A menina de asas
1941 –
No final do vilarejo vem sempre um vento amoroso pelo início da noite de julho. Neste lugar, de repente se ouve o choro de um bebê. O som se espalha com as folhas das bananeiras, numa clara certeza de que a menina nasceu.
E na noite estrelada eu vi que a menina tinha asas.
Pequeninas asas que foram rapidamente cobertas pela blusinha.
1943 –
Depois de dois anos, os pais da menina resolvem conversar secretamente com a família:
Ah, as asas!
Todos se calam...
Como a menina nasceu com asas?
Qual seria a causa de uma criança nascer com asas? Seria milagrosa?
A curiosidade faz com que a menina seja examinada.
De tão silenciosos que os pais ficam, é inútil buscar respostas que ninguém tem, que não sabem...
Mas pedaços de folhas secas deslizam pelo chão no terreiro e se prendem na cerca de tábuas dizendo que existe uma finalidade para tudo.
Eu ainda vi rastros de pessoas num caminho se distanciando.
1950 –
É aniversário da menina! O pai conta uma história do nascimento de pássaros que nascem com asas, mas que não sabem voar. Para reforçar, a mãe explica que as asinhas da filha não são fortes e que elas estão crescendo presas, dobradas...
Em frente da casa, a menina tem um sorriso cheio de esperanças antes de os pais seguirem para a roça.
E assim, sob a luz clara da manhã a menina tira a blusa e corre pelo quintal esquecida no vento com as asinhas se agitando nas costas.
Eis a inocência!
De súbito, o voo leve sem os pés no chão... Para cair logo mais com uma asa machucada!
Caída no chão, a menina sente dores na asa esquerda e chora pelos pais.
À noite, eu os vi rezando um Pai-Nosso ao lado da caminha da menina.
Dias atuais –
Na casa de varanda, uma velhinha está reunida com os filhos e netos – todos ansiosos pelo fim da história. Eles estavam convictos de que tinha existido uma menina com asas. Eles já viram falar de tanta coisa que existia e porque iriam duvidar de uma menina ter nascido com asas?
Como obtemos as respostas dos mistérios da vida?
O crepitar da pipoca na panela é ouvido lá da cozinha. A velha senhora caminha devagar pela varanda enquanto todos admiram a bacia cheia de pipocas quentinhas...
– Sente, vovozinha!
Ai, essa coceira nas costas!...