ESTE ARAGUAIA 08
Terminamos de almoçar e ainda ficamos conversando um pouco mais até decidirmos nos levantar, ela saiu do restaurante comigo e na varanda continuou conversando e de vez em quando segurava meu braço quando contava alguma coisa meio engraçada, aquilo me estava encucando, perguntou por que eu estava ali sozinho e eu disse: - Estava precisando pensar um pouco e quando me acontece eu gosto de procurar a natureza e colocar as ideias em ordem. Ela disse: - eu também! Estou saindo de um casamento e estava precisando respirar um pouco, peguei o carro e vim pra cá, cheguei semana passada, amanhã volto, pois, prometi a minha filha de buscá-la e o noivo. Ano passado estive aqui, eu ainda estava casada e gostamos muito, ela vai se dar bem, mas eu vou ficar sozinha, seu Joel é bom de papo, mas a Lena é cara fechada e os meninos... Criança não dá para conversar! Olhe vou escovar os dentes, depois falamos mais, respondi que estava bem e que eu faria o mesmo, e depois ia pescar um pouco.
Quase perguntei se ela queria ir, mas a prudência me mandou fechar a boca. Estava aposentado das aventuras desde há alguns anos e acho que fiquei meio receoso de não saber mais como lidar com as maravilhosas, escovei rapidamente os dentes peguei o molinete e alguns lambaris que trouxemos da pesca da manhã e me mandei para a beira do rio, a sombra melhor estava na prainha de areia branca, toda a margem onde tinham poços melhores estavam sem árvores e o sol estava de rachar mamona, resolvi ficar por ali mesmo, joguei o anzol bem longe, finquei a vara deixei-a lá e subi uma falésia de uns três metros, ao longe vi uma plantação de girassóis, achei tão lindas que resolvi ir até lá, não era longe acho uns trezentos metros.
Não havia cerca, e caminhei um pouco entre à plantação, que lindo tudo aquilo, havia uma grande pedra no meio da plantação, sentei-me um pouco, sentindo o perfume e quase que como recebendo ordens, meus pensamentos voaram... Uma imagem de uma jovem garota caminhando entre flores silvestres e carregando uma sesta cheia delas me veio à mente, talvez lembranças de algum filme. De repente a imagem tomou forma entre os pés de girassóis, uma linda garota de vestido verde jovem ainda, mas talvez moldada pelos meus pensamentos, tinha a aparência de uma mulher madura, mas tão linda quanto uma princesa criada em sonhos. Seus cabelos loiros se misturavam com a enorme quantidade de flores amarelas dos girassóis, ela me olhava e sorria e num gesto gracioso com às mãos e sussurrando entre o sorriso de belos lábios médios me chamava para ela. Caminhei em sua direção, mas ela não estava mais ali, riu um riso cristalino e reapareceu noutro lugar, comecei a segui-la sem alcançar, sempre se afastava quando eu tentava abraçá-la, sumia e ficava rindo até reaparecer novamente, o longo pio de um gavião me trouxe de volta daquele momento mágico.
Fiquei um pouco assustado com aquela visão, será que eu estava enlouquecendo? Eu não havia dormido, meus pensamentos criaram aquela imagem e de tal forma perfeita que eu tinha à nítida impressão de ser real. Não gostei de ter-me autossugerido tais pensamentos, queria me livrar dos sonhos, não criá-los. Refiz o caminho de volta e antes de descer o barranco dei uma olhada para o belo quadro dos girassóis, não vi mais a imagem da moça, sorri um sorriso bobo e me virei para o rio.
Desci e me recostei ao pé da grande árvore copada e fiquei pensando na vida e até me esqueci da pesca. De repente um espaldar de água me chamou a atenção, quatro botos de enorme tamanho invadiram a área, recolhi a linha rápido, o senhor Joel tinha me falado que sempre eles apareciam ali para pescar, não pensei que teria a sorte de ver isto, enquanto três deles começaram a nadar em círculos no local que formava uma espécie de lago no rio, um nadava dentro do circulo acredito, desnorteando os peixes que os outros cercavam para não fugirem, de repente ele nadou direto para a beira da prainha e veio junto na frente dele grande quantidade de peixes de todos os tipos, ele ia abocanhando o quanto conseguia, e depois como algo pré-combinado foi nadar em círculos e veio outro para o centro repetindo a manobra, desta vez na frente veio um enorme dourado e saltou mais de três metros fora da água caindo quase aos meus pés onde eu estava imobilizado pela beleza do que eu via, abaixei-me e peguei o peixão pensando em jogar para o grandão que olhava com uns olhinhos pro nosso lado acho que esperando o dourado voltar à água, olhei para o dourado que peixe lindo, falei sério como um bandido assaltando, pode ir embora, “já perdeu este é meu” ele se afastou movendo a cauda para trás até conseguir se virar e eu fiquei com o peixe dele, me sentindo meio culpado, mas ao mesmo tempo me divertindo com o mal feito, para me desculpar pensei, )( - ele ia virar comida mesmo, o peixão que pegue outro, e foi o que aconteceu repetiram a manobra até se fartarem ou diminuir os peixes e subiram o rio, graciosamente com as barbatanas fora da água, me lembrei de agradecer ao grande pai por não me deixar morrer sem ver aquele espetáculo da natureza.
