A estrada
Em uma estrada de terra na Amazônia, Marcos dirigia seu carro no meio da noite. Ele e aquele caminho eram velhos amigos. Se conheceram no primeiro dia de trabalho, Mais precisamente na primeira noite que o pistoleiro asssassinou alguém.
Dessa vez a vítima ainda não estava morta, apenas agonizava no porta-malas. E Marcos ponderava parar o carro no meio da estrada e dormir. Até de manhã o homem perderia muito sangue e morreria.
Refletiu durante alguns minutos e parou o veículo. Acendeu um cigarro, ligou o rádio e sentiu prazer em pensar que sua vítima sangraria até a morte dentro de um local abafado e sujo com sangue de outras pessoas. Depois era só jogar o corpo em algum rio. Achou aquilo melhor do que só matar e enterrar.
Seus olhos estavam quase pregados quando os faróis apagaram, fazendo a escuridão invadir o móvel. Quase instantaneamente o motor morreu e o rádio bugou. A música relaxante dava lugar a um chiado forte. Imediatamente Marcos o desligou e tentava ligar o carro. No meio das tentativas percebeu uma espécie de luz vermelha em forma de círculo se aproximando. Era bem redonda e pequena.
Assustado, tentou acender a lanterna guardada no bolso, mas ela não queria funcionar. Saiu e foi tateando. Tirou o homem do lugar onde ele estava, e no escuro perguntava: Que porra tá acontecendo caralho? Você armou para mim foi? Enquanto gritava para o cadáver a luz se aproximou ficando na frente do assassino.
Ele tentava se mexer para atirar, no entanto algo além do medo o mantinha imóvel. O círculo vermelho resplandeceu em forte luz branca envolvendo todo o ambiente e depois novamente escuridão. Porém o pistoleiro e o morto sumiram...
A porta do quarto se abriu lentamente. A fresta era pequena, mas permitiu a luz do corretor iluminar o ambiente. A luz do amanhecer.
A causadora do movimento logo surgiu na visão de Ana. Era Maria sua filhinha.
- O papai já chegou? Perguntou a pequena.
- Não minha estrelinha ele disse que voltava amanhã. Eram quatro dias lembra? - respondeu a mãe tentando esconder a expressão de choro.
- Mas ontem você disse que era apenas três e que ele voltaria hoje.
- Disse? Será que não foi um sonho? Um daqueles que costuma ter, relacianado com a realidade, só que é sempre outra coisa? Mas não vamos falar disso, vem aqui me dá um abraço de bom dia.
Durante o abraço o celular tocou. Era estranho alguém ligar aquela hora do dia. Quem liga a seis horas da manhã? Ana ignorou e disse à filha: vem, vou ligar o chuveiro para você tomar banho enquanto faço o café.
Na cozinha, terminado o preparo do café, a mãe voltou a chorar. Ela não dormira, passara a noite em pranto pelo marido. Já era o quarto dia sem notícia dele. Estava desaparecido. Nenhuma mensagem ou ligação. E os amigos policiais também não o encontravam.
Aquela situação sufocava seu coração. E já não conseguia mais mentir para filha. Se perguntava: Qual desculpa darei amanhã? Durante seu pensamento o celular voltou a tocar. Novamente a mulher ignorou, Mas passados alguns segundos o dispositivo retornou.
Agora Ana temia atender. E se fosse uma notícia ruim sobre o esposo. O aparelho tocava e ela pensava. Ponderava não está preparada para a má notícia. Até que a curiosidade venceu, a fazendo atender
- Bom dia - disse uma voz grossa meio cansada. Era Henrique amigo de Jorge. Os dois entraram na PM juntos.
- Bom dia- Ana o reconheceu pela voz- e... alguma notícia sobre o Jorge- Era possível sentir o medo na sua voz. As palavras quase não saindo.
- Sim Ana- O policial respondeu e guardou silêncio
- Então.. fale
- Nós encontramos um carro abandonado em uma estrada. No porta-malas havia sangue. E no meio dele encontramos uma foto. Na qual estava você e a Maria.
- Alô?Alô?... Ana você está aí? Alô?!
No chão ao lado da mulher o celular transmitia as palavras de Henrique, Porém ela não conseguia conter o choro. O esposo com certeza estava morto, pois prometera nunca perder a foto dela e de Maria.
Ouvindo os passos da filha, desligou o aparelho imediatamente. correu para o banheiro e se trancou.
- Mamãe você está aí? - Ouviu a filha perguntar
-Sim. A mamãe vai tomar banho
- Mas você sempre toma banho depois de tomar café comigo
- Só que você já é uma moçinha de sete anos. Já se veste sozinha. Então também pode colocar seu café. É só encher a xicará e pegar a bolacha.
- É que eu gosto da sua companhia, sua e da do papai. só que ele não tá aqui. Quando ele volta?
A mãe contraiu os lábios, fechou os olhos, usou toda sua força para não demonstrar e choro e disse: Em breve minha filha, em breve.
- Espero que sim. Sonhei com ele essa noite.
- Como foi o sonho?
- Ele estava dentro de um lugar fechado, chorando. De repente apareceu um homem e levou ele.
- Como o homem o levou? Se ele estava em um local fechado?
- Não sei. Só vi ele sendo arrastado por uma estrada de terra.
- E você não ficou assustada com esse sonho?
- Sim, até acordei, mas acabei dormindo de novo. Estava sentindo um sono muito forte.
- E depois sonhou com algo mais?
- Não.
- Tudo bem minha filha. Já estou terminando.
De baixo do chuveiro, Ana decidiu que perguntaria para Henrique onde o carro estava. Esperava não ser em uma estrada de terra.