O monstro do armário
Havia um grande armário antigo no quarto de Amy, e ela tinha medo de que, enquanto dormia, um monstro horrível saísse dali para pegá-la. Portanto, sempre deixava acesa a luz do abajur cor-de-rosa, sobre a cabeceira da cama.
Certa noite, Amy acordou sobressaltada. Tudo estava escuro ao seu redor, o abajur havia se apagado. Foi então que ela imaginou ouvir alguma coisa arranhando a porta do armário, pelo lado de dentro. Amy não teve dúvidas sobre o que fazer: soltou um grito a plenos pulmões.
- Amy! O que foi? - Exclamou a mãe da menina ao chegar, instantes depois, e acender a luz do quarto.
Amy, apavorada, apenas apontou para o armário, com o braço estendido.
- Monstro, monstro - conseguiu articular finalmente.
A mãe não se impressionou. Com um gesto confiante, abriu de par em par as portas do armário. Lá dentro, apenas roupas penduradas, ordeiramente.
- Não tem monstro nenhum aqui dentro, Amy - declarou, enfaticamente.
Fechou as portas e fez menção de apagar a luz do quarto.
- Não! - Gritou Amy. - O abajur não acende!
A mãe aproximou-se da cama e apertou o interruptor do abajur várias vezes; efetivamente, a lâmpada estava queimada.
- Espere que eu vou na cozinha buscar uma lâmpada - avisou.
Amy ficou sentada na cama, tensa, apesar da luz acesa. Só relaxou quando a mãe voltou, trocou a lâmpada e a testou para ver se tudo estava funcionando.
- Agora sim, vamos todos dormir - suspirou a mãe, deixando o abajur aceso e beijando a filha. - Durma bem, meu anjo.
E apagou a luz do quarto, saindo em seguida.
Amy ainda ficou um bom tempo acordada sob as cobertas, esperando ouvir algum ruído suspeito vindo do armário. Como nada mais se ouvisse e o abajur continuasse aceso, ela acabou por adormecer novamente.
* * *
Duas noites depois, Amy despertou em sua cama com a sensação de que havia alguma coisa errada. Certamente, não era com a lâmpada do abajur, cuja luz ela podia ver apesar de estar totalmente enrolada nas cobertas; também, não ouviu nenhum barulho anormal. Cautelosamente, virou-se na direção do armário e abriu uma fresta no cobertor para olhar na direção dele; e para seu profundo horror, verificou que as portas do móvel estavam abertas de par em par. E dentro dele...
Não teve dúvidas: soltou um grito que estremeceu a casa inteira.
- Amy! De novo? - Recriminou a mãe ao entrar no quarto e acender a luz. - Isso é desculpa para ir dormir na minha cama?
- Mãe, mãe... - repetiu a menina, braço esticado apontando para o armário.
Foi então que a mãe virou-se na direção do móvel. E abriu a boca, estupefata.
- Você fez isso, Amy? - Indagou ela em voz baixa, benzendo-se.
- Não, mãe. Eu juro - redarguiu a menina, lutando contra o choro.
- Vem cá. Você vai dormir comigo esta noite... de manhã eu vejo o que vamos fazer.
Amy correu na direção da mãe. E abraçou as pernas dela, aliviada.
* * *
- O monstro do armário? - Indagou o pai de Amy em tom de gracejo, ao chegar na manhã seguinte à casa onde viviam a ex-mulher e a filha.
- Eu não mexi em nada, deixei exatamente como estava hoje de madrugada - redarguiu a mãe, muito séria. - Você vai poder tirar as suas próprias conclusões.
Foram até o quarto da menina. Amy já havia ido para a escola.
- É um móvel antigo... as portas podem ter aberto sozinhas por alguma vibração... um caminhão passando pela rua, talvez - avaliou o pai, não parecendo impressionado.
- Sim, imagino que isso possa ter uma explicação lógica - assentiu a mãe. - Mas veja como estão as roupas dentro do armário!
Ainda não convencido, o ex-marido a encarou, mão no queixo.
- Que eu saiba, Amy não tem problemas de sonambulismo - insistiu a mãe.
- E você certamente nunca foi uma maníaca por controle - admitiu o pai. - Sim, isso realmente é muito esquisito.
Dentro do armário, as roupas de Amy haviam sido ordenadas cuidadosamente, por ordem de cor, em degradê: as mais claras de um lado, as mais escuras na outra extermidade.
- É um trabalho profissional - ponderou a mãe. - Não sei se chamo um exorcista ou se aproveito para colocar minhas roupas aí dentro e levar as da Amy para o meu quarto.
- Você até pode experimentar - avaliou o pai. - Mas talvez a entidade não fique satisfeita e ache que você está querendo se aproveitar do trabalho dela... e destrua as roupas.
Naquele mesmo dia, a mãe colocou um anúncio online, vendendo o armário. E providenciou a compra de outro, novo, para o quarto da filha.
A entidade "personal organizer" não voltou a manifestar-se.
- [17-02-2020]