A Mulher do Riacho
O Alfredo era um rapaz vaidoso, jovem e muito trabalhador, um dos cinco filhos de Dona Joaquina e Seu Camilo, homem de fibra e que trabalhava na roça em seu pedacinho de terra, às margens do Rio das Velhas, de onde tirava o sustento da casa.
A família era muito querida na região e sempre que havia alguma festa religiosa, terço ou leilão ela era convidada e o Seu Camilo ajudava e também, pois, era festeiro na Festa de São Jorge e doando sempre uma prenda.
O Alfredo gostava muito de uma dança e saía a pé ou arriava um cavalo e em altas horas da noite ele saía sertão afora pela vizinhança, para dançar. As donzelas da região adoravam dançar com o ele e até o apelidaram de “Afredinho pé de valsa.” Era um alvoroço quando ele chegava à festa.
A Dona Joaquina dizia sempre a ele:
- Arfredo. Ocê tem a mania de saí pelo sertão em artas zora e ocê inda vai topá cum a Muié do riacho. Ela ficá à meia-nôte na bêra do Riacho do Sono e ela é muitio bunita e é uma sombração que diz os que já viu, quéla fais coisa de assombrá inté sombração.
O Alfredo ouvindo aquilo foi logo retrucando:
- Uai mãe! Se ela é bunita que male tem? Meu cavalo guenta nóis dois.
Dona Joaquina logo interrompeu:
- Arfredo! Ocê tá abusano? Deus castiga! Dispois num diga queu num falei. Num abusa dessas coisa.
O Alfredo saiu dali cabisbaixo e foi tomar banho no Córrego do Vento, que passava logo ao fundo da palhoça, pois, ia acontecer um grande forró na palhoça do Seu Afonso lá no pé da Serra da Raposa e era um terço em agradecimento pela fartura na lavoura e claro! Aquelas donzelas lindas iam estar presentes.
Aprontou-se, vestiu o melhor terno de roupas que tinha - como diziam por ali - e arriou o seu cavalo chamado Cristal. O pelo do animal brilhava feito o cristal ao clarão da lua.
Ela foi-se para o tão afamado forró. O vento aliado assanhava a crina do Cristal e o bom de sela invadia o sertão e até o animal estava feliz, pois, ia encontrar belas éguas.
Depois de certo tempo de trote, ele chega ao famoso Riacho do Sono. De repente um canto lindo e harmonioso e lá aquela mulher maravilhosa. Morena, Cabelos longos, olhos feitos jabuticabas, uma pele linda e mais parecia uma índia e a sua volta um clarão. Ele maravilhado se dirige à bela moça e:
- Banôte, ó bela donzela! Quale o seu nome e o que ocê fais aqui pressas banda nessas zora? Pode me falá?
Ela educadamente:
- Claro! Meu nome é Sarita! Estou aqui a admirar a noite e o mistério da lua aos olhos das estrelas! Eu estou sempre aqui nas noites de lua cheia! E você? Aonde vai tão elegante e perfumado neste belo cavalo?
Ele lisonjeado:
- Ora, Bela dama! Brigado pelo inlogio nóis tá ino ao forró na casa do Seu Afonso grande amigo da famiage e bem que vosse mecê pudia ir cumigo pa mode nóis dançá inté o dia crariá!
Naquilo a bela dama deu um sorriso de felicidade e:
- Eu vou aceitar! Estou feliz por demais!
O Cristal deu uma ajeitada em seu lombo e ele subiu no cavalo e gentilmente estendeu a mão e ela por sua vez também se ajeitou. E ele:
- Vamo Cristale! Já dá pa mode ôvi a sanfona chiá no forró. E hoje ao lado desta linda dama o terrêro vai sê piqueno pa nóis dois! Num é Sarita?
E ela calada.
E quem disse que o Cristal conseguia ir para frente? O Alfredo esporava, gritava, puxava a rédea e nada! O suor já vertia em sua face e o Cristal só se abaixando e parecia que o peso era tanto que o pobre animal não resistia e ele não ia nem para frente e nem para trás. E ela calada.
Depois de alguns segundos, Alfredo olha para trás e cadê a bela Sarita? Sumiu de repente e o Alfredo foi se arrepiando e o Cristal tremendo e aquele clarão desapareceu. O Cristal arregalou os olhos e o Alfredo pulou no lombo do pangaré e os cabelos arrepiados esvoaçando ao vento sertão afora, cortando mato nos peitos.
Chegando à palhoça todo estropiado, arranhado pelos espinhos e espantados encontram com a dona Joaquina na janela da palhoça e ela:
- Uai! Arfredo! O forró durô pôco. Vai vê que o sanfonêro num foi. O que aconticeu, Arfredo? Ocê tá mais ripiado do que gato quando sai da água! E o Cristale tá bufano feitio um bode véio! Iscrarece preu mei fio!
Se colocasse a mão na boca do Alfredo ele cairia duro. E:
- Mãe! Discurpa! Temei cum a sinhora e vi a tale mulher do Riacho. Bunita ela é... mais... é uma sombração! Quando subiu no Cristale o pobrezin num guentô e quando eu oiêi pa trais, nem rasto dela! Num é, Cristal?
A coisa foi tão feia que o Cristal até sacudiu a cabeça. E Dona Joaquina:
- Vai! Ocê num querditô! É bão pa mode ocê pará de andá em arta zora pelo sertão. Isso é coisa dôto mundo! Vai pegá o Rusaro e rezá.
Conta-se na região, que o Alfredo reza todos os dias e que ficou por muito tempo sem ir ao forró nas redondezas. E ele dá voltas pelo sertão pra não passar pelo Riacho do Sono. Já o Cristal só de ouvir a Dona Joaquina falar em riacho, ele sacode as orelhas.
Coisas do sertão! E você? Acredita em assombração?
Inté!