Antes da travessia

Era manhã quando Radomirs Jansons chegou a Mazaósta, uma pequena cidade portuária no Istmo de Zeltinsh. Procurou uma hospedaria onde pudesse deixar o cavalo com o qual viera de Augstienes, e deixou claro que sua intenção era vender o animal.

- Por uma pequena quantia, podemos cuidar dele, enquanto resolve os seus negócios do outro lado da baía - sondou-o o palafreneiro do estabelecimento.

- Pretendo atravessar a baía, mas não sei se volto por aqui - declarou Radomirs, o que era verdadeiro. Ele agora tinha um trabalho a realizar, e estava sendo bem pago por isso; mas se surgisse uma oferta melhor, por que não aceitar? Sua contratante, a bruxa Dzelme Gibala, lhe advertira sobre as consequências de uma eventual traição e ele estava perfeitamente ciente de que ela seria capaz de cumprir suas ameaças... exceto se ele encontrasse alguém que o pusesse a salvo do poder dela, o que lhe daria algum poder para barganhar um preço melhor pelo objeto da sua viagem.

- É um bom animal, mas se pretende contar com esse dinheiro, terá que esperar alguns dias - prosseguiu o palafreneiro. - Naturalmente, cobraremos uma comissão pela venda.

- Que seja - redarguiu Radomirs com ar displicente. - Não estou com muita pressa e ainda vou comprar a passagem para atravessar a baía.

Na verdade, a bruxa lhe dissera para agir o mais rápido possível, mas ele não queria compartilhar esta informação com gente que não conhecia.

- Temos hospedados muitos marinheiros dos barcos que fazem a travessia - disse o palafreneiro. - Se quiser, posso apresentá-lo a alguns que aceitam passageiros. Você é da Guilda dos Recuperadores?

Radomirs se vestia como um membro da guilda pois isso lhe dava uma certa aparência de autoridade, mas na verdade, era um ladrão. Não um ladrão qualquer, como costumava comentar com seus associados; um ladrão de itens raros e caros.

- Sou da guilda de Zemesrags - mentiu. - E sim, tenho interesse na travessia; quanto tempo os barcos levam até Lîdzenums?

- Dezesseis, dezoito horas; depende do número de paradas e da direção do vento - avaliou o palafreneiro.

- Você parece conhecer bastante desse trabalho - observou Radomirs.

- A gente acaba aprendendo, de tanto ouvir as histórias dos marinheiros - admitiu o homem. - Mas vou colocar o seu cavalo na estrebaria e já volto a falar consigo.

Havia uma quantidade razoável de frequentadores tomando o desjejum no salão da hospedaria, a maioria deles marinheiros, pelas roupas que vestiam. Lançaram olhares curiosos para o estranho que acabara de entrar, mas depois voltaram às suas refeições e conversas. Radomirs sentou-se a um canto e pediu uma caneca de cevada, pão preto, queijo e linguiça à uma das atendentes. Estava comendo quando um homem de cabelos brancos longos aproximou-se de sua mesa.

- Ignátijs me disse que estava indo para Lîdzenums - declarou o homem.

- Quem é Ignátijs? - Questionou Radomirs desconfiado.

- O palafreneiro - replicou o homem. - Eu sou Erlends Gribusts, capitão do "Makrele".

Radomirs fez um gesto para que Erlends tomasse assento à mesa.

- Quando parte? Tenho que vender meu cavalo antes da viagem - explicou.

- Em dois dias. Aguardo uma carga de vinho para Tálbergs; creio que terá tempo de resolver seus negócios aqui em Mazaósta.

- É provável - admitiu Radomirs. - Quanto cobra pelo traslado?

- Dois dinares.

- É razoável - avaliou Radomirs. - Está hospedado aqui?

- De fato, moro na cidade, mas costumo tomar o desjejum na hospedaria antes das travessias - disse Erlends.

- Então nos veremos até o dia da partida - prometeu Radomirs.

E continuou a fazer sua refeição após a partida do marujo.

- [Continua]

- [08-05-2022]