IMIGRANTES ITALIANOS
Em 1874, meados do século XIX, chegaram grupos de imigrantes italianos ao Rio Grande do Sul. As primeiras Famílias “Loreto”, vieram de uma pequena comunidade italiana, Loreto, da região dos Marche, província de Ancona, que faz fronteira com Castelfidardo, Porto Recanati (MC), Recanati (MC). A cidade tornou-se célebre por ter um santuário mariano de peregrinação desde o século XIV, o Santuário da Santa Casa de Loreto. Grande parte dos italianos que migrou para o Brasil eram de origem humilde, de regiões rurais da Itália. Acreditavam ser o Brasil uma terra repleta de oportunidades. No Rio Grande do Sul, além da Serra Gaúcha, muitos se fixaram em Cachoeira do Sul.
Os avós de Vittorio radicalizaram-se em Cachoeira do Sul. Alguns anos depois, o casal teve o seu primeiro filho, Raffaele. Esse jovem, embora educado dentro dos costumes rígidos de suas raízes, não se interessava por moças de pele clara e olhos azuis que nem ele. As morenas lhe chamavam mais a atenção.
Seu pai, um próspero plantador de trigo e proprietário de um engenho, adquiriu um caminhãozinho para que o rapaz transportasse o produto a ser comercializado em Santa Maria. Nessas idas e voltas, o rapaz percebeu que, nas proximidades do Rio Jacuí, onde a travessia era feita por balsa, havia uma aldeia indígena. Com frequência, via-se olhando com encanto e admiração as mulheres da aldeia.
Numa manhã, antes de sair em viagem, sua mãe pediu-lhe que comprasse uns cestos de vime e, ele, enfim, teve um bom motivo para se aproximar dos índios. Estacionou o caminhão à beira da estrada e, à medida que se aproximava do grupo, observou que as meninas e as mulheres baixavam os olhos e inclinavam, com suavidade, a cabeça. Considerou o gesto como um dos seus costumes femininos. No momento em que escolhia os produtos, chegou uma jovem belíssima, trazendo um cesto com flores campestres e ervas medicinais. Seus cabelos eram longos e negros como o ébano. Os olhos, um pouco puxadinhos e, também, negros, que apresentavam um brilho fascinante e encantador. O rosto, levemente arredondado, era delicado e atraente. O corpo, com as formas bem definidas, demonstrava extrema sensualidade. Era tudo muito perfeito! Uma deusa! A menina, ao vê-lo, repetiu o gesto das outras mulheres; contudo, nesse havia muita sensibilidade e poesia. Em seguida, afastou-se suavemente. Parecia flutuar! Seus movimentos eram harmônicos e melódicos!
O rapaz sentiu um intenso arrepio passar-lhe pelo corpo e ruborizou. Rápido, pagou as compras e continuou a viagem. Três dias depois, quando retornava à Cachoeira do Sul, precisou aguardar a balsa que estava no outro lado do rio. Durante a espera, passou a andar à sua margem. Nisso, viu a jovem que passara a ocupar seus pensamentos e foi tomado de imensa alegria. Aproximou-se e a cumprimentou. Ela levantou os olhos, sorriu e deu continuidade ao seu trabalho. Ele a observou por longo tempo e desejou que a balsa demorasse muito para alcançar a margem onde se encontrava; sentia-se enfeitiçado. Ao despedir-se, notou que os olhos da indiazinha brilhavam como pedras preciosas. Neles havia mistério, fraternidade e doçura.
A partir desse encontro, durante os dias e as noites, via-se pensando na menina. Um dia, encheu-se de coragem e a pediu em namoro. Tainá informou-lhe que sua família não a queria ver conversando com homens brancos. Esses não respeitavam as mulheres indígenas nem as queriam para esposas. Enquanto falava, suas palavras transpareciam mágoa, tristeza e desencanto. Ao perceber seu sofrimento, desejou abraçá-la, mas não o fez, receando não ser bem interpretado. Por precaução, limitou-se a explicar que estava apaixonado e desejava que ela fosse sua esposa e mãe de seus filhos. Por um instante, acreditou ver naqueles olhinhos negros, cheios de lágrimas, um pequeno brilho. Raffaele tentou expor suas intenções à família de Tainá, porém, não quiseram ouvir-lhe.
Entre viagens e encontros, o sentimento que os unia, foi se fortalecendo e, um dia, sem o conhecimento dos pais, o rapaz levou a jovem para Cachoeira do Sul. Numa cerimônia simples, Raffaele e Tainá casaram-se. Transcorridos alguns meses, tentaram se aproximar dos familiares; mas não foram aceitos. Esse distanciamento, no início, deixou-lhes tristes e lhes causou muito sofrimento; todavia, aos poucos, passaram a aceitá-lo. Cada um procurou assimilar a diversidade do outro com respeito e com dedicação. E, nesse clima de troca, ocorreram grandiosas e fantásticas experiências.
Um ano depois, nasceu o primeiro filho do casal, Matteo. O bebê tinha a pele morena, os olhos azuis e os cabelos negros e lisos. Matteo cresceu forte e robusto e, uma semana antes de completar seus três aninhos, seus pais, Raffaele e Tainá, viajaram a São Pedro do Sul e, ao passarem pela aldeia indígena, acenaram ao grupo. Uma só mão retribui-lhes o gesto. Ficaram alegres e decidiram que, na volta, chegariam. E, assim fizeram!
De início, foram praticamente ignorados, mas, no momento em que o menino começou a correr entre eles e abraçá-los, o gelo foi se rompendo. Sorrisos e olhares fraternos e brilhantes passaram a ser vistos. Muitos abraços e carinhos foram trocados. Antes de partirem, decidiram festejar o aniversário de Matteo na companhia dos avós maternos.
A partir desse dia, o desenvolvimento do menino foi embasado pelos exemplos dos pais e pelos valores passados pelos avós maternos e paternos.