O PECADO VERMELHO (o caso do amante sinistro)

 

 

 

Ed Ronaldo acordou meio zonzo, perdido no tempo. Não lembrava de como havia chegado em casa, muito menos a que horas. Sempre tão controlado, metódico com suas regras, não acreditava que fosse deixar as coisas saírem de seu controle. Nem em sua adolescência, Ed se permitiu fazer tolices. Agora, um homem com responsabilidades de adulto, via-se num dilema: acreditar ou não na dama de olhos castanhos e cabelos cacheados, de um corpo voluptuoso e de curvas perfeitas, dentro de um vestido vermelho, dona do par de pernas mais lindo que Ed Ronaldo já havia visto, uma voz doce e sensual. E que perfume era aquele? Seu perfume, “a culpa foi do perfume”, pensou Ed, "Foi ele que me desconcentrou e me fez perder o raciocínio ".

 

Mas todas as evidências levavam à morena de olhos amendoados. Seu álibi: não possuía consistência; motivos: não faltavam para ela; coragem: Ed constatou, Luiza possuía de sobra; Restava-lhe saber: foi ela que matou o ex-amante?

 

Ed sentia-se enfeitiçado pela dama de vermelho. Teria, ele, visto Luiza fazer um leve movimento com o nariz? O detetive estava procurando desculpas para seu encantamento pela morena. Queria colocar a culpa em algo fora da realidade, dizer que ele próprio não estava em seu juízo normal. Colocar a culpa de seus deslizes no oculto. No sobrenatural. No poder do além, se fosse o caso. Porque nunca, em toda sua carreira, se deixou levar por um par de olhos como aquele.

 

Seus devaneios levaram Ed para um passado, quando ainda morava com seus pais e recentemente havia concluído seu curso na web em dez sessões de cinquenta minutos. Esses pensamentos o fizeram questionar sua forma de investigação: será que sua técnica ainda lhe garantiria êxitos nos casos que, por ventura, ainda viriam em sua meteórica carreira? Será que Ed perderia o jeito com a idade?

 

Um pensamento lhe ocorreu: voltar às raízes. Entrou em seu quarto do passado, abriu o baú das recordações e lá estava ela; sua lanterna Led Lenser alemã, com bateria para até 18 horas; a mochila impermeável, luvas, sapatilhas para escalada, macacão térmico, lupa, binóculo, seu relógio Cosmos Soviet CCCP de origem russa, as botas de trilha Rugged Trail, o Iphone 11, óculos espião, chaveiro com câmera noturna para até 46 horas de gravação; o gravador espião biônico com alcance de até 100 metros. Não fazia parte de seu arsenal espião, mas estavam lá, sua cueca Lacoste e as meias Farfetch; isso ficou meio estranho, mas Ed possuía o raciocínio mais apurado usando as meias e aquela cueca; o iPad mini 4. Essas lembranças lhe trouxeram uma dor e saudade de Baretta, Fred e Bilao, seus amigos pet’s. Relembrou de seus ídolos da juventude: Holmes e Poirot. Sua bicicleta ainda na garagem — esse item, Ed dispensou, pois não faria sentido, ele, um homem adulto, fazer investigações e interrogar suspeitos, montado numa bike.

 

Primeiro passo: refazer os passos do ex-amante — que maneira desrespeitosa de se dirigir ao falecido — Ed pensou. Reformulou a frase: refazer os passos da vítima, o senhor Paulo M. de Carvalho.

 

No fatídico dia do “acidente”:

 

7h05: tomou café logo cedo na padaria da Olguinha, um hábito que havia adquirido desde que se mudara para o bairro da Saudade.

7h45: pegou uma condução com destino ao centro da cidade.

8h30: chegou ao trabalho.

12h00: saiu para o almoço num restaurante próximo à empresa.

12h37: um carro desgovernado avançou sobre a calçada, atropelando o senhor Paulo, ninguém conseguiu identificar a placa, pois a mesma encontrava-se adulterada.

 

Paulo, na véspera do ocorrido, teria se encontrado com Luiza; o motivo da conversa do casal não foi bem explicado pela moça. Teria, ela, motivos para subtrair informações do conteúdo da conversa entre os dois? Estaria, ele, chantageando a moça por algum motivo obscuro desconhecido por Ed? Luiza traiu Paulo? E se traiu, assassiná-lo por quê?

 

Ed Ronaldo, usando seus óculos espiões, chaveiro com câmera noturna para até 46 horas de gravação, o gravador espião biônico com alcance de até 100 metros, descobriu que Luiza estava sendo perseguida por seu ex, o qual queria dinheiro em troca de algumas fotos que possuía da moça. Fotos que o casal havia tirado em momentos íntimos. Luiza as queria de volta, e Paulo pedira uma pequena fortuna em troca das fotos. Provável motivo descoberto.

 

Próximo passo: verificar o álibi da moça.

 

Luiza negou-se a relatar à polícia onde e o que estava fazendo na hora do crime. Uma atitude mais que suspeita (sem álibi).

 

A missão: descobrir o quê e por que Luiza estaria escondendo algo.

 

Ed procurava desculpas para justificar os motivos pelos quais a moça subtraía informações que poderiam tirá-la da lista de suspeitos.

