RUIVA PREVENIDA
(microconto)
Tinha um gosto amargo de cigarro na boca, não era cigarro, era charuto. Via vultos em coreografia, não eram fantasmas, não era efeito de erva, eram só vultos.
O anoitecer tinha chegado mais cedo por conta de nuvens anunciando qualquer coisa menos que chuvarada. Os vultos saiam pra rua, com seu leito próximo da janela, e voltavam sem nenhum brilho.
Eis que ela passou – a ruiva de passos firmes que eu queria cortejar – com sua calça justa e olhar furtivo. Ela me olhou pela janela, não sei se me via junto com a fumaça.
Mandei um deles (dos vultos) dizer-lhe que eu a desejava. Ele tentou falar no ouvido e, atrevido, depositou a mão no quadril direito dela, que imediatamente fez um gesto de que empurrava alguém invisível.
- Será que ela viu o vulto aproximar-se?
... Então não sou só eu que vejo vultos!
(o charuto era charuto mesmo)