A MADRASTA

Ele queria gritar, ser ouvido, bradar como uma criança assustada. Não que estivesse com receio de algo ou alguém, mas simplesmente porque precisava e sentia a premente necessidade de expor seu desabafo. O silêncio, no entanto o impedia, o mesmo mutismo iniciado há quinze anos quando tudo desmoronou em sua vida. O doloroso império da solidão silenciosa impusera a tristeza de ouvir apenas os próprios soluços.

E tudo por causa de uma escolha repentina e malfeita, a pior de sua vida. Essa preferência o traiu, demoliu emoções, afastou amigos e afugentou familiares, destruiu os sorrisos de todos os dias. O prazer instantâneo da opção, no primeiro instante, enriqueceu seu rosto com iluminada satisfação, o fez pular entusiasmado, desafiar estruturas afetivas, pensar que aquela enganosa felicidade duraria para sempre. Leda reflexão! Durou pouco e teve por consequência a estado de silêncio a que foi submetido.

Nove anos de gozo passageiro se transformaram em quinze de abandono, desprezo e indiferença. Como abandonou, fora abandonado, como desprezou também foi desprezado, por ter zombado do sofrimento alheio agora riam dele, e tendo ficado indiferente às lágrimas de tantos, a vida o levara a chorar sozinho. Poderia até gritar, se quisesse, entabular conversa com qualquer pessoa, todavia acabava falando sozinho. Seus gritos seriam ouvidos, mas o tomariam por louco, jamais por um homem que queria somente ter com quem conversar. O silêncio se tornou seu dono juntamente com a madrasta solidão.

Gilbamar de Oliveira Bezerra
Enviado por Gilbamar de Oliveira Bezerra em 09/11/2022
Reeditado em 09/11/2022
Código do texto: T7646283
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