O taxista
Alguns minutos passavam da meia-noite, naquele domingo frio, chuvoso. Em Belém há um cemitério de muito tempo, antigo – é o cemitério Santa Izabel.
A cidade estava morta – quer dizer, tudo parado, as pessoas recolhidas em casa.
Um taxista retornava para casa, exausto do trabalho. A chuva havia passado – e ele, o motorista, viu uma mulher, de branco.
Cabelos compridos, pretos. Era jovem. Uns 30 anos.
Estava em pé, na calçada, em frente ao portão principal do cemitério.
Percebeu, então, que aquele ser desconhecido lhe fez sinal. ---- Bem, vou parar, e conduzir essa mulher. Afinal já é tarde, passa de meia-noite. Ela deve estar cansada, assim como eu. Certamente quer chegar a sua casa. Descansar, dormir.
Ele parou.
A mulher abriu a porta traseira do veículo. Entrou, sentou. Fechou a porta. A cidade dormia, tudo era silêncio, algo assim, mórbido, um tanto quanto assustador.
---- Boa noite. Obrigado por ter parado, amigo, essa hora já meio perigoso... A mulher disse ao homem.
---- Nada, amiga, minha função é essa, conduzir as pessoas. Estava indo para casa. Trabalhei um pouco mais hoje. Minha mulher deve estar preocupada...
–---- Por favor – disse a mulher – leve-me para este endereço. O local estava escrito num pequeno pedaço de papel.
O homem leu.
–---- Sim, sei aonde fica o endereço. Vamos lá...
Deu a partida no automóvel, seguindo por aquela noite estranha. Havia chovido muito no fim da tarde. E ficou a friagem da madrugada.
Ficaram em silêncio por um tempo.
----- Qual o seu nome? O motorista perguntou.
----- Maria do Carmo, respondeu a mulher.
----- Meu nome – disse o taxista – é Alfredo. E esticou a conversa, perguntando:
----- Desculpe-me, é que estou curioso com uma coisa: O que você fazia, sozinha, em frente ao cemitério, a esta hora? Não é perigoso?
A mulher ficou em silêncio, não lhe dando resposta.
Isso o assustou, amedrontando o homem. Não mais se falaram.
Chegaram ao endereço indicado pela estranha passageira, vestida de branco, face pálida.
Uma pessoa estranha.
Ela disse ao motorista: –--- Por favor, me aguarde um minutinho. Vou aqui em casa pegar o dinheiro da corrida.
Desceu, foi à casa. Abriu a porta, entrou, fechou a porta.
O tempo passou – e a mulher não voltou mais. Preocupado, o homem resolveu ir à casa.
A escuridão da madrugada, friagem. O homem não se intimidou.
Saiu do carro. Bateu na porta. Nada, ninguém veio atender.
Bateu novamente. Dois toques.
Ouviu, então, passos. Alguém vinha pelo corredor – e lhe abriria a porta.
O silêncio era total.
Uma pessoa abriu a porta, uma senhora. Parecia com a passageira, a mulher que ele trouxera do cemitério.
----- Quem é você, a senhora quis saber.
----- Boa noite, senhora. Sou taxista, trouxe uma jovem, Maria do Carmo é o nome dela. Ela entrou aqui. Disse que viria apanhar o dinheiro da corrida – e não mais retornou...
O homem, então, viu um quadro na parede com a foto da passageira, Maria do Carmo, a mesma que conduzira de frente do cemitério.
----- Olha, é aquela ali, da foto. É ela...
A senhora assustou-se. Ficou trêmula. E respondeu ao motorista: ---- Não, não, meu senhor. Não pode ter ela. Realmente essa jovem, do quadro na parede, chamava-se Maria do Carmo. Era minha filha mais nova. Bem, ela morreu há 5 anos, num acidente de carro.
O taxista, apavorado com a história, mal conseguiu voltar para seu veículo – e regressar para casa, tomado de pavor. Poderia ser diferente, naquela madrugada chuvosa, macabra? Claro que não,
A mulher, mãe de Maria do Carmo, fechou a porta, silenciosamente, com semblante calmo. Rosto pálido.
Apagou a luz. A sala numa estranha penumbra, naquela sinistra madrugada.