O Mar de Júrmala
A única coisa que Sedriks Matisons gostara, ao chegar à sonolenta cidadezinha de Júrmala, havia sido a praia. Com a transferência da mãe, a bibliotecária Marlena, para a povoação litorânea, justamente no início das férias de verão, não lhe restara muita opção que não acompanhá-la durante os primeiros dias de trabalho.
- Eu sei que você não queria ficar cercado de livros empoeirados, mas me dê um tempo para colocar as coisas em ordem - pedira a mãe. - Isso é temporário, depois você vai poder pegar a sua bicicleta e conhecer a cidade.
- Aqui não tem nada para eu ver, mãe - reclamara o garoto, de má vontade.
- Na cidade, talvez não - admitira a mãe. - Mas que tal me ajudar a arrumar as prateleiras?
Fora prometida uma auxiliar à Marlena, mas ela sabia que esses processos dentro da burocracia governamental demoravam, ainda mais num recanto isolado como aquele, na península de Landmane. Desconsolado, Sedriks resolveu fazer o que a mãe pedira.
- Faz muito tempo que não compram livros novos - comentou de forma retórica.
- Acho que sim - reconheceu Marlena. - Mas agora que estou aqui, vou dar um jeito isso.
Sedriks não pareceu muito animado com a possibilidade, mas calou-se, enquanto colocava os volumes nos locais indicados pela mãe. Em dado momento, deparou-se com um alfarrábio maior que os demais, encadernado em linho grosso. Abriu-o ao acaso e viu que continha ilustrações curiosas, de página inteira.
- Posso dar uma olhada nesse? - Indagou à mãe.
Marlena ajeitou os óculos no nariz e relanceou a capa do livro.
- "O Mar de Júrmala" - disse em voz alta. - Claro, sente ali no canto e boa leitura.
Embora houvesse um mapa com a localização das praias locais, não fora isso que chamara a atenção do garoto, mas as tais figuras que mostravam criaturas míticas, desenhadas a bico de pena. Supostamente, elas teriam sido avistadas pelo autor do livro, Normunds Bergmanis.
Subitamente, Júrmala parecia ser um local bem mais interessante do que parecera a princípio para Sedriks.
- Mãe, posso levar esse livro para ler em casa? - Indagou.
- Antes, precisamos fazer um cartão de biblioteca para você - ponderou a mãe. - Vai ser o primeiro leitor oficial desde que fecharam a biblioteca...
Havia uma velha máquina de escrever atrás do balcão, e Marlena conseguiu datilografar um cartão para o filho, apesar da fita estar meio ressecada pela falta de uso.
- Prontinho! - Exclamou triunfante, ao exibir o documento. - Assine aqui e me dê o livro para eu registrar a saída...
Formalidades concluídas, o livro separado sobre o balcão para ser levado para casa, Sedriks virou-se para a mãe e perguntou:
- Será que esse Bergmanis ainda está vivo?
Marlena abriu o volume no prefácio e fez um gesto negativo de cabeça.
- A data no prefácio é de mais de 100 anos atrás. Se ele morou aqui, deve estar no cemitério.
- Que pena; acho que seria alguém que eu gostaria de conhecer - lamentou Sedriks.
- Mas você ainda pode conhecê-lo, - replicou Marlena - basta ler o que ele escreveu; os livros são a nossa única chance de conversarmos com pessoas que já não estão mais entre nós.
Sedriks teve que se conformar com essa perspectiva.
- [Continua]
- [20-03-2022]