Chegando à Fazenda
Poderiam me dar opiniões sinceras a respeito deste texto? É parte do trabalho que estou finalizando resume bem a dinâmica do texto e a proposta de leitura.
"Uma chuva que parecia o fim do mundo, toró danado. Na Estrada de Santa Lucia poções de agua se formavam nas crateras da última tempestade. O para-brisa do velho 1113 totalmente embaçado com o calor de tanta gente dentro da cabine. Bastião tentando manter aquele caminhão na estreita estrada de barro sem saber para onde estava indo. Seguia pequenos pontos vermelhos das lanternas dos carros que iam a sua frente. Sol inutilmente tentava limpar a umidade do vidro enquanto segurava a pequena Analu que dormia um sono pesado em seus braços. Gustavo e Fernando, seus filhos, se espremiam no pequeno espaço que lhes cabia no banco escorregadio do velho Mercedes. A cadela Tiziu confortavelmente dormia no degrau da porta, os solavancos do caminhão entrando e saindo dos buracos da estrada pareciam ninar a pequena cachorrinha.
Estavam a caminho do que um dia havia sido a grande Recanto do Boi Matador. Antiga fazenda de criação de gado, que há muito tempo só andava produzindo mato e colecionando histórias de violência entre aqueles que acreditavam possuir algum direito em cima daquelas terras. Boa parte dos integrantes da caravana não estava a par dessas histórias. Se soubessem metade do os organizadores da ocupação escondiam sobre o assunto certamente não se enfiariam nessa aventura.
Já estavam há mais de uma hora andando naquela estrada, a chuva não cessava momento algum. Bastião completamente aflito, se perguntando o porquê de ter estar ali carregando toda sua família junto para aquele lugar, gritava consigo mesmo:
- Que que eu tô fazendo aqui? Por que que eu trouxe família para esse buraco?
O caminhão não era seu, A 1113 azul era o xodó de seu pai. Pegou emprestado dizendo que iria fazer um frete de lenha, entregar nas padarias e que o devolveria no dia seguinte, juntamente com parte de pagamento. Mentiu. Precisava do caminhão porque era a única forma de carregar aquele monte de tralha necessária para a ocupação. Na carroceria: Enormes trouxas de roupa, colchonetes esteiras e pedaços de tapete, sacolas e caixas de papelão cheias de panelas, latas, vasilhas e todo tipo de utensílio e coisas de todos que não tinham como carregar por si só. Lonas, estacas, madeirites velhos e folhas de zinco . Entre bolsas, sacolas e trouxas havia gente: muitas crianças, homens e mulheres, velhos. Famílias inteiras. Gente de todo tipo de todo lugar. Todo aquele que não tinha meio próprio de chegar, viu no Bastião e no seu caminhão velho a chance de ingressar nessa aventura revolucionária.
Muito medo do velho caminhão quebrar, sair da estrada e bater na cerca ou de ficar atolado naquele lameiro no meio do mato.
A estrada de Santa Lucia parecia um caminho sem fim. Bastião já havia passado por ali diversas vezes à serviço, mas sempre em dia de Sol quente. Às vezes dirigindo o caminhão velho de seu pai, noutras levando trator de patrão para arar sítio, por muitas vezes era ele no balaio, em cima de uma carroceria indo trabalhar de boia fria fazendo cerca, colhendo laranja, cortando cana. Há noite tudo naquele lugar era completamente diferente. Só reconhecia os contornos da serra quando descia o flash das descargas elétricas dos relâmpagos que caiam no vale.
Sua mulher tentava manter a calma estando ela mesma apavorada com tudo aquilo:
- Calma homem! Não adianta ficar nervoso desse jeito.
- Que nervoso o que Sol? Só que o que eu tô fazendo aqui é burrice!
- Burrice o quê? A gente vai ter um pedacinho de terra. Paciência...
- Vai dar não mulher, vai dar não...
A essa altura a estrada nada mais era do que duas marcações dos pneus no meio do mato. Por fim a caravana parou. Bastião desligou o motor do caminhão. Todos os faróis se apagaram. Não podiam chamar a atenção. Silencio. O único som que se ouvia eram as gotas de chuva batendo no teto de lata. As crianças dormiam alheias à qualquer preocupação. Na carroceria mais de vinte pessoas, elas também não emitiam som que pudesse ser ouvido da cabine. Um vulto usando uma capa de chuva amarela veio se aproximando e bateu na janela fechada:
- Sebastião, a hora é essa. Chegamos."