DIÁRIO À BEIRA-MAR

DIÁRIO À BEIRA-MAR

Um mundo de fantasias. Em que tudo é real na crença de Elisa, estava registrado. Nas folhas daquele diário. Solitário feito ela. Na vastidão das areias. Quentes e grudentas.

O vento se deslocava. E virava. Com a elegância das brisas do mar. Página por página. Mas Elisa estava a quilômetros de distância delas. Quilômetros de água. Densos e salgados.

Quem a lesse se surpreenderia com os parágrafos. Maciços de silêncio. Como se houvesse algo importante por ser dito. Algo que ficava perdido. Em meio à descrição dos fatos.

Histórias de uma vida. Onde a espera de coisas boas fora, repetidas vezes, em vão.

O que ela não podia imaginar. Estava acontecendo. Alguém a estava lendo. Em plena praia. Deserta à beira-mar.

O som das páginas virando. Lembrava a revoada das gaivotas. Tocando de leve a superfície das águas.

Respingos de reticências molhavam os olhos. Do curioso anônimo. Ela também era uma anônima. Ninguém ouvira falar de Elisa. Elisa de quê? De nada. E de todas as dores.

E ele inciou a leitura. Onde as palavras se movimentavam. Como se fossem mexilhões. Buscando abrigo nos buracos da areia.

No amontoado dos trechos. Tal qual conchas quebradas. A interpretação dos fatos. Ficava por conta do leitor. E eram inúmeras!

As páginas estavam surradas pelo tempo. E eram como roupas usadas. E encardidas.

O movimento dos lábios era vigiado. Atentamente. Pelo espanto dos olhos.

Passaram-se vários minutos. Mas a página não havia sido virada.

O vento se fortalecia. E forçava a virada da página.

Não era nada comum. Alguém estar ali. De joelhos na areia. Interceptando a passagem do vento. Com um diário nas mãos.

Uma cena diferente. Nada cotidiana. Nada normal.

Havia um trecho. Importante naquele texto?

O vento se enfurecia. Não havia mais ninguém. Ali. Nos arredores. Apenas a voz. Do vento. Suspendendo a respiração. Parada. Do desconhecido leitor.

Seus cabelos agitados. Desalinhavam a história. Desfilavam interrogações. Espantavam exclamações.

O que a história não deixava revelar?

Ele jamais saberia.

Elisa estava a quilômetros de distância. Naquelas águas. Nem quentes. Nem frias. Mas extensas. E profundas. O suficiente.

Mírian Cerqueira Leite

Mileite
Enviado por Mileite em 16/03/2017
Reeditado em 17/03/2017
Código do texto: T5942511
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