O MISTÉRIO DA ORQUÍDEA
Como aconteceu tudo aquilo? Inexplicável! Não era dia ou noite nem madrugada, foi-me impossível discernir em que momento estávamos das vinte e quatro horas. Porque foi um misto de esquisitamente sombrio e encantadoramente maravilhoso, raio de luz e resquícios de sombra, doçura e amargura, ternura e tortura. Mas teve também o inesquecível rastro de extasiante perfume, que não sei se onde fluiu.
Amávamos jardins floridos e cheios de lindos beija-flores, tínhamos o nosso próprio do qual cuidávamos com muito carinho, um cuidado especial na verdade. Ir ao jardim ao amanhecer sempre foi nossa prioridade, para ver os botões se abrindo, ou flores maduras e esplendorosas, os roseirais exalando o odor indescritível de suas primaveras. Ali conversávamos, riamos sobremaneira e trocávamos afagos. Apenas quando ela falava na própria morte e que queria ser cremada para espalhar suas cinzas sobre o solo daquela muda de orquídea que nunca brotava. Apesar dos cuidados especiais. Eu ficava sério pedindo para ela não falar sobre isso, era uma mulher bastante jovem e tinha muita vida linda pela frente.
Mas a vida sempre nos surpreende com seu pacto com a morte. Acometida por um violento câncer de mama descoberto quando estava em estágio terminal, Maria partiu. Embora chorando e infeliz, atendi seu último pedido, seu corpo foi cremado e aspergi as cinzas do amor de minha vida ao redor da muda de orquídea. Enquanto cumpria esse triste dever, eu me debulhava em lágrimas encharcando suas cinzas. E perdi a vontade de voltar ao nosso amado jardim.
Numa inesperada noite, num estado deprimente de amargura e saudades, sonhei com Maria. Para minha surpresa, a única coisa que ela me pediu foi para ir ao jardim ao amanhecer. Assim fiz quando acordei pela manhã. Senti os mesmos perfumes de outrora ainda que não tivesse regado o local em virtude de minha tristeza. As poucas chuvas e o orvalho fizeram isso por mim. Então, se repente, atônito, vi a muda de orquídea florescida, e havia uma bela orquídea, de espécie desconhecida por mim. Era tão linda quanto o arco-íris, formosa, espalhava encanto, brilhava num frenesi docemente fulgido. O mais importante de tudo era que a orquídea sorria e...e... pasmem, tinha o sorriso de Maria.