FOI O GATO

Sempre gostei da companhia dos gatos, com eles tendo excelente conexão e empatia. Lembro que o primeiro a ser adotado por mim, e na época eu não tinha conhecimento suficiente para cuidar dele devidamente, foi um filhote branquinho como a neve, verdadeira fofura que me agradou à primeira vista.

Mas nossa amizade e parceria não duraram muito. Como já afirmado acima, faltava-me profundidade no trato adequado com o felino, aquele algo mais além do amor por sua presença em minha vida, isto é a experiência de como criar de forma correta o bichano. Apesar de dar ao bichinho tudo que ele necessitava e receber dele reciprocidade, por alguma razão desconhecida certo dia, ao voltar do trabalho, deparei com ele morto no sofá. Senti um forte impacto de perda irreparável, culpei-me mesmo sem saber o por quê de sua morte, chorei muito e fiquei inconsolável.

Depois de ver o gatinho desaparecer de minha vida bruscamente, dediquei-me à leitura sobre os felinos domésticos, com o intuito de somente adotar outros gatos quando soubesse com detalhes quais seriam os cuidados que deveria ter em todos os sentidos no intuito de proporcionar-lhe uma vida longa, feliz e saudável.

Assim, meu segundo animal de estimação, outro gatinho, entrou em minha vida com toda pompa. Na oportunidade, eu já fazia ideia de todas as suas habilidades e qualidades instintivas. Aliás, foi justamente uma dessas impressionantes habilidades que me tirou de uma grande enrascada.

Certa vez fui passear com meu gatinho numa praia deserta, local pouco explorado e por isso mesmo de meu agrado, pois gosto de vivenciar lugares desconhecidos e longe de aglomeração. Ele, agora já adulto e na plenitude de suas capacidades, em minha companhia também desde filhote, a tudo se mostrou atento, animado e muito feliz pelo passeio. Tive que deixar o carro a uma certa distância e seguir andando para chegar à praia, não havia estrada transitável.

O pet ia sobre meus ombros, às vezes ronronando, o rabinho balançando e os olhos em alerta por todo o caminho, cerca de meio quilômetro. Passamos por matagal, pedregulhos, árvores, poças d'água e variada paisagem atraente e chamativa. Por fim alcançamos o bendito local. Que deslumbrante! E não avistamos mais ninguém além de mim e o companheiro felino. Ficamos o dia inteiro e nos divertimos bastante, valeu a pena o esforço para viver aquele momento num espaço pouco ou quase nada conhecido do grande público

Ao entardecer, felizes, fizemos o caminho de volta até o local onde estacionei o carro. Desta feita meu gato ia caminhando ao meu lado, todo sapeca e satisfeito. Em determinado momento, porém, notei que não sabia onde estava, sem reconhecer os pontos de referência que pensei ter memorizado. Atordoado, parei, olhei, procurei e, apavorado, percebi que me havia perdido. Indo na frente, o gato olhou para trás, vendo o ar de assustado em meus olhos. Ele miou, torceu levemente o rabo erguido, foi ao meu encontro, enroscou-se-me na perna como se quisesse me confortar. Logo, pondo o olhar sobre meu rosto, miou novamente, mas de maneira diferente e estranha. Voltou a andar, parou e me direcionou o focinho sereno. Parecia acentuar o propósito de ser seguido por mim, que tudo daria certo porque ele sabia como sair dali

Miou mais duas vezes, andou alguns passos, outra vez me olhou, tornando a caminhar e desta feita com a segurança de quem tinha tudo sob controle, de quem rumava na direção correta e a mostrava para mim. Nesse momento, o coração aliviado, entendi que ele realmente se movia na rota perfeita e detinha na memória os traços do caminho de volta até o carro. E, para minha perplexidade, dizia isso com gestos e atitudes. Assim foi, o senso de direção do bichano nos levou em absoluta segurança para o veículo que nos esperava. Suspirando aliviado, tomei-o nos braços e lhe fiz um carinho especial de gratidão. Naquele precioso instante, o coração a mil, concluí que se não fosse ele com certeza eu estaria em maus lençóis.