Missão

-Corra sua imbecil! – gritaram em minha direção.

Assustada pelo momento, deixei que meus passos entrassem em sincronia com aqueles que passaram por mim. Aos lados o cenário era espalhafatoso, e eu não estava entendendo como tinha ido parar ali. Sons de tiros ecoavam para todos os lados, enquanto surgiam dezenas de policiais em todas as direções. A avenida era enorme, e estava repleta de carros e motos espalhados por toda parte. Algumas pessoas ficavam atrás deles, para se proteger de balas perdidas. Eu tentava parar e processar o que estava acontecendo, mas o extinto de querer salvar a própria vida falava mais alto em mim naquele momento. Blackouts atrás de blackouts aconteciam, e ficava difícil de enxergar uma direção. Parei de correr no meio do caminho, e olhei para trás. Era uma guerra sem sentido, diante dos meus olhos. As crianças berravam no colo de suas mães, enquanto as mesmas tentavam protegê-las. Caía uma garoa fina, e o céu noturno se mostrava tenso com aquelas nuvens cinzas em si. Meus cabelos escorriam pelos meus ombros, encharcados de água. E naquele momento, um devaneio tomou minha mente...

Flash Back

-Nós iremos nos encontrar em breve, tenha fé.

-Espero que seja logo...

-Relaxa, minha cara. Você não estará sozinha, seja lá qual for a situação, eu a protegerei.

-Todos nós temos um caminho para seguir, é uma jornada, não uma separação.

-É isso aí, princesa! Cuide-se!

* * *

-Idiota! Irá morrer se continuar aqui! Fuja!

Vi meus devaneios irem embora, quando ouvi alguém gritar para mim de novo. Era um menino um pouco mais alto que eu, de pele clara. Fiquei perplexa diante de sua beleza...

-Anda rápido, garota! Quer morrer?! – disse me puxando pelo braço e correndo logo em seguida.

Deixei-me ser levada por ele, para o caminho que quisesse seguir. Algo me dizia que eu estaria segura ao seu lado.

-Para onde estamos indo? – perguntei, tentando olhar em seus olhos.

-Para algum lugar longe dessa confusão! – respondeu sem olhar para trás.

-O que tá acontecendo? Como vim parar aqui? E quem é você?

-Você sabe quem eu sou – respondeu.

-Eu sei? – perguntei, enquanto nossos olhos se encontravam.

-Sim, você sabe. E se não sabe, irá saber logo, logo! – disse, voltando sua atenção para frente.

Evitei fazer-lhe novas perguntas, e continuei correndo com minha mão segura na dele. Entramos em um beco, e ficamos agachados atrás de uma enorme lata de lixo.

-Fica tranquila, vai dar tudo certo! – disse, tentando me deixar despreocupada.

-Porque você me salvou? – perguntei, olhando profundamente em seus olhos.

-Era minha missão... – respondeu, respirando ofegante.

Encaramo-nos por alguns longos segundos, em seguida demos um beijo caloroso. Ficamos de pé e nos abraçamos.

Enquanto estava em seus braços, me perguntava o porquê de termos cometido tal ato, sendo que nem nos conhecíamos direito.

-Será que eu caí de um buraco negro? – perguntei sem lhe soltar.

-Não. Eu que caí! – respondeu serenamente.

Fomos surpreendidos por um policial mais alto que nós. Ele estava fardado, usava um óculos escuro e carregava uma arma em seus ombros. Sorriu para nós, um sorriso que demonstrava maldade e disse:

-Ora, ora... Se não é o casalzinho...

Antes que pudesse terminar a fala, o menino que estava ao meu lado o interrompeu.

-Ouse nos ofender, e verá o dia amanhecer em outra dimensão, meu chapa! – disse em um tom intimidador.

O policial gargalhou jogando a cabeça para trás. Em seguida soltou um assobio estridente e, em questão de minutos, vários outros homens de sua espessura apareceram dos dois lados do beco, nos cercando. Nossa coragem sumiu e nós nos olhamos sem saber o que fazer vendo que não tínhamos saída. Eles se preparavam para atirar, enquanto nós nos abraçamos novamente. Quando os policiais começaram a atirar, o garoto caiu por cima de mim e com lágrimas nos olhos, dizia “eu te protejo”.

A chuva se intensificava a cada minuto misturando nossas lágrimas consigo. A poça de sangue que se formava ao nosso redor aumentava meu medo grau por grau.

-Não morra! Não morra! – pedia/gritava, enquanto o abraçava. E ele, mesmo com inúmeras balas atravessando seu corpo, sorria para mim e dizia “vai ficar tudo bem”.

Os policiais cessaram fogo contra nós e correram para outro quarteirão.

-Desgraçados! – os xinguei, enquanto sentia o peso do corpo daquele garoto cair sobre o meu.

Tirei-o de cima de mim rapidamente, e pus sua cabeça sob o meu colo.

-Cara, olha pra mim, por favor! – pedia, enquanto o sacudia.

-Eu disse que te protegeria até a morte, minha cara...

Naquele momento, me recordei de quem ele era. Recordei até de seu nome e de todos os momentos que nós tivemos juntos. Meu choro se tornou mais intenso, enquanto eu beijava sua mão. Meus pedidos de socorro eram inúteis naquele lugar. Minhas calças estavam encharcadas pelo sangue daquele que disse que sempre estaria do meu lado até os seus últimos suspiros. Seus olhos estavam se fechando devagar, mas ele ainda encontrava forças para me fazer um carinho no rosto e dizer “eu cumpri com minha missão, agora, cumpra com a sua, salve os outros por mim e lembre-se que eu te amo, minha princesa”. Em meio a lagrimas, lhe beijei pela última vez e vi seus olhos se fecharem dando um fim à sua jornada. Não queria deixa-lo, mas, naquele momento, algo estava me mandando prosseguir. O som da explosão de um carro ecoou ao longe e as chamas se alastraram por todo o local. O olhei uma última vez, beijei sua testa e disse-lhe “confie em mim”. Pus-me de pé e saí correndo em direção à avenida conturbada, almejando que quando o amanhã chegasse, eu acordaria vendo que tudo que havia acontecido, foi somente um sonho...

-Chris Reis (Crislane Reis)