CRUZ A BEIRA DA ESTRADA
Quando me deparo com uma cruz a beira da estrada chego a conclusão de um atropelamento ou acidente com veículos.
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Quem seria o mortal de triste sina?
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A curiosidade me queimava por dentro, me deixava angustiado este segredo guardado
no símbolo cristão.
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Uma cruz enegrecida, abandonada, indicando que a desgraça passara por lá ceifando uma vida.
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Gostaria de tomar conhecimento deste fato, do dia fatídico e como as pessoas se envolveram
nesta tragédia.
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Dias destes não resisti, passei por uma delas fincada à beira do caminho e estacionei o carro ao lado.
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Olhei com muita curiosidade para a velha cruz.
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Podia-se ver uma data entalhada de modo rudimentar, um tanto desgastada pelo tempo, quase apagada: 31/08/2000 e as iniciais escritas de forma irregular M. M.
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Quase 19 anos do fatídico dia da infausta ocorrência.
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Olhei ao derredor e avistei uma velha choupana mais adiante.
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Me aproximei e bati palmas com vigor para chamar a atenção de algum morador.
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Poucos segundos após surge na soleira da velha moradia uma idosa senhora.
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Ela aparentava ter uns 85 anos, andava arqueada e apoiava-se num velha e rudimentar bengala.
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Roupas remendadas e rotas, chinelos desgastados, um gorrinho cobria-lhe a cabeça esbranquiçada pelo tempo.
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Quando me atendeu notei que dois ou três dentes lhe faltavam na boca e suas mãos tremiam...
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Olhos tristes, me encarou seriamente, olhos opacos.
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- "Tarde" seu moço, posso lhe ajudar? ... sussurrou numa voz debilitada.
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Senhora, creio que é moradora há bastante tempo desta região e gostaria que me informasse sobre a pequena cruz à beira da estrada, por acaso tomou conhecimento
do ocorrido?
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-Ah! ...meu senhor, nem queira saber...
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- Já faz mais de 18 anos que aconteceu aquela desgraça...
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- E... como foi? A senhora poderia me contar?
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- Vou lhe dizer com muita tristeza do ocorrido:
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- Eu tinha uma filha chamada Mafalda, ela perdeu seu emprego na cidade e veio me ajudar no roçado e na pequena criação de porcos e galinhas que eu tinha no terreiro da casinha.
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Era pouca a produção mas dava para nosso sustento.
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Tínhamos também algumas árvores de frutas e pequena plantação de verduras e legumes.
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- Mafalda há 3 anos engravidara de um sujeito bandido que a abandonou e ao seu filho Marcelo, escafedendo-se pelo mundo.
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- Prá encurtar a conversa, certo dia Mafalda e o filho estavam naquela esquina esperando o ônibus que os levaria para a cidade, ela havia arrumado um emprego de doméstica numa casa de família.
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Não chegaram a embarcar.
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Um carro em alta velocidade dirigido por um sujeito perdeu-se na estrada e atropelou mãe e filho.
Que desgraça moço, os dois morreram na hora, o motorista estava bêbado e fugiu do local.
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Desesperada esperei por socorro.
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O ônibus que os levaria à cidade chegou.
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O motorista tentou socorrer minha filha e meu neto.
Em vão, estavam mortos.
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A data está lá junto com as iniciais da Mafalda e do Marcelo.
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Lágrimas teimavam em embaçar seus olhos...
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Também eu morri naquele dia, moço!!!
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