Minha passagem por Osório, a Lagoa do Horácio
A Lagoa do Horário
A lagoa do Horácio é uma pequena lagoa distante cerca de 5 km da cidade de Osório pela RS 030 e entrando à esquerda indo em direção à Tramandaí, pega-se uma estrada de chão batido, mais uns 3 km, chega-se até a entrada deste Camping Municipal. Esta lagoa entrou na história de minha vida lá pelo ano de 1972, quando passava as férias de verão na cada da vó Dina. Certo sábado pela manhã, o tio Zenon chegou com um VW TL-1600 novinho. Tinha comprado na última semana. Ele era taxista na cidade, herança de nosso avô que colocou os primeiros carros de praça (como eram chamados os Táxis nesta época) no centro da Cidade e Tio Zenon ao se casar com a tia Nena, seguiu o pensamento do velho avô "Chico Ferreiro". A tina Nena, esposa dele, organizou rapidamente com alguns amigos, conhecerem um novo local de banho em uma lagoa que um conhecido fazendeiro lhes indicará. Me convidaram a ir junto e sem perder tempo, sai correndo até a avó Dina e pedi permissão. Tudo certo, encheram o bagageiro do carro de alimentos para passar o dia. Foram no TL, a tia Nenê, o tio Zenon, as duas filhas, Luziele, Luciene e eu. Em outro carro, foram um amigo da tia, com a esposa e dois filhos e um terceiro carro com um casal e 2 filhos. O acesso neste ano de 1973 era bastante difícil, a estrada era de chão batido com muita areia nas bordas e os carros dançavam para todo lado e o tio como era acostumado com este tipo de pavimento, metia o pé no fundo do acelerador e todos dentro do carro se agarravam onde dava. A Tia xingava o tio, as meninas gritavam e eu no meio com os olhos arregalados. Foi preciso abrir umas duas porteiras neste trajeto para acessar o local, pois as estradas eram construídas no meio das fazendas que rodeavam a lagoa. Chegando no local, ficamos espantados com a sua beleza. Era completamente cheio de árvores nativas, tais como, aroeiras, pitangueiras, pés de araçá, angico, araticum, corticeiras, figueiras enormes que cobriam uma grande área e podíamos acampar embaixo, fugindo do sol. Montamos o acampamento na sombra de uma grande figueira para passarmos o dia. O tio Zenon montou uma pequena barraca de camping, trocamos as roupas e saímos correndo para desfrutar das aguas límpidas.
Foi a primeira de muitas visitas que realizamos a partir desta data à esta lagoa, que futuramente, lá por 1976, foi encampada pelo município de Osório e se tornou um camping municipal, sendo construído banheiros coletivos, área de lazer com jogos, um pequeno economato, disponibilização de luz elétrica e outras benfeitorias, o que tornou o local conhecido e bastante frequentado. Mais tarde, quando nos mudamos de Canoas para Osório, meu pai montava uma barraca de camping no início do verão e desmontava somente no final do mês de fevereiro e basicamente nestes meses, residíamos neste local durante todo o período de férias escolares. Tenho muitas recordações deste local, pois neste período de férias, chegava a abrigar cerca de 50 a 80 barracas de camping e todos acabavam por fazer grandes amizades. O local também dispunha de um campo de futebol, tamanho futebol 7, e nos finais de tarde, a gurizada, homens adultos, velhos, meninas, se reuniam e montavam pequenos times de futebol para disputarem um torneio que era rapidamente organizado. As disputas não valiam nada, mas a peleia dentro do campo era acirrada. Aqui no Sul, como temos dois times grandes em Porto Alegre, Grêmio e Internacional, existe uma polarização entre estas duas torcidas bastante rivais. Este aspecto se reflete em quase tudo no estado, desde jogos de carta, disputas políticas e principalmente de futebol, tudo é polarizado. Outra grande opção que a lagoa nos oferecia na época, era que tinha muitos peixes nas áreas que não eram de banho. Traíras, cascudos, Carás testudos, muçuns, jundiás, tartarugas e até pequenos jacarés do papo amarelo. Meu pai era um viciado em pescaria, e diariamente nos levava a pescar com ele no meio dos juncos localizados cerca de 800 metros do ponto de acampamento. Entravamos na lagoa com água na cintura, munidos de pequenos potes de metal recheados de minhocas, um pequeno caniço de taquara do reino com anzol e chumbadas nas pontas, os carás fazem suas tocas na areia e a chumbada deixa o anzol bem perto deles, algumas fieiras para colocarmos os peixes. Ficávamos horas pescando e geralmente as fieiras vinham repletas de carás. O velho trazia sempre uma tesoura e eu e meus irmãos tínhamos que limpar os peixes ali mesmo na beira da Lagoa e a noite, nossa mãe os fritava em uma grande frigideira em um pequeno fogão a gás que nosso Pai montava na área frontal da barraca. Como o velho pai pescava muito, acabava salgando os peixes excedentes e defumando em um pequeno defumador que montará perto do local de pescaria. Era tanto peixe que ele os moía com uma máquina de moer manual, e após estarem secos pelo processo da salga e defumação, fazia uma farinha de peixe que posteriormente era juntada a farinha de mandioca ou de trigo para fazer bolinhos, semelhante a bolinhos de bacalhau. O gosto era bastante similar. Certa vez, estávamos acampados no pé de uma grande figueira e despencou um temporal. Achávamos estar protegidos dentro da barraca de lona e de repente um raio atingiu a figueira bem no meio do caule, provocando um estrondo tão forte que fiquei dias com um chiado constante nos ouvidos. Tudo era uma experiência diferente nesta época e como Guri, tive o prazer de poder vivê-las nesta época maravilhosa de minha vida.
Esta lagoa sempre me traz boas lembranças, pois foi lá tive grandes amigos, grandes aventuras, pequenos namoros. Poderia contar inúmeras situações e muitas aventuras que realizamos ao longo dos anos que frequentamos o local, mas levaria dias e muitas páginas para contar tudo. Lá tive o prazer de desfrutar a companhia de meu pai, pescar e caçar com ele, com meus irmãos, minhas primas, amigos e conhecer o que a natureza pode nos oferecer se estivermos em harmonia com ela. Depois da adolescência, retornei somente uma vez na lagoa do Horácio quando meu pai comprou um pequeno sitio perto do local e o visitando certa vez, levei minha filha para tomar um banho no local. A agua já não era a mesma devido a poluição que é despejada na lagoa e porque o nível da agua baixou muito em cerca de 20 anos. Após a morte de nossa mãe no ano de 2009, meu pai ficou tão desiludido que vendeu o sitio e nunca mais retornou ao local. Se existe uma definição para a palavra saudade em nosso idioma português, posso com certeza dizer que à sinto muito no meu peito, quando recordo minha passagem pela cidade de Osório com minha família.