O sabático. (miniconto)
Estranhamentos esses que temos, inexplicáveis. O incômodo repentino, o mundo parando e tudo se voltando para nós, destacados do todo vemos ele mesmo em movimento morto; mas há aí uma ilusão. Pensei na boa pedida de minha mente: um passeio. Quase um passamento. Espairecer. O abafo dos escritórios, a sanha do dever. Então, saí do edifício e me deparei com a rua e seus incessantes veículos e pedestres. Eu queria minha casa, acho. Parece toda essa rotina ser tão violenta de acontecimentos que a fuga para os sítios e interiores vira de fato uma sábia escolha. Eu pensava: de que vale viver assim? Ah, o dinheiro. Senti um pudor muito grande em mim, como se me vendesse para as contra-convenções, se saísse de uma maré para outra; um paradoxo engraçado.
O incômodo permanecia: o peso no peito, o desconforto com o desconhecido — talvez com os átomos do ar. Um triz para surtar! E esses pensamentos todos me vencendo? O amigo estoico falando há dias aquilo que é melhor para mim. Tudo tão influenciador, e minha própria estada passando a ser carroça. Não iria para sítio e não continuaria ali (naquela hora). Fiz o que faço de melhor: me afastei. O mais falso afastamento: saio para voltar. É tipo colocar o rosto para fora da água e tomar fôlego, só para retornar ao afogamento. O melhor, penso, seria tirar uns meses de folga para descansar e ir ao médico. Bem mais proveitoso. O sabático! Atravessei a rua e resolvi o passeio. Muros e gramas, verde, belas flores, calmaria. Tomar um ar e voltar, tudo voltaria ao normal. Findada a semana, diria meu tento para os próximos dois ou três meses. Tudo é questão de saúde. E também beleza.
O contraste do verde vivo com o gris cadavérico. A pedra e a grama. Aves, flores. Assim é. Ar muito suave. E nem os motores atrapalham. Pelos ladrilhos, a recordação do destacamento retorna, só o zumbido forte. E a esquisitice daquele sentir não passava de uma hipotensão. E o esquisitismo de um cara parado no meio do caminho não passava da tristeza de alguém abandonado. Passamos por esses diariamente, com aquele pesinho na consciência. E se eu falasse algo para o homem? Qualquer coisinha para não somente passar por ele. Mas nada. Acontece. Segui meu rumo, que deveria terminar no muro de lá, e retornaria ao meu posto, porém o peso veio de cima, sequer senti dor. Foi uma queda, apenas. E o vazio? Caí de cara no chão, estático, com medo. Meus queridos, não havia pedra no caminho, nem tropeço, nem empurrão, nem nada disso. O que vi, meu Deus? Meu rosto estava virado para o lado de onde eu vinha. O homem continuava no mesmo lugar. O que vi, senão eu mesmo?
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ñ.r.
v.n.d