". Nisso, desligou. Eu, portanto, fiz novamente a passagem de um lugar para outro, no qual tentava resolver um problema importante envolvendo agulhas. Eu estava sozinho numa casa imensa, propriedade de um tataravô passada através dos séculos. Sofrera algumas reformas, de modo que agora, estando eu grande o suficiente para vestir um terno sem parecer "bonitinho", possui três vezes mais o tamanho anterior. O problema pode ser somente o mau gosto em fazer esses corredores enormes e escuros, madeira da mais negra possível. Não pensem ser isso medo, talvez apenas preguiça. Enquanto mais uma gota de sangue escorreu de meus dedos, o telefone tocou novamente. A mesma coisa. Quando atendi, a mesmíssima respiração. Depois do alô, meu, disseram: "Ainda é "eu"?". Desliguei. Assim, porém, que tomei novamente a agulha, o aparelho disparou; estranhamente mais alto. Fui, não é? Admito estresse dessa vez, pronto para grosseria. "Olá, meu nome é Druso. O número é da residência Alves e Abreu. Faça o favor de se identificar e dizer, afinal, qual o intuito da ligação". Então, a voz disse: "Meu filho... por todo canto! Aqui é do Hospital Cidrão". E desligou! Dessa vez, bati forte. Voltei às pisadas, agi com certa rudez, fiando bem rápido, despreocupado com delicadeza, e ignorando se mais sangue se acumulava em mim. Respirando, pensei: do hospital..., será que liberaram algum laudo? Isso me deu considerável preocupação, e tamanha era que, quando ligaram pela quarta vez, apenas fui o mais rápido possível, sem lembrar de qualquer raiva. Atendi, mas começaram tão rapidamente os gritos que nem tive tempo da saudação inicial. Gritaria, barulho de madeira quebrando, coisa assim. Horrível. Diziam "pare! pare!". Eu, hein. Desliguei, fiquei um pouco chocado. Fiquei uns minutos parado lá, com a mente confusa entre o hospital, essa esquisitice de agora e outras coisas. Quando pensei em retornar ao meu feito, veio a outra ligação. Aquela respiração..., até me aliviei. Obedeci ao modus operandi e a voz começou: "Meu filho, o doutor Cidrão concluiu hoje pela madrugada as pendências de vosso registro. Custa vir buscar ou é preferível que levemos à casa?". Nesse caso, tentei firmar minha voz, apesar de sair mudo nas primeiras três palavras: "Eu mesmo, irei amanhã bem cedo, quatro e meia ou cinco. Senão for hoje pela noite. O diretor costuma ficar acordado nesse horário, não?". "Meu filho, bem que fica. Talvez goste de ver seu rosto e você por inteiro. Seus pais começam a enrugar as peles e o doutor Cidrão começa a enjoar das caras. Traga um presente para ele, será um bom início de amizade. O pai dele cuidou de seu tataravô, ele do seu avô, talvez o filho dele, quanto o ter, virá a cuidar de seus pais". Esquisitice, "Então tá certo". E o silêncio. Realmente, eu estava era assustado. Tentei me livrar daquilo, retornei à minha esquecida missão e, por azar, na hora de sair de lá pela última vez, larguei sem cuidado nenhum. Era um espelho, dois rostos assustados e ensanguentados se olhando...

Rodrigo Hontojita
Enviado por Rodrigo Hontojita em 09/12/2023
Código do texto: T7950487
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