Voltei para o acampamento com o peixão e entreguei para o Joel que me elogiou pelo pescado, todos menos os três pescadores que tinham saído de barco vieram ver o peixão de mais de oito quilos, aí contei o que aconteceu, e o Joel me disse que sempre acontecia, acharem peixes na areia depois que os botos pescavam, fiquei ali pensando ainda: )( - que beleza seria morar o resto dos meus dias num lugar assim há se eu fosse filho do prefeito, papai do céu me ajudasse e eu tivesse muita grana, não queria mais saber de cidade. Não vi Marta, imaginei que estivesse dormindo, fui para à sombra dos pés de caju frondosos, mas sem frutos estiquei-me numa rede das muitas espalhadas por ali e alguns bancos toscos de madeira também.
Fiquei pensando e de novo meus pensamentos voaram para certo lugar que eu ainda nem conheço, mas já tinha visto pelo Google Earth, me perdi nas sendas dos sonhos e uma dor misturada com melancolia, uma saudade de não sei por que e pela primeira vez tive medo da minha derrota, tantas eu tive na minha vida, mas nunca uma assim tão difícil de entender que fazia eu perder a vontade lutar mais por qualquer coisa que valesse a pena.
Quatro horas, calor da peste, eu na rede e mergulhado em pensamentos triste. Nisto chega Elaine mulher do Eduardo que estavam curtindo lua de mel, estava com um short curto e uma blusinha estampada e sandálias leves e coloridas nos pés. Fiquei até agradecido por ela interromper minha solidão, afinal o que me acontecia era mais uma batalha e se não podia vencê-la, poderia pelo menos aprender a conviver com ela.
- Oi Miro sombra gostosa heim, posso ficar aqui perto com você? – Claro deite-se nesta rede aí, - não, vou deitar nesta perto de você posso? Pode sim, cadê o maridão? Ela deita-se e coloca um par de pernas que parecem torneadas pra cima e vira a cabeça de menina da cidade pro meu lado e desanda a falar: - aquele frouxo filho da puta ta dormindo e quer que fique naquele calor lá junto com ele. - Mas, caramba não estão ainda em lua de mel? - Que lua de mel Miro, nós fomos para Paris e este projeto de homem tinha medo de sair à noite por que tem ladrão, de dia por que não conhecia Paris e tinha de sair com o merda do guia que ele contratou, na Itália foi pior, eu já tava a fim de dar pra um italianinho do hotel, mas o bundão não saía do meu pé.
)( - Pensei um pouco antes de perguntar de novo, o que eu tinha ouvido já tinha me dado um nó na cabeça, casamento atrapalhado estes de hoje... Apesar de achar que assim é melhor, pelo menos às maravilhosas estão no mesmo patamar do macho. Mesmo assim arrisquei: - Que pena a Europa é linda, nesta época já tem neve, não gostou por quê? - Porque eu gosto é de sol, mas os parentes deles deram a viagem eu boba aceitei. Só passei raiva, quando voltei eu queria me divorciar e meus pais entraram no meio e continuo casada há mais de três meses, ainda bem que em S. Paulo reencontrei minha galera e meti chifre neste viadinho, aí não aguentei e cai na risada, ela riu também e falou você deve achar que eu sou doida, quer transar comigo Miro?
Caramba, acho que fiquei vermelho e fiz um bicão respondendo e perguntando ao mesmo tempo atarantado no e meu jeito caipira: Ieu? Ela falou: - brincadeira me desculpe, é que estou com uma puta raiva de não ter me divorciado dele, ainda caí nesta de vir pra cá, disse que queria vir pra gente transar no meio do mato, pensei que aqui ele ia virar homem, mas o babaca não entra no rio porque tem medo de pisar em arraia, não entra no mato com medo de onça, pulei pelada no rio com a família do seu Joel ele perguntou pra eles se lá não tinha crocodilos, gritei pra ele ir à merda e se não fosse a família estar toda lá eu tinha agarrado aquele gato filho da Lena a vista dele. Eu estava de boca aberta com aquela doidinha linda e sem freio na boca bem desenhada.
De onde estava vi o futuro divorciado sair do chalé e falei: - Elaine o maridão está vindo, agora ele te pega e ri, olhem eu ficando pra frente com a menina, logo eu que aposentei os meus dotes há tanto tempo, ela respondeu na tampa da binga: Se ele quiser tá fudido, toco punhêta, mas não dou pra ele, pensei: )( Gente, esta já é do cão e vai para o inferno com corpo e tudo, ri da minha besteira, não acredito nisto, aliás em que eu acredito ainda na descobri.
- Boa tarde seu Miro, - boa tarde Eduardo. - Minha pombinha esta te amolando aí? - Não, estávamos conversando... Ele chamou Elaine, benhê, vamos ver o por do sol lá na beira do rio? – Vamos respondeu Elaine, mas só vamos voltar à noite, - tá bem, mas na hora que os mosquitos começarem a picar, a gente volta, e saíram, ela sendo arrastada pela mão, me olhou e depois pra ele e botou meio palmo de língua de fora, olhou para mim e deu uma gargalhada soltando a mão dele correndo e gritando vamos lá molenga, corre. Falei baixinho Jesus tome conta deste povo.
Uma hora depois, se tanto, estavam de volta e justo na hora que dona Lena acionara o sininho do jantar.