AS BRAVURAS DO CAVALO XEXÉU
Ainda mastigando o milho na cocheira, xexéu levantou a cabeça olhando na direção da porteira e viu passar à sua frente uma boiada levantando poeira na estrada de terra. Atrás do gado vinham em seus cavalos possantes, os vaqueiros com seus aboios dolentes, acalmando os animais.
Os anos haviam passado e deixado uma história de muito trabalho, serventias e glórias para xexéu. Era um animal invejável, conhecido na região como o mais veloz e marchador, quando entrava na mata atrás de um bovino, sempre voltava tocando o animal, até o curral. Xexéu levantou a cabeça num gesto orgulhoso de si mesmo, lembrando do touro malhado, um animal grande e forte, temido por cavalos e vaqueiros que muitas vezes adentraram na mata atrás do touro e voltavam sozinhos e machucados.
A fama do cavalo xexéu chegou até o dono da fazenda proprietário touro malhado. o fazendeiro viu naquele cavalo sua última tentativa para trazer de volta o touro às terras da fazenda.
Seria uma batalha entre o touro mais bravo e veloz e o cavalo mais ágil e destemido. Uma disputa entre dois animais determinados, e um só, sairia vencedor.
Antes de entrarem na mata, Xexéu montado pelo melhor vaqueiro, puseram-se a olhar aquela vegetação agreste e inóspita de mata densa e rasteira de matos espinhosos: jurema, mandacaru e macambira. Apenas um riacho com pouca água corrente passava atravessando aquela paisagem rústica. O touro conhecia cada pedacinho daquele chão e parecia ter certeza que ali naquelas terras, nenhum cavalo e vaqueiro seriam capazes de domá-lo.
Resolveram entrar na mata passando próximo ao morro a procura de rastros recentes do touro. Seguiram as margens do riacho, seria possível que o animal tivesse descido até ali para beber água. O dia dava sinais que a noite estava se iniciando, quando cavalo e vaqueiro avistaram ao longe o touro deitado embaixo de uma árvore e o vaqueiro pensou: não deviam se aproximar do touro naquele momento, o dia estava escurecendo e seria impossível perseguir o touro na escuridão. Resolveram esperar o clarear do dia.
Nos primeiros raios de sol já estava o cavalo selado, com proteções no peitoral e cabeça, e o vaqueiro vestido no gibão, era chegada a hora. Com a movimentação do cavalo o touro muito arisco, logo percebeu a aproximação e começou um trote lento adentrando a mata fechada. Cavalo e vaqueiro sabiam que não podiam dar tempo ao touro e iniciaram a perseguição.
O touro era mesmo um animal forte e veloz. A perseguição seguiu mata adentro, deixando para trás matos retorcidos e galhos de árvores pelo chão. Onde passavam, mais parecia a passagem de um furacão. Atravessaram o riacho numa corrida desenfreada e continuaram a corrida passando próximos as rochas dos morros sem sinais de cansaço. O vaqueiro apertou as esporas e xexéu entendendo o recado aumentou a velocidade e conseguiram uma aproximação suficiente para o vaqueiro agarrar o rabo do touro e tentar derrubá-lo. Mas, o touro já tinha passado por situações semelhantes e jogou-se contra o cavalo provocando um choque entre ambos e como era mais pesado o cavalo desequilibrou e o vaqueiro foi ao chão.
O cavalo xexéu, agora sem vaqueiro, não iria desistir da batalha e não seria aquele touro a emplacar sua primeira derrota. continuou sozinho atrás do touro, ora desviando de árvores, ora passando embaixo de outras, numa corrida enlouquecida de dois animais determinados a vencer o outro. Xexéu continuou próximo do touro, esperando o momento certo de pôr seu plano em ação. Quando num desvio às margens estreitas do riacho, o touro correu por um lado, xexéu num esforço incomum, correndo na outra margem, conseguiu colocar metade do corpo à frente do touro, aproximou-se e no momento certo jogou suas patas traseiras para cima e atacou: o touro deu um mugido de dor e caiu no chão desacordado. Tinha sido um coice certeiro embaixo da cabeça do touro. Xexéu voltou suado e bufando pra perto do touro, ficou sobre as patas traseiras e deu um relincho de vitória. O cavalo permaneceu imóvel ao lado touro esperando a chegada do vaqueiro, este aproximou e colocou a corda laçando os chifres e peias nas patas do animal. Instantes depois o touro ficou de pé, tentou esboçar uma reação, mas laçado e dominado deu-se por vencido e assim foi tocado por xexéu e o vaqueiro até as terras da fazenda e colocado dentro do curral.
Xexéu tinha recebido muitas recompensas pelos trabalhos realizados e era tratado como herói. Terminou de comer o milho da cocheira e deitou-se na sombra do juazeiro. Agora só queria descansar, um descanso merecido.