Lágrimas de diamante

Um pouco antes de o Brasil ser descoberto, em 1496, havia uma tribo indígena conhecida como Aimorés - presentes na região do litoral brasileiro. Terena era uma jovem índia recém casada com Wajurú, um grande guerreiro que confeccionava utensílios afiados de caça e pesca, além de ser um dos principais defensores da tribo caso estivessem em guerra.

Havia também uma tribo do interior brasileiro que crescia: Kaingang, se tornando um dos principais inimigos dos Aimorés na medida em que iam conquistando território e se aproximavam de suas terras. Wajurú e sua tribo realizavam mais rituais como nunca para se manterem fortes e obterem a bênção dos Deuses, para não serem derrotados em nenhuma batalha. Terena e as outras mulheres temiam supostas ameaças que comprometesse o crescimento da tribo, tirando sua paz. Um pequeno grupo de guerreiros planejava matar algum indígena inimigo para realizarem mais um ritual: comer o coração de um Kaingang.

Ainda era noite, o grupo de cinco guerreiros caminhava em forma apressada e atenta, munidos de objetos cortantes e arcos para machucarem o suposto alvo. Resolveram seguir para o trecho mais perigoso da floresta justamente para não serem facilmente vistos. Na medida em que se aproximavam da tribo inimiga, tiveram como idéia subir primeiro em grandes árvores e observar de longe sua movimentação. Aparentemente era o início da madrugada: horário que grande parte estaria dormindo e estava tudo tranqüilo naquele trecho. Resolveram entrar numa cabana da ponta por terem menores chances de serem percebidos, matariam o inimigo e traziam seu corpo para a tribo, a fim de realizarem o ritual.

A única luminosidade ali presente eram algumas tochas de fogo que estavam espalhadas, supostamente um grupo deveria estar acordado como vigia. O mistério da noite contribuía para que o temido plano entrasse em ação: espiavam o interior da cabana na parte de trás que dava pra floresta e um indígena estaria ali em sono profundo: o cacique da tribo. Rapidamente, Wajurú pegou uma lança enfiando em seu estômago enquanto o seu amigo pegava um tecido colocando em sua boca. O quase assassinato ocorrera de forma silenciosa e repentina, onde as únicas pistas concretas eram as grandes manchas de sangue que ficaram no local. Pegavam o corpo ainda vivo pelos braços e o carregavam rapidamente em rumo à floresta, chegando posteriormente na tribo dos Aimorés. O cacique inimigo dizia que as conseqüências seriam enormes e sua tribo iria se vingar com a destruição do povo.

Todos pintavam os rostos e corpos com tintas vermelhas, o corpo moribundo do povo inimigo aguardava a realização do ritual que consistia extrair parte do seu sangue em um pote e arrancar o seu coração, que seria primeiramente digerido pelos homens mais fortes da tribo. O pajé local com uma faca afiada abria seu tórax até extrair o coração, enquanto todos gritavam como se estivessem numa guerra. Ele deu a primeira mordida, enquanto uma pequena fila com os guerreiros mais importantes se formava, até que o coração fosse completamente digerido. Seu sangue foi repartido para todos, que bebiam um pequeno gole, até que seus demais órgãos também foram consumidos, tacando foco no corpo do inimigo por fim.

Ninguém esperava que o anoitecer desse dia fosse um dos mais violentos que seu povo iria presenciar. A tranqüilidade do por do sol foi quebrada por barulho de passos que traziam estacas de fogo com objetivo de destruir e acabar com todos: eles sabiam quem era culpado pelo assassinato do cacique Kaingang. Através de lutas e violência, Wajurú foi atingido por uma lança profunda nos seus pulmões, onde, ao leito de sua morte, acabou confessando tudo o que aconteceu com o Cacique inimigo. A sua mulher implorava desesperadamente aos deuses para que ele sobrevivesse, junto com outras mulheres e crianças que estavam escondidas na floresta, até que uma guardiã a recomendou que realizasse o mais belo ritual do amor de sacrifício, para ajudar o seu amado, que consistia em doar parte da sua vida e energia, que seriam direcionadas para aquele ser querido, que lutava pelo seu povo.

Ainda sob a luz do luar, Terena se aproximava do litoral, até chegar ao mar. Colhia algumas folhas e conchas e invocava um dos deuses para que ajudassem Wajurú e seu povo. Ofereceu a sua vida pela a dele, em troca da vida do seu amado, junto com paz e fortuna para seu povo. Suas lágrimas caiam do seu rosto, se transformando em pequenas pedras quando tocavam a areia. Ainda sob triste emoção, estranhava a cena e pegava uma das pedras pequenas e observava pela sua mão: era brilhante e transparente. Notou que o ritual havia dado certo.

Chamou sua guardiã, que ficara impressionada com o que via. Os deuses acolheram o pedido de Terena, que colhia as misteriosas pedras. Quando o dia amanheceu, a guardiã aconselhou Terena que esperasse por ela ainda nesse local por motivos de segurança, temia que o choque e imagem das mortes a deixasse mais aflita e triste. Foi sozinha até a tribo, onde encontrou Wajurú ferido e morrendo:

-Eu fiz o que pude. Peço que realizem meu ritual de purificação antes da minha morte. Conforte Terena.

A guardiã pegava algumas ervas para salvar o guerreiro machucado, o alimentou e cuidou dele nas primeiras horas do dia. Felizmente não morreu ali, naquela situação. O povo retornava para a tribo, aparentemente destruída e com corpos moribundos ainda espalhados, que depois foram retirados com tristeza.

Terena comemorou que seu amado ainda vivia, e falou do ritual que fizera. Seria ela uma grande abençoada dos Deuses, que chorava lágrimas de diamantes. Acreditavam que seu corpo era habitado por um sagrado ser e logo passou a ser vista como uma Deusa, onde fora adorada e glorificada até a sua morte. Muitos acreditam que as pedras preciosas daquela região surgiram graças à Terena.

Amanda Passos
Enviado por Amanda Passos em 28/05/2023
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