A morte do xamã

Sarah e Geberaty foram deixados a sós na tenda, para que pudessem conversar em particular. Lá fora, a chuva caía sobre a terra ressequida do Tamug.

- Fico feliz que tenha vindo em meu socorro - foi a primeira coisa que o xamã disse para a guardiã.

- Embora eu não tenha vindo exatamente em seu socorro - declinou Sarah. - Em princípio, estou aqui para saber como morreu.

- Nenhum mistério - replicou Geberaty. - Estava comendo osuri em minha tenda de trabalho, em Vorkovo, e fiquei engasgado. Apenas um acidente estúpido, como pode imaginar.

- Pois seu aprendiz, Ruslan, foi acusado de ter lhe dado veneno - informou Sarah. - Na verdade, neste exato momento, ele está na masmorra do khatun; e poderá ser executado amanhã, caso eu não consiga provar que você morreu de causas naturais.

- Pobre rapaz! - Lamentou o xamã. - Mas, como espera fazer isso?

- O khatun deve estar ansioso por perdoar Ruslan - avaliou Sarah. - Você era conhecido por contrabandear sementes de arfe para o plano material, e a principal dúvida é onde estaria localizado o seu esconderijo secreto; se me der essa informação, provavelmente seria suficiente para convencer Enebish.

O xamã abriu as mãos, desculpando-se.

- Lamento, mas não há nenhum esconderijo secreto, embora imagino porque mesmo Ruslan acreditava nisso. As poucas sementes que trouxe de Kurys, moí para fazer uma poção de água da vida.

Sarah ergueu os sobrolhos.

- Mas o que se comenta é que você deu sementes de arfe para os calmucks... por isso ficaram tão furiosos com sua morte.

Geberaty sorriu.

- Grão-de-bico tingido de vermelho, apenas isso.

Sarah levou a mão à testa, e abanou a cabeça.

- Você enganou todo mundo!

E erguendo novamente a cabeça:

- Mas, afinal, para quem deu essa poção de água da vida? Não foi para você mesmo, suponho.

Geberaty balançou negativamente a cabeça.

- Ruslan tem uma irmã caçula, Dzerassa. Ela estava muito mal, e a única coisa capaz de salvá-la seria esta poção; me arrisquei indo a Kurys roubar sementes, mesmo sabendo que iria incorrer na ira dos mortos.

- Tanto que eles o expulsaram para o Tamug - ponderou Sarah. - Mas isso me cria um problema, que terei que resolver.

- E, já que está aqui, não quer me ajudar a resolver o meu problema? - Indagou ansioso o xamã. - Não quero ficar no Tamug.

Sarah lançou-lhe um olhar pensativo.

- Bom, tecnicamente você veio parar aqui mesmo tendo feito uma boa ação... creio que só há uma maneira de reverter isso, e você sabe qual é.

Geberaty fez um aceno afirmativo.

- Estou pronto para voltar à terra.

- Vamos providenciar isso - prometeu Sarah. - Prevejo que em não muito tempo, Dzerassa irá engravidar e dará à luz um filho...

Tocou com o indicador no centro da testa de Geberaty, e concluiu:

- A criança nascerá com uma marca de nascença na testa... vermelha, como uma semente de arfe.

[Continua]

- [11-05-2021]