Pesticida
Haviam se esforçado muito para reaprender o que o tempo e a falta de exercícios levaram ao esquecimento, com muito empenho não apenas recuperaram como registraram profundamente em seus corpos as orações da árdua diretriz.
Eram tidos com os fracos, desajeitados e irrelevantes, porém, mal sabiam que por detrás dos invólucros de ignorância escondiam-se as flores da glória, aromas de pequenas enormes vitórias não régias.
À medida que iam falando, destrinchando fibra por fibra a matéria amorfa que lhes roeu por dentro durante semanas, entorpeciam os sentidos de alguns dos espectadores anestesiando-lhes a lucidez e forçando um estado de subserviência. As cochonilhas no que lhes concerne, resistiam e moviam-se inquietas, alfinetando a fonte da vida buscando nutrientes e despejando torrentes de toxinas naqueles corpos segregados. Ah como se refestelavam na escorregadia seiva do fracasso e do constrangimento, àquela altura o dano já estava feito e seus apetites satisfeitos, foi quando notaram todos um estranho fenômeno.
Das paredes brancas e lisas iluminadas pelo falso olho, pequenos pontos surgiam e destes cresciam ramos que os ligavam num crochê bizarro, essa catapora virtual se alastrou rapidamente para além da continência da luz, e logo todo ambiente exibia os pontos vermelhos e pretos interligados. As cochonilhas sentiram um arrepio descarregar violento, como um raio sobre seus corpos. Três segundos, em apenas uma trindade de tempo as pequenas pragas foram envoltas em centenas de tentáculos cravejados de espinhos que brotavam dos pontos. Paralisados, os discursantes assistiram lentamente tal qual uma espinha purulenta é espremida, uma a uma, as cochonilhas serem mortas esmagadas, enchendo o chão de uma secreção escarlate e mau cheirosa.
Quando o cronômetro tocou e a falsa luz se apagou, quase todos retornaram a si, estranhando a letargia que recaíra sobre eles exceto, alguns que seguiam inconscientes e imóveis. Assim permaneceram até o instituto médico-legal vir recolher seus corpos misteriosamente desidratados. Longe dos olhos e ouvidos tumultuando a cena do crime, alguém assistia à tragédia com um sutil sorriso avermelhado e com um agradável calor de prazer no peito.