Quem foi o mais burro?
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O casal descia animadamente o caminho para a cachoeira, guiado pelo dono da pousada serrana em que estavam hospedados naquele final de semana. A trilha era íngreme, por entre araucárias e eucaliptos reflorestados, exigindo cuidado em sua descida, pois se escorregava com facilidade. O forte barulho da queda d'água já era ouvido ao fundo.
Chegaram ao fim da descida, abrindo-se uma enorme laje de pedra negra, pela qual corria para o desnível da cachoeira, um riacho cristalino, acelerado e volumoso. O cheiro de molhado era delicioso. A água devia ser muito fria, pois vinha de nascentes na serra.
Outras pessoas já se encontravam ali; um casal mais velho e uma mãe com suas duas filhas pequenas. Eram todas da mesma família e conhecidas do cicerone. Cumprimentaram-se sobre a rocha seca junto a chegada da trilha e iniciaram uma conversa animada.
O casal recém-chegado foi em direção a uma piscina natural rio acima. A esposa entrou na água gelada e, como uma criança alegre e faceira, começou a bater as pernas e a gritar de felicidade e por causa do gelado da água da serra. Foi atentamente observada pelas meninas, ávidas por fazerem o mesmo. Ficou um bom tempo se deliciando no poço do rio. O marido acompanhava sorridente a sua alegria espontânea e infantil.
Veio então o guia e propôs um passeio aos dois: seguir rio abaixo, pelo leito mais seco do riacho nessa época do ano, até uma clareira e voltarem por outra trilha para o estacionamento em que haviam deixado o carro. Assim não precisariam subir a que desceram, por ser muito inclinada e escorregadia. Concordaram.
Despediram-se dos demais e seguiram rio abaixo em uma aventura diferente, por entre pedras e algumas corredeiras que o riacho gélido fazia. O percurso até a chegada ao local programado durou cerca de vinte minutos, no máximo. Era em aclive acentuado também, mas com mato baixo e limpo, quase um gramado e com algumas jovens araucárias facilitando a subida.
- Vamos subir até aquele mato ali. Lá está a entrada da trilha para o carro - diz o condutor apontado para uma abertura na mata.
Começaram a subir o morro. A esposa encontrou um pé de laranja caipira e se debatia com uma da vara para alcançar as poucas que restaram no alto da árvore, pois, as mais baixas já tinham apodrecido no chão ou colhidas. Ela adorava colher fruta do pé. Conseguiu três, mas eram azedas.
- Quanto tempo de casados? - pergunta o dono da pousada caminhando ao lado do marido.
- Estamos juntos há uns 15, 16 anos. É o nosso segundo casamento.
- Tirando a separação, né querido?
- Ah, separaram e voltaram? - questiona o guia curioso.
- Sim, convivemos dez anos, separamos por cinco e voltamos há cinco ou seis - responde o marido.
- Interessante - pondera o condutor.
- Eu fui muito burro, não é? - brinca o marido.
- Por quê? - pergunta o guia.
- Por voltar. Dizem que voltar com a mesma mulher, depois de separados, é burrice.
O dono da pousada fica pensativo por instantes, olha significativamente para a esposa e responde sem titubear:
-Olha, não sei quem foi o mais burro! - diz rindo.
O casal ri também entrando na mata novamente para voltarem à pousada.
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