Por quê?
— Por que a gente tem que fazer isso?
— Porque senão morremos de fome.
— Tudo bem... mas por que a gente tem que fazer isso para não morrer de fome?
— Porque é o que nos ofereceram para fazer.
— Mas e se a gente fizesse algo diferente? Algo que não seja isso? A gente tem sempre que fazer só o que nos oferecem? Não podemos escolher o que fazer?
— Olha... nós fazemos o que nos oferecem porque eles é que têm o poder de oferecer. Nós só temos o poder de aceitar. É isso que sabemos fazer, é para isso que servimos.
— Para aceitar?
— Sim... para aceitar.
— Mas eu não quero aceitar.
— Eu também não, mas você tem alguma outra ideia?
— Ideia para quê?
— Para não morrermos de fome sem fazer isso aqui.
— Bem... é difícil falar de ideias. Parece que tudo que penso já existe.
— É porque já existe. Se você não conseguisse pensar nem no que já existe... não consigo nem imaginar como isso seria.
— Por que não consegue imaginar?
— Não sei... talvez porque sei como é pensar no que já existe, aí fica difícil saber como seria não saber.
— Hm... faz sentido. Mas e você? Tem alguma ideia para a gente não precisar fazer isso?
— Se tivesse, não estaria aqui, né.
— Verdade. Mas por que estamos aqui mesmo?
— Para não morrermos de fome, lembra?
— Ah é... mas o que exatamente a gente precisa para não morrer de fome?
— Dinheiro, cara... tudo precisa de dinheiro.
— É difícil ganhar dinheiro?
— Quase impossível.
— Mas por que é tão difícil ganhar dinheiro?
— E eu é que vou saber? Eu não tenho nada. Pergunte para quem tem muito.
— Mas quem tem muito vai saber por que é fácil ganhar dinheiro. Eu quero saber por que é difícil.
— Olha... agora você me confundiu.
— Ora... é fácil. Veja só. Se você não tem dinheiro porque acha difícil, então você deve saber por que é difícil.
— Hm... é... até que faz sentido. Mas ainda assim, não sei. Quer parar com essas coisas e concentrar aqui? Precisamos terminar isso logo.
— Tudo bem... tudo bem. Mas só uma última coisa: não tem outras formas de conseguir não morrer de fome?
— Tem... podemos plantar e criar.
— Então por que não fazemos isso?
— Porque não quero o dinheiro só para isso.
— Ah, então isso aqui que a gente está fazendo não é para não morrer de fome.
— Claro que é! Mas é para termos uma vida melhor também.
— Para ter uma vida melhor precisa de dinheiro?
— Precisa.
— Por quê?
— Porque para ter as coisas você tem que dar dinheiro em troca.
— Mas que jeito ruim de ganhar dinheiro para dar em troca das coisas.
— O quê? O que estamos fazendo?
— É... não quero fazer isso que a gente está fazendo.
— Eu também não, mas é o que nos ofereceram.
— Por que não ofereceram outra coisa?
— Porque não somos estudados. Não sabemos fazer outra coisa.
— Por que não aprendemos?
— Porque demora e precisamos comer hoje...
— Polícia! Vocês estão presos!
— Ah que ótimo.... Viu o que fez? Ficou enrolando perguntando o porquê das coisas e agora fomos pegos.
— Olha o lado bom. Agora a gente não vai mais morrer de fome.