O TESOURO NO COFRE
Logo depois que o meu avô morreu, a família quis saber o que ele tinha guardado no cofre dele. Era um cofre antigo de aproximadamente um metro de altura, por uns cinquenta centímetros de largura e uns quarenta centímetros de profundidade. Era um cofre grande e pesadíssimo. Sabíamos que provavelmente não tinha dinheiro guardado lá dentro... pois o dinheiro, meu avô guardava no banco. Porém, especulava-se que meu avô em segredo pudesse ter joia ou até ouro guardado e “não declarado”.
O que se sabia é que ao mover o cofre, podia-se ouvir o ruído de alguma coisa que estava lá dentro, recluso e protegido como se fosse o tesouro de um rei. Só o meu avô possuía a senha da porta do cofre e a levou para o tumulo. Verdade também seja dita... a essa altura, alguns membros da família já tinham sido mordidos pelo “bichinho” da ambição e da cobiça, que sempre ataca aqueles que só enxergam os benefícios ofertados em partilhas e heranças. E como o suposto tesouro do meu avô não foi mencionado no inventário, ninguém queria tirar o olho daquele cofre. Havia uma expectativa grande.
Em uma espécie de reunião “extraordinária”, ficou decidido que seria chamado um chaveiro especialista em abertura de cofres, que realizaria o trabalho na presença dos familiares e também do advogado responsável pelo inventário. Alguns exigiram que todo o conteúdo descoberto fosse registrado, documentado, etc... E assim foi feito. O próprio advogado indicou um chaveiro capaz de descobrir a senha e abrir o cofre. Os dois chegaram na hora marcada. Os familiares se reuniram no quarto onde ficava o cofre. O chaveiro foi apresentado a todos os presentes, em seguida, se agachou em frente ao cofre com algumas pequenas ferramentas e com aparente facilidade e surpreendente rapidez destrancou o “baú do tesouro”.
O som estalado do destravar da porta do cofre acelerou os corações dos ansiosos familiares. Arrisco-me a dizer que alguns esperavam ver o brilho de barras e moedas de ouro irradiando ao abrir a porta do cofre do meu avô. O chaveiro recolheu suas ferramentas e se retirou. O advogado pediu permissão para revelar o que tinha no cofre. Todos concordaram. A porta foi escancarada. No interior do cofre, havia uma caixa de papelão com pequenas garrafas de guaraná. Meu avô adorava aquele refrigerante de guaraná, e aparentemente, só usava o cofre como uma espécie de armário-adega. A família ficou surpresa. Alguns sorriram, achando graça; outros ficaram nitidamente decepcionados, pois esperavam encontrar outra coisa.
Segundo a minha avó, o meu avô sempre aparecia no quarto com um copo de guaraná. O velho precisava beber o refrigerante antes de ir dormir, e às vezes, ainda se levantava durante a madrugada para beber mais um copo. Refletindo sobre esse episódio, entendi que aquela bebida, apesar de conter o tal do cancerígeno corante de caramelo, era o tesouro do meu avô. Acho que o meu avô focava nas doçuras da vida. As pessoas andam precisando disso. Os verdadeiros tesouros da vida são aqueles que nos fazem felizes. Ser é mais importante do que ter. O que você guarda no seu cofre pode dizer muito sobre o que você tem, mas também pode dizer muito sobre quem você é. Fica uma última pergunta para fazer fritar os nossos neurônios: Em nossos “cofres”... Devemos guardar o que tem preço ou o que tem valor?