O TEMÍVEL GOGÓ-DE-SOLA - O ASSASSINO DAS MATAS
O TEMÍVEL GOGÓ-DE-SOLA - O ASSASSINO DAS MATAS
LENDAS AMAZÔNICAS
Autor: Moyses Laredo
Talvez você nunca tenha ouvido falar da lenda do temível macaco gogó-de-sola. Ele é uma criatura carregada de mitos e lendas bem comuns no Norte do Brasil. O gogó-de-sola (Bassaricyon beddardi) é um mamífero arborícola de hábito noturno pertencente à família Procyonidae, encontrado no Brasil, Guiana e Venezuela. Esses animais tem aspecto semelhante ao dos juparás (gênero Potos), porém não possuem caudas preênsis. São pequenos em estaturas, medem cerca de 40 cm e pesam até 1,5 kg. Suas caudas são espessas e apresentam discretas bandas pretas, com até 40 cm de comprimento, como a maioria dos procionídeos.
Segundo crença da maioria dos acreanos, diz ser um macaco que se parece como qualquer outro, que vive nas matas distantes dos tapiris e zonas de habitação. Diz-se que o nome lhe veio por possuir o pescoço castanho-avermelhado, pelado, semelhante ao coro de sola de sapato. Destaca-se, entretanto, dos outros seres da sua espécie, pela sua alta ferocidade, muito agressivo, valente e altamente ofensivo, não se tem notícias de algum deles domesticado, nunca foi xerimbabo (em tupi “coisa muito querida”) de ninguém. Sua mordida é forte apesar de seu pequeno porte, mas, a sua dentição se assemelha a dos guaxinins. Ataca qualquer animal, não faz distinção ao tamanho da presa, isso não o amedronta, também se vale da quantidade de indivíduos do seu bando e aproveita a ferocidade de todos. Ataca inclusive a onça se tiver no seu caminho, animais de fazenda, como o burro, o bezerro, a ovelha, ele é onívoro. No homem, ele vê ameaça e assim o ataca também.
É fama que, onde ele crava os dentes, ninguém jamais consegue abrir sua boca, só se lhes cortarem a cabeça. Os caçadores temem-no, visto que não há bala que lhes acerte, por melhor que seja a pontaria do atirador. O diabo é a ligeireza dele, o tempo de o homem achar a mira, apertar o gatilho e a bala sair, ele já percebeu e por isso nunca está onde a bala chega, isso se deve ao seu momento ótico. Animais pequenos tendem a perceber o mundo em câmera lenta, segundo uma nova pesquisa. Isso significa que eles conseguem observar os movimentos de maneira mais detalhada que criaturas maiores, permitindo que escapem de predadores. Nesses movimentos, eles conseguem perceber os pormenores da ação e se antecipam, pulam que nem o “cão pequeno” quando solto da garrafa, principalmente quando se sente acuado entram em frenesi. O cachorro é uma de suas vítimas preferidas. Vários cachorros matreiros acostumado em acuar caças, como macacos soin, macacos de cheiro, cutias, pacas etc., já pereceram em encontros com os diabinhos miúdos.
Alguns supõem ser na verdade, o gogó-de-sola, um cão do mato, atacado de hidrofobia, tanto é assim que só nos meses de fevereiro e março, devido à metamorfose da doença, é que ele é encontrado.
A lenda do Gogó-de-Sola, fábula ou realidade, diz ser uma criatura muito valente pertencente da mitologia acreana. Conta a lenda que sua dentada é tão forte que, quando morde uma presa, só solta depois que a mata, ou se for contra humanos, somente depois de ter a própria cabeça decepada. Não tem facão ou terçado que consiga abrir a boca dele, a musculatura se fecha com tanta força que às vezes até lhes quebra os dentes. É também além de agressivo, muito temido porque não tem bala que o acerte, como dito; com ele só na base do porrete, assim se conta lá pelas terras dos Aquiry.
