Os Bilhetes!
O sol estava de rachar e o corpo de Alberto não estava mais agüentando andar. Sua mochila estava pesada e seu cantil onde carregava água, já estava no fim. Não sabia o que iria fazer caso a água acabasse. Estava andando a mais de 4 horas e não via sinal de água. Além de não ter água por muito tempo, tinha que encontrar um local para acampar, fora isso, suas provisões estavam acabando. Logo, logo iria escurecer e se Alberto não arrumasse um local para acampar e fazer uma fogueira, estaria em maus lençóis.
Tudo começou há uma semana, quando Alberto e Elisa, resolveram ir até uma tribo indígena. Elisa trabalhava na FUNAI (Fundação Nacional do Índio), e de vez em quando fazia esse trajeto com Alberto. Eles eram noivos e estavam com casamento marcado para o fim do ano. Saíram de São Miguel o sol ainda não havia aparecido no horizonte, com destino a aldeia dos Camaiurás, no Xingú. Na altura da cidade de Apuí o helicóptero em que viajavam, sofreu uma pane e caiu em plena mata. Elisa foi cuspida do helicóptero e ficou presa e desmaiada numa árvore, já Alberto ficou preso em seu cinto de segurança e só se libertou quase 2 horas depois. O piloto não teve a mesma sorte e acabou morrendo. Alberto olhou para os lados e não viu Elisa. Tentou levantar e percebeu que tinha sofrido apenas algumas escoriações, mais sua cabeça doía muito. As centenas de árvores do local acabaram amortecendo a queda e com isso salvando a vida de Alberto. Sua preocupação naquele momento era saber onde estava Elisa, mais ele se sentia bem tonto e não conseguia gritar seu nome. Alberto saiu do helicóptero destruído, antes conseguiu reunir alguns pertences. Olhou para todos os lados e não via sinal de Elisa. Alberto precisava se afastar do helicóptero, ele sabia que o mesmo podia explodir a qualquer momento, pois o cheiro de combustível estava forte demais e com o calor que fazia, não ia demorar muito para começar a pegar fogo. Alberto, com muita dificuldade conseguiu se afastar do aparelho foi quando ouviu uma grande explosão. Alberto olhou para trás e caiu no chão em prantos. Ele chorava e pensava em Elisa. “Onde ela estaria”.
Com a queda do helicóptero, Alberto não conseguia se lembrar direito do que tinha ocorrido e nem como conseguiu sobreviver. Ele só pesava em Elisa e de como sairia daquele lugar.
Uns 300 metros de onde o helicóptero caiu, Elisa começava a despertar e levou um grande susto ao perceber que estava presa pelo cinto de segurança numa árvore. Elisa teve muita sorte. Ela sofreu apenas um corte na testa. Elisa sempre carregava no bolso um canivete que havia ganhado de seu pai quando ainda tinha 15 anos e foi justamente esse canivete que a libertou do cinto de segurança, fazendo com que Elisa pensasse numa forma de descer daquela árvore. Usando o que sobrou do cinto de segurança, Elisa passou pela sua cintura e a árvore e dessa feita, conseguir chegar ao chão. Sua boca estava seca e o corte em sua testa doía um pouco. Elisa se lembrou de alguns ensinamentos que havia aprendido em algumas de suas viagens a diversas tribos indígenas e saiu à procura de algumas ervas que usaria para curar o seu ferimento. O dia já estava indo embora, dando lugar a uma noite fria e escura. Elisa só tinha em seu poder um pequeno canivete e era com ele que ela tentaria se manter viva.
Enquanto isso há 2 quilômetros dali, Alberto estava tentando fazer um abrigo para passar a noite. O dia estava sendo por demais quente, mais ao cair da tarde, a temperatura também despencou, talvez seja por causa das milhares de arvores que o cercava. Ele tinha certa experiência nesse tipo de situação. Foi fuzileiro naval por muitos anos e sabia lidar com situações adversas, mais estava um pouco debilitado e a sua água estava no fim. Ele precisava montar logo um abrigo e acender uma fogueira, assim poderia se aquecer e afugentar animais que por acaso se aproximassem do abrigo.
Já Elisa, teve um pouco mais de sorte, conseguiu achar uma caverna perto da ribanceira de um rio. De falta d’água ela não morreria e a quantidade de arvores frutíferas que haviam ao seu redor, dava para se alimentar pelo tempo que ela precisasse. Elisa se certificou de que a caverna estava vazia, de imediato recolheu alguns gravetos e com técnicas indígenas, conseguiu acender o fogo, fazendo assim uma fogueira que a aqueceu por bastante tempo. Com uma tocha que ela fez com um galho de árvore e pedaços de pano de seu vestido, Elisa saiu da caverna em busca de água e algo para comer. Estava fraca. Sua última alimentação foi antes de decolar no aeroporto perto de sua casa. Enquanto acendia sua tocha, Elisa deu um pequeno sorriso lembrando as palavras de sua avó enquanto embarcava no helicóptero: “Netinha, vovó fez esse bolinho pra se você sentir fome no meio do caminho...” O motivo do riso foi justamente por ela não ter podido experimentar o bolo... ele ficou no helicóptero.
Após conseguir fazer uma pequena fogueira, Alberto avistou um pé de côco, ele ficou feliz, pois estava ali o seu alimento dessa noite, no dia seguinte ele começaria e ver o que fazer para sair daquele lugar. Alberto pensou em voltar o caminho que fez para tentar achar pista de Elisa, mais desistiu logo em seguida. Na sua cabeça Elisa estava morta. Ninguém suportaria uma queda ao ar livre de um helicóptero em queda. Naquele momento ele sentou e chorou.
O dia amanheceu, tanto Elisa quanto Alberto, resolveram levantar acampamento e sair em busca de socorro. Eles sabiam que não seria fácil, mais não podia ficar num lugar só. Assim foi.
Foram dias e dias andando dentro da selva. Alberto estava exaurido, seu corpo dava demonstração de que não agüentaria por muito tempo. Elisa por sua vez, havia sido picada por uma abelha africana e com muita febre e delirando, acabou caindo ao chão desacordada. A água do canil de Alberto secou, ele não havia conseguido guardar água de côco. Sua visão turva o impedia de continuar andando, foi então que lentamente ele foi se entregando ao cansaço, sentou a beira de uma árvore e ali ficou até perder os sentidos.
Antes de Elisa e Alberto serem resgatados por uma tribo local e serem levados a uma base militar que ficava próximo. Ambos escreveram em suas próprias roupas e com pedaços de carvão o seguinte texto:
Alberto - “Meu amor, dizem que quando estamos no fim da vida, um filme passa em nossa frente. O filme que estou vendo agora, você entrando na igreja ao meu encontro. Você está linda! Nunca amarei outra mulher como você, nem em outro mundo”.
Elisa - “Meu amor, dizem que quando estamos no fim da vida, um filme passa em nossa frente. O filme que estou vendo agora é você no altar da igreja me esperando ir ao seu encontro. Você está lindo! Nunca amarei outro homem como você, nem em outro mundo”.
Alberto e Elisa foram tratados num hospital no Amazonas e transferidos para São Miguel. Seis meses depois se casaram numa igrejinha em São Miguel, a mesma em que Elisa havia sido batizada.
Os bilhetes que eles escreveram? Bem... eles se perderam quando os médicos trocaram suas roupas para poder tratá-los. Se alguém leu, guardou para si.
Fim...