 

Mas Ed só pensava nos lábios carnudos, no perfume inebriante e na voz doce de Luiza. Ah! Doce Luiza. Se Ed fosse um poeta, com certeza faria uma poesia com rima e versos de amor.

 

Ed Ronaldo voltou à cena do crime para observar se havia marcas de frenagem no asfalto, interrogar as testemunhas, procurar qualquer indício. No restaurante onde a vítima costumava fazer as refeições, os funcionários não quiseram nem ouvir falar no nome do crápula. Parece que não era bem visto nem por eles, nem pelos clientes que por ali dividiam o ambiente com o finado. (Anotado)

 

Na empresa, fez algumas perguntas na portaria, na recepção, no RH; parece que Paulo não era um funcionário popular; implicava com todos; possuía uma postura nada agradável em relação aos trabalhadores mais humildes. Colecionava desafetos por onde passava. Sua rede de amigos era restrita, apenas alguns poucos elementos que se assemelhavam a ele no modo de pensar e agir, preconceituoso e arrogante.

 

— Assim fica difícil, esse sujeito colecionava desafetos, mas daí a ser morto? — Ed coletou os depoimentos dos colegas de trabalho e do pessoal do restaurante em seu gravador espião.

 

Faltava pegar os depoimentos da família.

 

Paulo não tinha filhos, sua mãe idosa não quis falar muito, apenas relatou que seu filho era um homem sofrido e mal compreendido. Sua única irmã soltou o verbo. Paulo era agressivo, chegando a ser violento com sua mãe, por várias vezes.

 

— Ora bolas, será que não vou encontrar nem uma alma que fale bem desse sujeito?

 

Seu último interrogatório, aquele que Ed vinha adiando, enfim: a morena da pele cor de mel. A feiticeira do perfume sedutor. A deusa que conseguiu o que mulher nenhuma conseguira nesses 38 anos de vida. Nem sua doce amada da juventude, a adorável Diana Helena, fora capaz de seduzi-lo com apenas um olhar, como havia feito essa mulher misteriosa de agora. Uma dama fatal.

 

Ed se preparou, municiou-se de toda sapiência que possuía, mas isto nada adiantaria se Luiza dissesse as palavras que Ed esperava ouvir; desejava de todo o coração que ela não tivesse passado o perfume. Ed resistiria aos encantos da sereia?

 

Já no local do interrogatório… sim, Ed tentava agir da maneira mais formal possível. Queria passar a impressão de um homem sério e imparcial.

 

— Senhorita Luiza, que tipo de relação você possuía com o senhor Paulo? — Ed perguntou sério e sem rodeios.

— Detetive, eu tive um breve relacionamento amoroso com Paulo; penso que saímos poucas vezes, talvez três ou quatro. Conta um almoço na hora do nosso intervalo?

— Conta sim, senhorita.

— Então foram quatro. — Ed Ronaldo continuava firme e até meio sisudo.

— A senhorita e o senhor Paulo tinham terminado há quanto tempo o relacionamento?

— Há dois meses. — Nesse momento, Luiza balançou os cabelos e o perfume chegou até Ed; seu raciocínio parou imediatamente; já não se lembrava mais onde estava, nem o que fazia ali. Não lembrava mais quais perguntas deveria fazer a Luiza. Uma coisa, porém, ele tinha certeza: aquela doce e frágil moça não poderia nunca ser uma assassina.

— Detetive, o senhor tem mais alguma pergunta? — Luiza perguntou ao homem estático à sua frente, que continuava mudo.

— Onde a senhorita estava na hora do acidente?

— Detetive, isso eu terei que declinar a lhe responder. — Ed Ronaldo ficou sem reação. Sem saber o que retrucar, deixou a moça ali mesmo, parada. Na verdade, Ed tentava não se deixar seduzir aos seus encantos.

 

Já na sua sala, com as evidências todas expostas, ouvindo as gravações em seu gravador espião, lendo as anotações em seu bloco de notas no seu iPad mini 4, Ed chegou à conclusão final. Desvendou o caso com muita facilidade. O mau-caráter do Paulo fora vítima de um fatídico acidente. Apesar de não cultivar amigos, não ser um cliente gentil, nem um filho carinhoso e, pelo jeito, um péssimo amante, ninguém havia matado o sujeitinho.

 

O carro com a placa adulterada? Essa foi fácil: um meliante quase adolescente o havia roubado e modificado; na pressa de fugir e na inexperiência de direção, atropelara o homem.

 

O carro e o meliante ainda imberbe foram encontrados por Ed. O carro, numa rua abandonada; o meliante, este não conseguira escapar dos instintos aguçados do soberbo detetive em seu encalço.

 

E Luiza, onde estaria? Com quem? O que fazia na hora do crime?

 

Um mistério que Ed Ronaldo ainda haveria de desvendar, de maneira particular e secreta.

 

 

 

 

 

 

 

Obs: história fictícia, com personagens fictícios. Qualquer semelhança terá sido mera coincidência.

Fanfic criada por Juliana Duarte Honorato, em homenagem ao universo misterioso do personagem Ed Ronaldo, de Max Rocha.

– As Aventuras de Ed Ronaldo (o detetive soberbo).