A CASA QUE FALAVA

Quem primeiro escutou a voz da casa, numa certa noite chuvosa e fria, foi a esposa de Roberto. Seu marido dormia quando ela levantou da cama para ir ao banheiro, os olhos acostumados à escuridão da suite e por essa razão a mulher nunca acendia nenhuma lâmpada. Isso ajudava a dormir mais depressa tão logo voltava para o leito.

Ao sentar no vaso sanitário, subitamente um som cavernoso em tom quase sussurante encheu seus ouvidos. " Está muito frio hoje!", disse aquela voz estranha. A mulher quase caiu arrebatada pelo susto, e correu em disparada aos prantos. Chamou o marido apavorada, relatou o ocorrido, os dois foram ao banheiro, acenderam a luz, mas não havia mais ninguém além deles. O silêncio tinha voltado.

Outras duas vezes a mulher ouviu a mesma voz e não suportou o pânico e o nervosismo. Como da primeira vez, o marido a acompanhou ao banheiro e nada de ruido nem sussuro. Dessa vez, porém, por insistência da esposa o casal resolveu deixar a casa. A origem daquela voz cavernosa permaneceu nas brumas do desconhecido.

Novos inquilinos passaram a residir na residência em poucos dias, alheios ao problema aparentemente sobrenatural ali existente. Os moradores recém chegados tinha uma filha adolescente, que dormia na segunda suíte. Foi ela a segunda pessoa a escutar a frase numa madrugada chuvosa. Entrou em polvorosa, disparando no rumo do quarto dos pais numa agitação incontrolável.

O pai armou-se dum porrete e fez minuciosa vistoria na suite sem nada encontrar. A voz existia, mas de onde vinha? Como duas noites depois aconteceu novamente igual movimento, os tais inquilinos também resolveram devolver a casa ao proprietário.

O que estaria ocorrendo naquela casa? Ciente dos motivos para saída dos inquilinos, levou um amigo que se dizia entendedor de assuntos difusos, com a finalidade de achar uma pista e explicação plausível para o fenômeno. Foi então que, depois de permanecer sozinho nas duas suítes, a seu pedido, colocar as mãos nas paredes, encostar nelas o ouvido, esbugalhados os olhos de surpresa, o sensitivo concluiu, por razões não especificadas, que a voz não era humana. A casa falava.

O que ela pretendia ao comunicar-se com os moradores? Sentia-se só, precisava do calor humano, da presença de pessoas caminhando em seu assoalho e, dentro do possível, conversar com ela. Como não a compreendam, vivia amargurada e, as vezes, temia falar para não assustar. Mas a tentação de ouvir a própria voz a levava a dirigir-se aos humanos que nela moravam. Isso a entristecia cada vez mais. Falar tinha sido sua ruína, provocou ainda mais o realce de sua solidão. No entanto, continuaria, jamais deixaria de procurar contato verbal com quantos nela residissem.