O BECO DA MORTE

Embora a alcunha fosse jocosa, deselegante e um tanto estranha, ele não se importava de ser chamado assim. Aliás, até se acostumou e gostava, incorporando-a ao seu cotidiano como se fosse parte do nome dele. Sujeito alegre, brincalhão, amante do futebol, fazia-se benquisto por todos.

Já o irmão de Mané Chatim, Zé da Beira, a quem ele amava e por quem tinha admiração quase religiosa, era realmente um pé no saco. Brigão, arruaceiro, desordeiro e mal educado, vivia arranjando confusão por onde passava. Apreciador de uma cachacinha maneira, andava de bar em bar se embriagando e provocando balbúrdia, ora batendo ora apanhando. Nada, porém, fora de sua rotina nem capaz de preocupar em demasia. Até o dia em que, num domingo, bêbado, metido num auê pesado, esmurrou violentamente um conhecido de longa data e este, armado com uma faca, esfaqueou-o duas vezes, matando-o. O assassino fugiu.

Ao saber do ocorrido, Mané Chatim entrou em pane, gritou em desespero e jurou vingança. No mesmo dia após o sepultamento do irmão, Mané Chatim foi à casa do irmão do assassino pensando que o desgraçado estava escondido lá. Antes tomou um porre, armou-se e deu um show de gritaria, chamando para fora, para morrer, o cara que ele imaginava estar escondido ali. Aos berros, usando palavras de baixo calão sob o olhar silencioso do dono da casa, que era pacato e calmo, e da vizinhança, esbravejou até altas horas da noite. Depois, cansado, fumando numa quenga, foi embora.

Essa cena dantesca se repetiu inúmeras vezes e ninguém chamava a polícia para retirar Mané Chatim da frente da casa do irmão do assassino. Que, paciente e em silêncio, suportava o incomodo daquela presença rançosa e barulhenta sem ter nada a ver com o problema. Afinal de contas, seu irmão não estava escondido lá, não se conhecia seu paradeiro. Só que Mané Chatim continuava com a ideia fixa contrária, pouco se lixando se perturbava um inocente e seus vizinhos na busca incessante por vingança.

Mas Mané Chatim era humano e mortal. Algumas semanas após a violenta morte do irmão e de suas incursões à procura do responsável pelo terrível ato, ele próprio foi encontrado morto com uma facada na nuca. A investigação policial minuciosa não logrou descobrir o autor do crime. O assassino de seu irmão também nunca foi encontrado. O clube de futebol da cidade, de quem era torcedor fanático, conseguiu com alguns vereadores homenagear Mané Chatim pondo seu nome num beco sem saída próximo ao estádio. Por coincidência, o tal beco, por razões desconhecidas, chamava-se "Beco da morte."

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 03/01/2023
Reeditado em 03/01/2023
Código do texto: T7686005
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.