QUANDO NÃO PODEMOS EVITAR AS QUEDAS

LEVANTAMOS MAIS FORTES

Na brilhante manhã de 06 de Agosto de 2023 onde  muitos deixaram suas casas para mergulhar na vida, eu me vi imerso em uma cena que parecia retirada de um filme cheio de liberdade e aventura. Era um domingo memorável, onde as estradas se entrelaçavam com os sonhos dos motociclistas.

Foi na Mexicana Custom em Morro Roiter/RS um refúgio para almas intrépidas e apaixonadas por motocicletas, que a jornada começou. Conversando com meus amigos de duas rodas, senti a euforia da liberdade correndo nas veias. Motociclistas, como irmãos de uma fraternidade secreta, compartilhávamos histórias, risadas e o amor inegável pelo rugido do motor.

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O sol estava no auge de sua majestade, pintando o mundo com tons vivos de ouro e âmbar. As estradas pareciam sussurrar segredos e desafios, e eu decidi me aventurar. Na volta para casa, meu coração ousou desafiar a prudência.  Foi nesse momento que a estrada se tornou meu campo de batalha, e eu, um guerreiro desafiando o tempo.

O asfalto se desdobrava à minha frente, e minha moto, uma extensão de mim mesmo, respondia com gratidão ao meu comando. No entanto, em um instante de distração, a pista e o acostamento dançaram em uma ilusão de paralelismo, e eu escolhi meu caminho com destemor, ignorando os ensinamentos de seis décadas de experiência. Quando eu estava rodando pela estreita pista do acostamento, o pneu dianteiro encontrou a faixa que estava mais alta  e como um beijo inesperado, e o mundo girou em câmera lenta enquanto minha montaria tombava com um suspiro triste.

Enquanto o chão tocava minha pele e minha moto gemia em agonia, questionei se os anos acumulados eram cúmplices desse incidente. Poderiam meus 80 anos ter acelerado essa dança com o asfalto, ou era apenas o destino brincando comigo? Passei por doze quedas de motos antes, mas essa tinha um sabor diferente, uma introspecção que só o tempo poderia fornecer.

Os amigos motociclistas, meus irmãos da estrada, não hesitaram. Eles se reuniram em torno de mim como um escudo protetor, ergueram a moto e, com ela, uma parte do meu espírito que teimosamente recusou-se a ser dobrada. Ergui-me, agradeci com olhos úmidos pela camaradagem silenciosa e montei minha fiel companheira uma vez mais.

O sangue pintava minha pele com marcas de coragem e resiliência, mas minha determinação não conhecia limites. Com vinte quilômetros restantes para minha casa, a adrenalina pulsava em minhas veias, abafando a dor que tentava se insinuar. Era uma dança perigosa entre a força do espírito e a fragilidade do corpo, onde o desejo de continuar vencia a tentação de desistir.

Cheguei a casa, onde minha esposa, técnica em  enfermagem e psicóloga, um bálsamo para minhas feridas físicas e emocionais. Os próximos dias foram uma luta silenciosa, uma dança íntima com a dor que teimava em permanecer. Minha alma ansiava pelo vento nas estradas abertas, mas meu corpo pedia descanso.

As dores eventualmente aos dez dias começaram a ceder.  A idade é apenas um número, uma marca que se mistura com a história que escrevemos com nossas vidas. Enquanto a estrada do tempo continua a se desdobrar, lembro-me de que um verdadeiro guerreiro não é aquele que evita a queda, mas aquele que se ergue, mesmo quando o peso da idade e da experiência tenta mantê-lo no chão.

E assim, o rugido das motos ainda ecoa em minha mente, uma sinfonia de liberdade e coragem. Os dias de estrada podem ser mais cautelosos agora, mas o espírito indomável queimará enquanto houver um sopro de vida. Pois, como todos os guerreiros que vieram antes de mim, eu continuarei a escrever minha história, quilômetro após quilômetro, com a tinta da paixão e a tinta do asfalto.

 A moto é perigosa?  Mas os perigos andam também.< ao caminhar, andando de avião, skate, bicicleta, alpinistas etc., mas o mais perigoso e não viver.

Neri Satter – Agosto de 2023    CONTOS DO SCARAMOUCHE

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Scaramouche
Enviado por Scaramouche em 14/08/2023
Reeditado em 15/08/2023
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