O relato conhecido mais antigo desse mito data de 1938 e encontra-se no livro Folclore Acreano, de Francisco Peres de Lima, conforme documentado por Luís da Câmara Cascudo em Geografia dos Mitos Brasileiros (1947), 1ª reimpressão, Editora Global, 2010:
“Possui o nocivo animal uma agilidade extraordinária, as suas dentadas são perigosíssimas e assemelham-se às das cobras venenosas; o seu tamanho é invulgar pela pequenez, por isso, o homem, quando atacado, não pode lançar mão das armas de fogo como meio de defesa, porque seria inútil. A arma mais apropriada para esse caso é o terçado ou cacete”.
No mato, anda sempre em bandos, acima nas copas, trepado nos galhos das árvores, saltando de um lado para outro, numa aflição com gritos bem caracterizada de loucura.
Todo animal selvagem, à princípio, tem medo do homem; entretanto, isto não se dá com o Gogó-de-Sola que, apesar do seu tamanho minúsculo, avança contra o homem em uma fúria descomunal. É comum, nos meses acima referidos, esse animal, em bando, sair dos lugares de suas habitações, causando verdadeiro terror aos moradores. Fábula ou realidade, o Gogó-de-Sola é criatura muito valente, como disse, faz parte da mitologia acreana.
As histórias de encontros com o gogó-de-sola são inúmeras, principalmente com seringueiros que se deparam com os bandos já quase no amanhecer do dia. Os macacos gogó-de-sola são notívagos. Por isso, os seringueiros preferem aguardar para retornar das estradas de seringas ainda sob a luz do sol.
Seu Honório, um seringueiro experiente pacato, nos altos dos seus sessenta e poucos anos, sofridos com a vida penosa de trabalho insano nas estradas de seringa, conta que certa vez, morava na colocação do Vai-quem-quer, no seringal Bolívia, quando se preparava para cortar a última seringueira da sua estrada, coisa de depois de meia noite, ouviu bem de longe os gritos frenéticos e alucinantes, característico do bando de macacos gogó-de-sola, reconheceu na hora, já tinha passado pela mesma experiência, das outras vezes só ficou nisso mesmo, mas dessa as coisas se complicaram, os chamados encontro de 3º grau com eles são sempre horripilantes. Embora não soubesse onde estavam e em qual direção iam, ou vinham, mas, pressentindo o pior, preferiu se proteger, baixou o jamanxim (cestaria indígena de cipó utilizada por nativos da Floresta Amazônica que prendem com alças nas costas) com sua carga, se armou de um porrete numa mão que o acompanhava desde o seu primeiro encontro, e mais, um terçado Tramontina 21 Polegadas (70cm) cabo em madeira, na outra. Em posição de defesa protegendo as costas, aguardou o ataque em silêncio bem quieto, diz ele que não fez nenhum movimento, só suava que escorria perna a baixo, não dava conta pra saber se era mijo ou suor mesmo, do jeito que estava se escorou na frondosa árvore à sua frente, permanecendo de cócoras salvaguardando sempre suas costas. Ficou atento a qualquer ruído de balanço de galho, a escuridão da noite cegava-lhe a visão, pois não sabia de que lado provinha o ataque, mas sabia ao certo de ser iminente.
