No salão dos copistas

Bevan Gethin ergueu-se de sua bancada no salão dos copistas da Universidade Real de Agaterra, quando o conde Delwyn, acompanhado de dois guardas, adentrou o recinto. Os guardas posicionaram-se um de cada lado da porta, mãos nos cabos das espadas. Gethin curvou-se perante o nobre.

- Conde Delwyn, a que devo a honra?

- Sente-se, Bevan, precisamos conversar - disse Delwyn, fazendo um gesto para que os guardas saíssem do aposento.

Quando viram-se a sós, Delwyn espalmou as mãos sobre a mesa e inquiriu:

- A lenda sobre a Adormecida de Iafane é mesmo verdadeira?

Gethin encarou o visitante com surpresa.

- Desculpe, mas... quem lhe falou sobre isso, excelência?

- Gwern Trevor - replicou o conde.

Gethin pareceu desconcertado.

- Pois Trevor foi justamente um dos que sempre ridicularizaram a existência da Adormecida de Iafane... no entender dele, trata-se de um conto de fadas.

Delwyn ergueu os sobrolhos.

- Mas você acredita que haja um fundo de verdade na lenda?

Gethin encarou o visitante e virou para cima as palmas das mãos.

- Há muita coisa em nosso mundo que não podemos explicar com nosso conhecimento atual... magia, é quase sempre a explicação mais comum. Mas há outros povos que demonstram ter acesso à uma ciência cujo conteúdo foi quase que totalmente perdido pelos demais; os alzahir de Yasurmaida, por exemplo.

- E, nesse contexto, a Adormecida pode ter alguma procedência?

Gethin fez um gesto de concordância e apanhou um rolo de pergaminho sob a bancada. Desenrolou-o diante do conde.

- Este pergaminho é uma cópia; o original deve ter mais de dois mil anos de idade... e faz referência a documentos ainda mais antigos, que remontariam à Criação do Mundo. Nele, fala-se sobre a Adormecida de Iafane, que dorme sob as ruínas de Jomariel sob a proteção de um Monstro.

- Em que idioma está escrito isso? - Questionou o conde, testa franzida. - Até os caracteres me são desconhecidos!

- É taal arcaico, - informou o pesquisador - escrito num alfabeto antigo denominado naudiz. A parte final do documento está faltando, mas neste trecho, fala-se que a Adormecida possui o conhecimento do Criador do Mundo, e que ela seria capaz de o conceder a quem a despertasse.

- O pergaminho diz como isso poderia ser feito? - Inquiriu Delwyn.

- Lamento, mas como disse, a continuação do documento foi perdida; há, todavia, a possibilidade de que pesquisas de campo em Iafane possam contribuir para a solução do mistério. Mas, ninguém quer custear uma expedição para fazer isso, pois gente como Gwern Trevor insiste em que se trata de um conto de fadas sobre princesas adormecidas.

O conde encarou o pesquisador em silêncio por alguns instantes. Finalmente, juntou as palmas das mãos sobre a mesa e indagou:

- E se você tivesse patrocínio para ir à Iafane, comprovar a sua teoria?

- Arqueologia não é uma ciência exata, excelência - esquivou-se o pesquisador. - Não posso lhe garantir que vá ter sucesso; pode acabar sendo uma busca infrutífera.

- Acho que vou pagar para ver - afirmou Delwyn confiantemente. - Já andei pesquisando, e descobri que o melhor guia para Iafane é um homem de Berwyg, Barfoot.

- Rafe Barfoot? - Gethin ergueu os sobrolhos. - Deve ter se aposentado há muitos anos.

Delwyn abriu um sorriso sardônico.

- Creio que posso persuadi-lo a voltar à ativa.

[Fim da 1a. parte]

- [18-07-2021]