É muita informação para uma pessoa só
Eu não sei o porquê, mas as situações mais exóticas, ou diferentes que ocorrem comigo, acontecem no ônibus, ou terminais deles. Talvez porque eu seja pobre e dependente deste tipo de transporte; ou ainda, porque goste mesmo deste meio de conhecer novas pessoas e acrescentar emoções ao cotidiano.
Pelo pouco que já falei, dá para perceber que sou uma pessoa que adora "um dedinho de prosa", como diriam alguns, ou goste mesmo de falar "tal qual maritaca", como diriam outros.
Assim sendo, numa dessas viagens rotineiras, uma ocasião fui abordada por um senhor de porte austero, mas muito educado e de uma imagem trivial como qualquer outro trabalhador de meia idade.
Ele primeiro perguntou sobre as horas, depois sobre o itinerário do ônibus que nos levaria àquele bairro meio distante.
Eu diria distante o suficiente para travarmos uma conversa agradável, porém não muito profunda, sobre tudo: O calor e a mudança climática, A vida numa cidade pequena e seus privilégios, O corre-corre diário e a juventude:
- Ah, esta sim tão diferente de outrora, totalmente informatizada. A geração das redes sociais. Uma juventude inteligente, cheia de entusiasmo e vontade de criar um futuro melhor...
E nossa conversa fluía prazerosa, quando de repente ele me surpreende com:
- E aí dona Ana como vai a senhora sua mãe, melhorou? e mais ainda, descreveu alguns planos íntimos que só eu conhecia, com relação ao meu trabalho. Até meu endereço ele sabia, pois perguntou:
- Você ainda não se mudou para aquela casinha simpática, com um jardim aos fundos onde possa pintar seus quadros e receber amigos e a família?
Aí foi demais, comecei a ficar com medo dele ser um agente fiscal, mas em seguida me acalmei, uma vez que minhas posses são parcas; ainda bem que não "porcas".
E continuou a conversa e o tal senhor com um sorriso enigmático no rosto, me irritou o suficiente até eu lhe interpelar:
- O senhor por acaso deve ser gerente de banco, da área de financiamentos, ou é um de meus vizinhos. Uma vez que está tão bem informado a meu respeito.
E ele, sempre sorrindo esclareceu:
- Não, eu sou o Dr. Wagner, o seu oftalmologista e vejo que a senhora precisa de trocar as lentes dos óculos com urgência, pois sua catarata progrediu.
Que vergonha, ele era o oftalmologista do posto de saúde onde minha irmã trabalhou por longos anos e onde eu fui sua paciente por algumas vezes, anos atrás.