Os gogós-de-sola, chegaram como anunciaram, e foram logo cercando o acuado seringueiro, aos gritos frenéticos do bando que ressoava como um único som gutural, um deles saltou sobre o seringueiro, que poderia ser o líder, sem receio, como faz a onça quando surpreende a cutia no acero. Não fazia o menor sentido para o velho seringueiro um animalzinho de pouco mais de 1,5kg atacando um humano de 60Kg, até pensou em segurá-lo pela nuca com fazia com os soins (Calitriquídeos) onde em bandos abonavam suas bananeiras. Mas, como dizem que o homem prevenido vale por dois, o seu Honório não contou “miséra” e deu uma porretada com medo e muita vontade de acertar, o que o fez de primeira, a cabeça do líder dos gogós-de-sola foi atingida num barulho oco, como o baque da queda de um coco no chão. Foi uma bela tacada pensou ele, acertou o macaco como o jogador de beisebol acerta a bola na sua primeira tacada, o pobre macaquinho não soube o que o atingiu, voou pra longe, mas e o ataque?...será que por isso parou?...se pensar que amedrontou os outros, nem de perto se viu isso, a horda inteira desceu mais furiosa e ficou ao redor do pobre homem ameaçadoramente, gritando e saltando por sobre sua cabeça dando impulso nos troncos das árvores e até mesmo a própria árvore onde o seringueiro se protegia, com seus movimentos rápidos, iguais aqueles joguinho de Fliperama, o Pimbal, em que a bola rebate nas barras magnéticas a um arremesso somente, a bola no caso eram os macaquinhos. Aqui acolá, um deles saltava em direção a garganta do seu Honório, local preferido quando atacam suas presas. Seu Honório se defendia ora com o terçado, ora com o porrete, um ou outro se prendia na roupa do seringueiro, mas logo era derrubado. Essa inana, durou foi tempo, o seu Honório mesmo assim, conseguiu derrubar outros tantos e cortou também um bocado deles. Sentiu o sangue escorrer da sua mão e perna, já estava sem esperança, pois ao contrário de que achava ser sangue dos macacos, era dele próprio das mordidas, achou que desta vez seria o seu fim. Mas de repente, alguma coisa os atraiu e todos se voltaram em uma direção. Em questão de minutos se foram do mesmo jeito que chegaram aos gritos, só que com algumas baixas, mas a quantidade deles era tanta que sequer notaram. O seu Honório nem quis saber de mais nada, deu pra trás e desembestou no rumo de casa.
Outros contam que perderam seus cachorros matreiros um por um, em ataques dos gogós-de-sola, dão graças aos cachorros que os atrasaram, senão todos estariam mortos. Um dos encontros se deu quando um grupo de caçadores foram rastrear uma onça que disseram estava atacando a bezerrada, eles achavam que era onça, mas por azar se depararam com um bando de gogós-de-sola no caminho. Todos escaparam fedendo, fedendo mesmo pois alguns se cagaram nas calças, desse jeito mesmo foi relatado por um dos sobreviventes.
Um senhor morador de Porto Velho/Rondônia, teve um encontro de 3º grau com eles, bem à noite em sua Fazenda que fazia limite com um trecho da mata, deparou-se com um deles no pasto com o olhar firme o encarando a uns poucos metros à sua frente, o viu e ficou-lhe a encarar, com uma expressão que meteu muito medo, a pele dos olhos caídas sobre a testa, as orelhas em pé, ele próprio sobre as patas traseiras, como se quisesse mostrar mais altura e impor mais respeito com a pose, e de que estava prestes a atacar. O senhor recuou lentamente entrou no carro e saiu fora de lá. O que lhe chamou a atenção foi o som que ele emitia, é impossível não o identificar, e nesse dia estava ouvindo muito o som deles ao longe na mata. Acha que aquele encontro foi com o vigia deles, aquele que fica a observar o ambiente.
Outros tem convicção de que o macaco Gogó-de-Sola existe de verdade e não é macaco!...ele é um carnívoro noturno da família dos guaxinins e que vive nas matas de terra firme do Acre, Bolívia e Peru. Dizem os pesquisadores americanos que ele é um animal da família dos Olingos Bassiricyons que habitam o Leste da Cordilheira dos Andes e está em alto grau de extinção, mas, ainda existem alguns deles no Alto Acre na fronteira com o Peru na Reserva Indígena de Mamuadate. Não tem como comparar de que o Gogó-de-sola e o Janaú são lendas, longe disso, eles são reais.
Pelo sim ou pelo não, a lenda beira a realidade, principalmente quando é recheada de exemplos, não se deve ignorá-la, sempre quando for andar na mata, ou trilha ou caminho para pescaria, sempre levar um porrete de reserva que como disse, pelo sim ou pelo não, pode te servir para alguma coisa.